O Papa Ratzinger fracassou ou contra-atacou quando renunciou?


Não dá para ficar de fora, nem apenas   nos instalarmos  na periferia da questão que eletriza o planeta, mesmo abandonando por um dia a praia da política brasileira.  Falamos  das causas reais da renúncia do Papa Bento XVI, começando a ser expostas por Sua Santidade, em pessoa, e desdobradas cada dia mais na imprensa mundial. O singular chefe da cristandade denunciou profunda divisão  na Igreja, falou da hipocrisia de muitos de  seus responsáveis e deixou clara a cisão que em outros tempos se  transformaria num  cisma.
                                                        
No fundo, apesar das sutilezas tão comuns a essa milenar instituição,  estava  Joseph Ratzinger aferrado ao conservadorismo confundido com dogmas do passado. Insurgia-se contra defesa da saúde, contra  a camisinha. E também contra  o aborto, até em  situações de risco de vida.  Rejeitava a quebra do anti-natural celibato, ou seja, o casamento de padres, assim como a união entre homossexuais, a ordenação de mulheres e outras barreiras que a Humanidade hoje majoritariamente rejeita. Mas do alto de sua experiência, via  crescer  a tendência de  boa parte do clero, inclusive cardeais, pela revisão desses postulados que a vida moderna repudia. Claro que em meio a essa divergência principal situavam-se   motivações  inerentes ao ser humano, como  a  luta pelo poder,  a necessidade de abrir espaços, a vaidade, o açodamento, o apego a tradições e o culto ao sobrenatural.
                                                        
Se foi pela impossibilidade de conter a maré reformista  ou, no reverso da medalha,  para fazê-la refluir através de um gesto espetaculoso, tanto faz. A verdade é que Bento XVI renunciou, certamente esperando que seu sucessor obtenha a vitória onde ele fracassou. Também por motivos naturais, do alto de seus 85 anos e da fragilidade de sua saúde física e mental.

                                                        
Tudo indica que o novo Papa emergirá da maioria conservadora,  no colégio dos cardeais. Poderá promover a renovação  nos postos e funções do Vaticano,  mas manterá  a linha de submissão aos dogmas ultrapassados. Mesmo assim, alguns valores continuarão sendo contestados, até que se rompam.  O processo seria  acelerado  com a escolha de um Papa mais liberal. Ou menos conservador. Só que a elevação ao cardinalato, nas últimas duas décadas, obedeceu a critérios de alinhamento automático com o passado.
                                                        
Existem, no entanto, obstáculos a superar de imediato. Um deles, com todo o respeito, está  no uso de trajes medievais e, perdão, meio carnavalescos, utilizados pela cúpula dos prelados. Beiram o ridículo, nos tempos atuais, aqueles chapelões de faraós do Antigo Egito, assim como camisolões de cores berrantes e estolas  sem maiores finalidades. Estaria na hora de o novo Papa, sem  declarar guerra a ninguém,  colocar essas fantasias em desuso, reservando-se apenas uma batina branca e recomendando aos demais trajes escuros e moderados. A liturgia não seria atingida, mas a desnecessária pompa, com toda certeza. O êxodo de católicos em todo o planeta desmente o raciocínio  de que o povo gosta desse tipo de ostentação. 

por Carlos Chagas

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