...Uma exceção
José Alencar morreu ontem depois de atravessar os últimos anos em público de mãos dadas com o câncer, ou cânceres. Foi uma opção consciente. Alencar sempre dizia que como vice-presidente não tinha o direito de guardar para si as circunstâncias e efeitos da doença.
Dizia que o câncer do Zé Alencar era assunto privado, mas o do vice-presidente era assunto de todo o Brasil.
Há um debate permanente no jornalismo sobre os limites da exposição de alguém com face pública. Para o meu gosto, valeria aqui a norma dita americana.
Tudo que é da vida do político é assunto de interesse público. O ex-vice-presidente seguiu essa regra. E reforçou, com a atitude, sua imagem e seu capital político, bem como o capital de Luiz Inácio Lula da Silva.
É bastante provável que mesmo sem Alencar na vice Lula tivesse vencido as eleições que venceu. Há também algo de exagero na tese de que Alencar foi decisivo para reduzir as resistências empresariais a Lula em 2002.
Elas arrefeceram após a Carta aos Brasileiros, em que o então candidato disse estar comprometido com as grandes linhas macroeconômicas do governo anterior. E caíram a zero com a condução que Antonio Palocci deu ao Ministério da Fazenda entre 2003 e 2006.
Alencar atravessou o primeiro mandato de Lula arremetendo contra a taxa de juros e contra Palocci. E contra o Banco Central.
Recolheu espaços na cobertura jornalística mas não conseguiu influir de fato na política econômica. O ministro Palocci contou com a confiança irrestrita de Lula até cair. Depois, a função de elo com o mercado foi ocupada por Henrique Meireles.
O ex-vice-presidente falecido ontem nunca deixou de ser um outsider, mesmo dentro do governo. Uma fraqueza que ele transformou em força. Dizendo coisas que talvez Lula quisesse ele próprio declarar, não fossem os limites impostos pela realpolitik.
Como na polêmica das relações entre o Brasil e o Irã. Ali, Alencar expressou a compreensão que ia pela mente de boa parte do governo brasileiro. Disse que uma eventual bomba atômica iraniana seria um elemento de dissuasão. Para evitar que o Irã virasse um Iraque.
Disse porque podia dizer. E ficou por isso mesmo. Teve um efeito nos bastidores, mas publicamente, nada.
Se Lula era a expressão da metamorfose ambulante, vangloriando-se por mudar de posição e discurso conforme a necessidade, Alencar fazia o contraponto. Com o estoicismo e a coerência. O agravamento do câncer apenas potencializou o perfil.
A aceitação de Alencar pelo PT lá atrás não foi pacífica, mas com o tempo, com as crises e diante da lealdade dele ao presidente e ao partido o vice foi aceito como um petista, na prática. Mesmo sendo do PRB, legenda que ajudou a criar quando deixou o PL (hoje PR).
Alencar já vinha sendo homenageado em vida e será mais ainda agora.
Mereceu. Por ter sido um patriota. Não só pelo que fez na política. Mais por ter dedicado toda a sua vida útil empresarial à indústria. Um caso raro de empresário brasileiro que percorreu integralmente a trilha da construção do sucesso dedicado a produzir coisas tangíveis.
Entre nós não é pouca coisa. Num país nascido e desenvolvido sob a marca do anti-industrialismo, da colônia à República, definitivamente não é pouca coisa.
Dizia que o câncer do Zé Alencar era assunto privado, mas o do vice-presidente era assunto de todo o Brasil.
Há um debate permanente no jornalismo sobre os limites da exposição de alguém com face pública. Para o meu gosto, valeria aqui a norma dita americana.
Tudo que é da vida do político é assunto de interesse público. O ex-vice-presidente seguiu essa regra. E reforçou, com a atitude, sua imagem e seu capital político, bem como o capital de Luiz Inácio Lula da Silva.
É bastante provável que mesmo sem Alencar na vice Lula tivesse vencido as eleições que venceu. Há também algo de exagero na tese de que Alencar foi decisivo para reduzir as resistências empresariais a Lula em 2002.
Elas arrefeceram após a Carta aos Brasileiros, em que o então candidato disse estar comprometido com as grandes linhas macroeconômicas do governo anterior. E caíram a zero com a condução que Antonio Palocci deu ao Ministério da Fazenda entre 2003 e 2006.
Alencar atravessou o primeiro mandato de Lula arremetendo contra a taxa de juros e contra Palocci. E contra o Banco Central.
Recolheu espaços na cobertura jornalística mas não conseguiu influir de fato na política econômica. O ministro Palocci contou com a confiança irrestrita de Lula até cair. Depois, a função de elo com o mercado foi ocupada por Henrique Meireles.
O ex-vice-presidente falecido ontem nunca deixou de ser um outsider, mesmo dentro do governo. Uma fraqueza que ele transformou em força. Dizendo coisas que talvez Lula quisesse ele próprio declarar, não fossem os limites impostos pela realpolitik.
Como na polêmica das relações entre o Brasil e o Irã. Ali, Alencar expressou a compreensão que ia pela mente de boa parte do governo brasileiro. Disse que uma eventual bomba atômica iraniana seria um elemento de dissuasão. Para evitar que o Irã virasse um Iraque.
Disse porque podia dizer. E ficou por isso mesmo. Teve um efeito nos bastidores, mas publicamente, nada.
Se Lula era a expressão da metamorfose ambulante, vangloriando-se por mudar de posição e discurso conforme a necessidade, Alencar fazia o contraponto. Com o estoicismo e a coerência. O agravamento do câncer apenas potencializou o perfil.
A aceitação de Alencar pelo PT lá atrás não foi pacífica, mas com o tempo, com as crises e diante da lealdade dele ao presidente e ao partido o vice foi aceito como um petista, na prática. Mesmo sendo do PRB, legenda que ajudou a criar quando deixou o PL (hoje PR).
Alencar já vinha sendo homenageado em vida e será mais ainda agora.
Mereceu. Por ter sido um patriota. Não só pelo que fez na política. Mais por ter dedicado toda a sua vida útil empresarial à indústria. Um caso raro de empresário brasileiro que percorreu integralmente a trilha da construção do sucesso dedicado a produzir coisas tangíveis.
Entre nós não é pouca coisa. Num país nascido e desenvolvido sob a marca do anti-industrialismo, da colônia à República, definitivamente não é pouca coisa.
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