A. Capibaribe Neto: a anatomia das palavras


Rabindranat Tagore, chamado por Ghandi de "o grande mestre",é o autor do poema lírico, Flor de Lotus: "No dia em que a flor de lótus desabrochou, a minha mente vagava, e eu não a percebi. Minha cesta estava vazia e a flor ficou esquecida. Somente agora e novamente, uma tristeza caiu sobre mim. Acordei do meu sonho sentindo o doce rastro de um perfume no vento sul. Essa vaga doçura fez o meu coração doer de saudade. Pareceu-me ser o sopro ardente no verão, procurando completar-se. Eu não sabia que a flor estava tão perto de mim, que ela era minha, e que essa perfeita doçura tinha desabrochado no fundo do meu coração...". A saudade da Flor de Lótus de Tagore deve ter tido origem no fato de tê-la esquecido no cesto, carente do orvalho benfazejo das atenções para completar o seu desabrochar. Só depois que murchou, Tagore se deu conta de que ela estivera sempre ali, de que era sua, e ele não cuidou, e aí escreveu com tristeza: "a vida revela-se ao mundo como uma alegria... A morte não pode ser verdade enquanto não desaparece a alegria do coração do ser humano". No fundo de uma gaveta esquecida, como um cesto onde vamos esquecendo um passado, encontrei a fotografia de uma mulher apaixonada de olhos morenos, e no verso da qual escreveu: "a você que está me fazendo sentir as mais loucas emoções e que me mostrou que vale muito mais a pena viver quando se ama... Adoro você! Com muito carinho, X." As reticências, depois do "quando se ama" talvez escondessem o "enquanto não desaparecer a alegria do meu coração...". As interpretações pessoais de palavras ditas ou escritas dependem do contexto em que são ouvidas ou lidas; como na hermenêutica, a ciência da interpretação, que permite vários entendimentos, por mais explícitos que sejam seus postulados. Duas pessoas olham através de uma mesma janela, mas uma pode estar contemplando as estrelas e outra o quebrar das ondas. Aquela flor que foi esquecida não pode mais deixar de ter sido. Depois daquelas reticências, o amor pode ter acabado tempos depois da dedicatória e X, também ela uma Flor de Lótus, ter sido largada no cesto.

A sensação que fica quando o arrependimento chega por uma imensa porta escancarada o futuro encontra a porta da esperança fechada, e a alegria no coração se esvai e ele vai tentar sobreviver na busca frenética por uma rota de fuga, como bálsamo para aliviar seu tormento. Anatole France escreveu certa vez: "o que deixamos para trás continua fazendo parte da nossa vida...". Mesmo que tenhamos deixado para trás os bons momentos, as vitórias, aplausos, alegrias, taças de vinho vazias, o burburinho das festas, e lembranças de abraços cheios de amor, de repente, tudo fica reduzido ao som da última gota d´água caindo dentro de um copo cheio, a transbordar sonhos deixados no cesto e às imagens de uma porta fechada pelo lado de dentro e a uma chave partida ao meio, largada sobre uma cama vazia pela metade, com a insinuação de "última vez" no ar e um "para sempre" no coração. É preciso sabedoria para entender as lições que existem em cada pedra e em cada flor, mas também as que estão em cada chave partida, em cada sonho que deixamos de ajudar a realizar; e depois conseguir forças para lutar contra as razões alegadas pelo nosso pior inimigo: nós mesmos! Talvez somente assim, possamos cuidar melhor de outras "Flor de Lótus" e entendamos a necessidade de prolongar as alegrias nos corações alheios. É preciso estar atento às reticências porque o tempo que não espera por ninguém, reserva surpresas no dia a dia, tem lá suas armadilhas. É preciso estar atento para os perigos de deixar cair mais gota d´água dentro do copo prestes a transbordar. Quando o solidário de passagem tocar o ombro de alguém curvado sobre a sua dor e lhe perguntar "que foi?". É bom procurar ver se por perto existe um cesto vazio; e se a resposta dele for "nada, não...", descubra se na anatomia dessas palavras não está escondido um TUDO profundo!

Um comentário:

  1. MÃO
    MÃO QUE ELIMINA A DOR DO PACIENTE
    MÃO QUE TIRA A VIDA DE OUTREM
    MÃO QUE FAZ O BOLO PARA ADOÇAR A CRIANÇA, JOVEM E O ADUNTO
    MÃO QUE ESCREVE A POESIA DO POETA DA VIDA
    MÃO QUE PLANTA O ALIMENTO DA NAÇÃO
    MÃO QUE JOGA VOLEI, BASQUETE E BOLINHA DE GUDE
    MÃO QUE LIMPA A SUJEIRA DA NAÇÃO
    MÃO QUE BATE NA BUNDA DA CRIANÇA
    MÃO QUE ACARICIA O ROSTO DA AMADA
    MÃO QUE PLANTA O PINHÃO, O PINHO E O PINHEIRO
    MÃO QUE PREGA O PREGO
    MÃO QUE LAVA A ROUPA SUJA DA FAMÍLIA
    MÃO QUE FAZ A COMIDA PARA SE ALIMENTAR
    MÃO QUE TOCA A VIOLA , O VIOLÃO E O VIOLINO
    MÃO QUE TOCA O MAIS NOBRE DOS INSTRUMENTOS, O PIANO
    MÃO QUE EMPINA A PIPA
    MÃO QUE ESCOLHE O FEIJÃO
    MÃO QUE ACALENTA O BEBE PARA DORMIR
    MÃO DO MÉDICO QUE SALVA A VIDA DO DOENTE
    MÃO DO DR. BAIA QUE TROCA O FÍGADO DOENTE PELO QUE FUNCIONA BEM
    MÃO, MÃO SANTA MÃO!
    A ÚNICA MÃO SUJA É DO POLÍTICO QUE ROUBA O DINHEIRO DA NAÇÃO.




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