Os desafios de Serra e Haddad na eleição


Ex-governador, prefeito e duas vezes candidato a presidente da República, esperava-se de José Serra melhor desempenho na prévia dos tucanos, realizada no domingo para escolher o candidato do partido a prefeito de São Paulo – Serra teve 52,1% dos 6.229 votantes, contra 31,2% do secretário estadual de Energia, José Aníbal, e 16,7% do deputado federal Ricardo Trípoli. Quando disputou com Luiz Inácio Lula da Silva a prévia do PT para a eleição de 2002, o senador Eduardo Suplicy teve 15,6% dos votos. Era um opositor solitário contra o líder inconteste do partido.
Os 52,1% não têm a menor importância no quadro de uma disputa que só agora começa a ser delineada. Mas deve servir de advertência para José Serra, mesmo sabendo-se da precariedade desse tipo de consulta, sujeita, de última hora, a filiações dirigidas de militantes. Importante, para o tucano – e também para o candidato do PT -, é o apoio de quem realmente tem voto.
Para Serra, no momento, é o apoio das bancadas federal, estadual e municipal, além, é evidente, do governador Geraldo Alckmin. O mesmo serve para Fernando Haddad, o candidato escolhido pelo ex-presidente Lula num projeto de renovação do PT. Neste quesito, Serra leva a desvantagem de ter a cúpula nacional do PSDB, inclinada a apoiar a candidatura de Aécio Neves na próxima eleição presidencial. Haddad tem um grande handicap: o apoio de Lula e sua imensa popularidade, mas a desvantagem de um partido que teve de engolir sua indicação por Lula e que anda indócil com sua imobilidade nas pesquisas.
Divisão ameaça planos do PSDB e do PT em São Paulo
Os últimos movimentos partidários indicam que Haddad pode até mesmo ficar isolado, ele que precisa de tempo maior de televisão para se tornar mais conhecido. Mas isso se deve provavelmente a um erro de cálculo de Lula, que mostrou suas cartas antes do tempo, passando para os partidos aliados a mensagem de que a eleição de Haddad é importante para o PT, mas é muito mais ainda para ele, uma espécie de questão de honra. Subiu na hora o preço de todos os candidatos a aliado.
O PT se repete: quando Dilma patinava nas pesquisas, no início de 2010, poucos eram os dirigentes partidários a fazer uma sincera profissão de fé na escolha do comandante. Haddad, ao contrário de Dilma, é considerado um professor bom no debate, pessoa de estilo suave, simpática e com serviços prestados ao país, como ministro da Educação e Cultura de Lula e Dilma.
As recentes mudanças feitas pela presidente Dilma Rousseff no Congresso também serviram para aumentar o desconforto dos petistas da cidade de São Paulo. A indicação do novo líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (SP), é um exemplo. Os deputados sempre procuraram manter alguns critérios nas indicações para a partilha de cargos e funções. Nos últimos anos, o líder do governo sempre vinha da liderança da bancada. Isso aconteceu com Arlindo Chinaglia (SP), Henrique Fontana (RS) e Cândido Vaccarezza. Agora, o ex-líder da bancada Paulo Teixeira (SP) foi ignorado em favor de Chinaglia, embora fosse o nome preferido da coordenadora política do governo, Ideli Salvatti, para a desempenho da função.
A disputa em São Paulo contribuiu para o desequilíbrio na representação das correntes. Para desistir de disputar a prévia para a indicação do partido a prefeito de São Paulo, Jilmar Tatto ganhou a liderança da bancada: José Guimarães (CE), o candidato do campo majoritário, aceitou acordo para ser o próximo líder. A senadora Marta Suplicy (SP) rendeu-se à força de Lula, mas ficou na vice-presidência do Senado, rompendo um acordo pelo qual o senador José Pimentel ocuparia o cargo, findo o primeiro ano de exercício do PT. E ao deputado Carlos Zarattini, outro dos pré-candidatos, coube a função de relator do projeto dos royalties na Câmara, um posto de projeção. Teixeira foi sacrificado, mas não é o único da turma que cobra mais efetividade do candidato.
Do lado tucano, as dificuldades aparentes do candidato petista parecem ter uma leitura mais realista. O próprio José Serra, em conversa com interlocutores, tem afirmado que seria um grande um erro subestimar a candidatura do ex-ministro da Educação. Na percepção do tucano, o PT tem os 30% tradicionais que costuma alcançar na cidade de São Paulo e um candidato bem mais difícil de enfrentar do que foi Aloizio Mercadante nas eleições de 2006 para governador, quando o petista teve cerca de 35% dos votos. O tucano costuma ressaltar uma virtude em Fernando Haddad: a capacidade de aprender.
Resta saber quais as lições o próprio Serra tirou de suas últimas campanhas, especialmente a última delas, em que perdeu a Presidência da República para Dilma, numa disputa em que largou na frente como franco favorito.
Os problemas do tucano com a direção nacional do PSDB certamente são bem maiores que os de Haddad com o comando do PT. Nos bastidores do PSDB, o grupo hoje engajado na candidatura presidencial do senador Aécio Neves (MG) não demonstra muito entusiasmo com a eventual vitória de Serra na eleição de São Paulo.
O grupo opera, por exemplo, para evitar a coligação do DEM (que é ligado ao governador do Estado, Geraldo Alckmin). O Democratas, para apoiar Serra, exige reciprocidade em Sergipe, Salvador e Recife. Em Sergipe, o candidato João Alves (ameaçado de impugnação pela Justiça Eleitoral) tem o apoio de Serra, que o considera um dos candidatos a governador de maior fidelidade a sua candidatura presidencial em 2010. O tucano paulista também avalia que ACM Neto (DEM) é o candidato da oposição com maior possibilidade de vitória em Salvador.
Em Recife, quem parece pouco disposto a apoiar a candidatura de Mendonça Filho é o presidente do PSDB, Sérgio Guerra, por questões puramente regionais. Mas as contas estão indo parar na caixa postal de José Serra. O sucesso da prévia paulista deveria ser um alento para o PSDB e não mais um instrumento para a divisão do partido. A pancadaria na base aliada do governo, amplamente majoritária, mostra a falta que faz uma oposição de verdade.

por Raymundo Costa - repórter especial de política - raymundo.costa@valor.com.br

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