Criminalização da Política


É pertinente questionar se foram corretas as decisões do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e do ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, de ter filiação partidária. O primeiro ingressou no PMDB. O segundo, no PT.


Parecem bons os argumentos de que, nesses casos, são ministros muito mais a serviço do Estado do que do presidente de plantão. Há uma discussão sobre a "profissionalização" e o "caráter técnico" dessas funções. Ao abrir a possibilidade de uma carreira partidária, esses dois ministros podem ser ver tentados a tomar decisões mais "políticas" do que "técnicas". "Políticas", no caso, seriam aquelas com o objetivo de obter algum ganho eleitoral ou de ficar bem na foto com a opinião pública.


Ou seja, ceder a uma tentação de popularidade e abandonar eventuais medidas duras que o técnico deveria tomar.


É uma discussão interessante e válida. Não dá para desqualificar esses argumentos. Mas também não dá para criminalizar a política. Por que a filiação partidária, que não significa decisão de disputar eleições, transformará "técnicos" em oportunistas? Por que "decisões políticas" são sempre ruins quando comparadas a "soluções técnicas"?


No auge da crise econômica, se Lula tivesse dado ouvido ao conselho de empresários, analistas e jornalistas, teria cortado gastos públicos, teria adotado "medidas técnicas" para enfrentar a tempestade. Ainda bem que não deu bola. Lula só teria aumentado a tormenta. Foram "decisões políticas" elevar os gastos públicos na crise e abrir mão de tributos, com redução do IPI para veículos e a linha branca (fogões, geladeiras etc.).


É bom lembrar que o político chega ao cargo pelo voto. É o titular de poder conferido pelo povo. Técnicos puros não precisam prestar conta ao eleitorado. Isso é bom?


É preciso qualificar a política, não demonizá-la. Ela é o melhor instrumento para melhorar a vida das pessoas. A criminalização da política não interessa à democracia nem ao povo.


Ainda sobre políticos e técnicos


Há um debate meio morno sobre a correção de o presidente da República indicar ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), que precisam ser aprovados em sabatina pelo Senado. Vivem aparecendo argumentos de defesa de indicações técnicas. Elas seriam feitas assim: eleições na categoria dos juízes, escolha de uma parcela pelo Congresso Nacional.


Ora, o presidente da República recebeu voto direto da população. A Constituição lhe dá o poder de indicar. E o Senado faz um contraponto --pode rejeitar o apontado pelo presidente. Parece um sistema mais adequado do que deixar a decisão por conta da corporação ou de uma disputa política no Congresso Nacional.


PT e PSDB


Petistas e tucanos são parecidos. No poder, eles sempre alegam que indicam técnicos. Na oposição, eles asseguram que o governo só faz nomeações políticas.



Kennedy Alencar, 41, colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve paraPensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre bastidores do poder, aos domingos. É comentarista do telejornal "RedeTVNews", de segunda a sábado às 21h10, e apresentador do programa de entrevistas "É Notícia", aos domingos à meia-noite.

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