Solange, a indemissível

A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) fracassou novamente na missão de prevenir os transtornos nos aeroportos nas festas de fim de ano. Desta vez o problema foi com a Gol. Há dois anos tinha sido com a TAM. Blog tem arquivo e é possível recordar (leiaDesmilitarização) que no fim das contas a TAM foi absolvida pela Anac das acusações de overbooking de dois anos atrás. Na época do "caos aéreo" eu me irritei (leia Uma conversa de bar sobre Caim e Abel). Hoje, quando a Anac ameaça ir para cima da Gol, eu simplesmente dou de ombros. 
A Anac é mesmo uma comédia, pelo menos para quem não anda de avião. Para quem anda, é uma tragédia. Como as demais agências reguladoras em seus respectivos ramos. 
A Anatel, por exemplo, nada faz para impedir que o brasileiro pague um serviço de telefonia celular entre os mais caros do mundo. Minha proposta é conhecida. Uma maneira eficaz e imediata de conter os gastos de custeio seria extinguir as agências reguladoras. Que no Brasil não regulam nada. Pelo menos nada de bom. Escrevi em Madame de casaco de peles no calor:
    O argumento mais consistente que os defensores das agências apresentam para justificar sua posição, depois da evidente crise da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), é que as agências funcionam, sim, dependendo que quem for nomeado para elas. Ora, mas se o bom funcionamento da agência depende de quem é indicado para ela, e se essa indicação é invariavelmente política (como tem que ser), para que então serve mesmo a agência? Para acrescentar uma estação no calvário de quem precisa se relacionar com o estado para vender produtos ou serviços? Ademais, quem nomeia o diretor de agência é o Executivo. Por isso também é que a coisa é toda meio surreal. Verdade que depois de indicada a pessoa precisa passar por uma sabatina no Senado. Na maior parte dos casos trata-se apenas de uma formalidade. O exame que vale mesmo é o de QI. Quem indicou. Infelizmente, o Brasil é assim. Aí pegam um modelo que pode tar dado certo não sei onde e transplantam para cá. É como aquelas madames que andam de casaco de peles em Teresina (PI), Cuiabá (MT) ou Ribeirão Preto (SP). No caso desta última, no verão. Antes que briguem comigo advirto que as cidades foram escolhidas pela alta temperatura, e não por qualquer critério regionalístico. Madames de casaco de peles suando num calor de 40 graus, é isso que somos, brincando de agências "reguladoras" enquanto a vida dos consumidores é um inferno. Nossas agências reguladoras convivem bem, por exemplo, com uma telefonia celular caríssima para o consumidor, que precisa comprar um aparelho que só funciona em determinada operadora e não pode transportar o número quando resolve mudar de empresa [isso mudou parcialmente desde que o texto foi escrito]. As agências reguladoras são emblemáticas de uma certa ideologia, que busca "blindar" o estado contra as supostas más influências da política. A pessoa perde a eleição porque "o povo não sabe votar", mas deixa os seus amigos lá, nos cargos, para continuar influindo. Eu penso ao contrário, penso que o estado deve ser cada vez mais permeável à política.
As agências reguladoras são uma herança maldita dos anos 90, quando se acreditava que o mercado deveria ser vacinado contra os excessos da política, para acrescentar eficiência ao Estado e conforto ao cidadão. Não aconteceu nem uma coisa nem outra. Criaram se novos cabides de empregos e duplicou-se o guichê. Isso não deixou o Estado mais eficiente e tampouco melhorou a vida do consumidor. Já que não deu certo, é preciso mudar. 
O caminho é simples e óbvio. Reabsorver na esfera governamental as funções das agências. Sem estabilidade de emprego para os encarregados de zelar pelo interesse público. Se eu, por exemplo, achar que a presidente da Anac, Solange Vieira, deve ser demitida, hoje não tenho o que fazer. Ela goza de estabilidade no emprego. Nem o presidente da República pode mandá-la embora. Teoricamente, é claro. 
As agências reguladoras acabaram dando nisso, viraram um abscesso. Coisa que não se trata com antibiótico, mas com bisturi. 
Solange não tem exibido a necessária competência, mas aposto que não será pressionada a sair. Não vai se passar com ela o que aconteceu com o antecessor, impelido a cair fora. Sabem por quê? Porque Solange é a favor da privatização dos aeroportos (dos lucrativos, é claro). 
Acontece agora o que se previu aqui no blog tempos atrás, depois que mudou o ministro da Defesa (leia Bravata e dinheiroOu vende a Infraero ou paramos o Brasil). 
A infraestrutura para viajar de avião no Brasil não melhorou, mas a cobrança da assim chamada opinião pública está bastante atenuada. 
Depois, quando eu digo que Luiz Inácio Lula da Silva é um gênio da política, as pessoas acham ruim. 
Lula acenou com um brinquedinho lucrativo para os amigos da opinião pública (leia Lula pede água a quem deseja o seu sangue). E a opinião pública acalmou-se. 
Os passageiros de avião no Brasil continuam à mercê do oligopólio, mas a perspectiva de bons negócios ajuda a desanuviar o ambiente.
POR ALON FEUERWERKER

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