A vida como ela é


Seja qual for o resultado eleitoral de outubro, os PMDBs já venceram a disputa na projeção do controle das maiores fatias do orçamento da União. Explico por quê. No Brasil, conformar maioria e conseguir a estabilidade da moeda tem um preço que seria impagável em uma sociedade soberana. Em meio aos discursos de tipo moralista, quando tanto Dilma Roussef como José Serra riscam as esporas na arena de estilo Jânio Quadros antes da renúncia, os limites reais para manobrar na política ficam escamoteados.
Duas grandes margens constrangem a soberania popular no ato do exercício do voto e a conseqüente escolha de governo. Uma é o custo de formação de maiorias, tema polêmico cujo último escândalo dessa monta ganhara o apelido de Mensalão. A margem menos visível e de difícil compreensão para o grande público é o modelo de financiamento de curto prazo do Brasil, baseado em financeirização e transferência de recursos da sociedade para o sistema financeiro. Em ano eleitoral a primeira margem ganha musculatura, porque na hora de apostar as fichas e compor as chapas, o ambiente político e a obediência aos seus mandos subordinam até mesmo a Henrique Meirelles, o comandante em chefe do governo do Copom.
É difícil de admitir em alto e bom som, mas a verdade nua e crua é que governar no Brasil implica em, ao naturalizar estas margens de constrangimento estrutural e, por tanto, não confrontá-las, admitir dois tipos de alianças. Uma aliança implica em fazer “a opção preferencial” pelo capital financeiro em geral e o sistema bancário em específico. Do contrário, o fim de mandato pode se tornar uma roleta russa, sofrendo reveses simultâneos. Estes podem vir dos banqueiros da ciranda digital, executando ataques contra a moeda e retirada de fundos especulativos, aumentando o “risco” país e já condicionando a entrada do novo governo. Para quem pensa que exagero, basta recordar o ano de 2002 quando a disparada do dólar acelerou aos acordos de bastidores (nem tão velados assim) que levaram Antônio Palocci ao Ministério da Fazenda e o ex-presidente mundial do então maior credor privado do Brasil à presidência do Banco Central.
Outra aliança é o custo da tal da governabilidade. Implica em ceder às chantagens do cacicado das oligarquias partidárias que comandam o baixo clero do Congresso. No caso específico do pleito de 2010, a maior rede oligárquica nacional já demarca seu terreno. Com a derrocada do DEM, cujo canto do cisne deu-se através do desgoverno distrital do ex-tucano José Roberto Arruda e do ex-collorido Paulo Octávio, os PMDBs reinam sozinhos. Como craques da política imediatista, fazem o que na loteria ilegal se chama “cercar o bicho”, reduzindo a aleatoriedade das apostas. Dentro do seu governo federal, foi posto um freio às ambições de Meirelles, neófito nas hostes peemedebistas. Já na presença em palanques, o ataque é duplo. Enquanto o ex-governador Orestes Quércia declara apoio a Serra, seu operador de confiança, o deputado federal Michel Temer, naturaliza sua candidatura a vice de Dilma. Como se nota, dentro da política de curto prazo, ganhe Serra ou Dilma, os correligionários de Quércia, Calheiros, Jucá, Sarney, Geddel e cia. já cercaram o bicho por todos os lados. 
Bruno Lima Rocha é cientista político (www.estrategiaeanalise.com.br /blimarocha@via-rs.net

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