Ontem assisti o Gazeta Esportiva e desliguei a TV às 19 horas. Um pouco antes disto vi o programa do PT através de uma matéria no GGN. Após jantar lavei a louça, escovei os dentes, fiz a barba e naveguei algum tempo na internet. Por volta das 20 horas assisti um documentário sobre Pompéia. Por volta das 21 comecei a rever filme "12 homens e uma sentença" (1957). Ao fim do filme fui dormir. Não notei nada de excepcional. Só fiquei sabendo do suposto panelaço ao ligar o computador quando acordeihttp://www.cartacapital.com.br/blogs/parlatorio/programa-do-pt-em-rede-nacional-gera-2018panelaco2019-em-cidades-brasileiras-5840.html.
Moro na periferia Osasco, num condomínio residencial que poderia ser descrito como sendo de "classe C". Onde estou há dezenas de torres de 7 andares com 4 apartamentos por andar. Ontem ninguém bateu panela no prédio onde moro. Silêncio absoluto nos prédios vizinhos. Muitos dos habitantes do condomínio não são petistas, nem votaram no PT. Mas me parece óbvio que eles sabem que suas vidas melhoraram nos últimos anos. O golpe de estado não é uma prioridade política no meio em que vivo.
O panelaço só despertou meu interesse como um fenômeno antropológico. O valor político do movimento é nulo por três motivos: os descontentes perderam eleições que foram limpas e homologadas pelo TSE; os votos deles não tem mais valor jurídico que os votos dos demais brasileiros; apesar de serem inteligentes, as novas TVs não transmitem o barulho das panelas às pessoas que aparecem nos programas políticos que, aliás, foram previamente gravados. O comportamento dos neo-paneleiros é ridículo e sem sentido. A esmagadora maioria da população não aderiu ao movimento. Portanto, o panelaço foi um panelacinho e só se tornou notícia porque foi divulgado pelas empresas de comunicação. Porque as revistas, jornais, telejornais e portais de internet não fizeram a cobertura do silêncio nos "outros" bairros? O que os "outros brasileiros" fazem ou deixam de fazer é indigno de ser noticiado?
Os cidadãos que bateram panelas parecem não estar satisfeitos. Eles estão passando fome? Não. Foram maltratados por uma polícia política? Não. O candidato deles foi preso ou impedido de participar da eleição presidencial? Não. Aécio Neves ganhou a eleição e foi impedido de tomar posse? Não. As economias dos neo-paneleiros foram bloqueadas, sequestradas ou confiscadas pelo governo federal? Não. Nos últimos anos eles ficaram mais ricos? Sim. Por mais que tente, não consigo encontrar motivos racionais para o panelacinho de ontem.
A única resposta que me ocorre é a seguinte: os neo-paneleiros estão tristes, deprimidos e perderam o contato com a realidade. Não convivo com eles, portanto, só posso fazer algumas suposições. Suponho que os manifestantes sempre se sentiram inferiores aos europeus e norte-americanos e compensaram este sentimento alimentando um complexo de superioridade sobre os "outros brasileiros". Eles se distinguiam do povo pelo consumo. Agora que o povo pode consumir as mesmas coisas eles (imóveis, carros, passagens de avião, TVs de tela plana, celulares 4G, livros, etc...) os eleitores do PSDB ficaram completamente perdidos.
Durante séculos os brasileiros ricos viveram cercados de escravos, mucamas e agregados. Os descendentes deles não conseguem suportar a igualdade civil e acham intolerável a democratização do consumo. Suponho que vem daí os shows de depressão na frente da TV. Os neo-paneleiros estão formando uma nova elite: a elite dos medíocres que batem panelas que raramente usam, que nunca lavam e que, principalmente, nunca ficaram ou ficarão vazias.
A discórdia civil neste momento é evidente e potencialmente perigosa. Ano que vem o Brasil sediará as Olimpíadas. Em razão disto e do panelacinho, creio que as Forças Armadas precisam começar a rever seus procedimentos e manuais. Novos cenários de violência política devem ser estudados. Se o terrorismo panelizado ficar confinado aos apartamentos de luxo o problema será privado. Se a nova elite dos medíocres resolver explodir "panelas bombas" durante as provas de atletismo ou de natação a segurança dos atletas e dos turistas será comprometido e a imagem do Brasil no exterior ficará abalada.
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