“Kotscho, adorei sua leitura política do Brasil, mas uma pergunta me intriga: você não acha Ciro Gomes um candidato preparado para assumir as rédeas do país?”.
A mim também intriga a ausência do nome do ex-governador do Ceará e ex-ministro dos governos Itamar Franco e Lula, duas vezes candidato a presidente, no noticiário e nas análises sobre a eleição de 2018.
É como se ele não existisse, embora seja o candidato mais cotado do campo progressista, chegando a 13%, no último Datafolha, caso Lula não possa concorrer.
Marina Silva, ex-senadora e ex-ministra de Lula, também duas vezes candidata a presidente, é outro nome que aparece com bons índices, mas não pode mais ser considerada de esquerda, desde que apoiou Aécio Neves em 2014, e depois sumiu de cena.
Não dá para saber ainda se Guilherme Boulos, o líder do MTST, será candidato pelo PSOL. De qualquer forma, seria um candidato apenas para marcar posição, como mostra a mesma pesquisa.
No texto que motivou a pergunta de Pedro Paulo, eu falava da dificuldade que a base aliada de Michel Temer está encontrando para definir um candidato competitivo no tão pouco tempo que falta para a eleição presidencial.
Desta vez, ao contrário do que vimos nos últimos 20 anos, com PT e PSDB disputando o segundo turno e se revezando no poder, é bem possível que os dois partidos fiquem de fora na disputa final.
Podemos ter pela primeira vez um segundo turno entre direita e extrema direita, como aconteceu recentemente na França com Macron e Le Pen, se Bolsonaro não começar a despencar logo nas pesquisas como prevê a maioria dos analistas.
Como por aqui ainda não encontraram um Macron nos partidos existentes, a direita voltou a jogar as suas fichas no apresentador Luciano Huck, que volta hoje ao Brasil, depois de uma temporada em Paris.
Esquecem-se que Macron não foi um paraquedista “outsider” inventado à ultima hora. Tinha sido Ministro das Finanças do governo socialista, um candidato com história política e brilhante carreira no mercado financeiro.
Neste cenário de absoluta indefinição, tanto à direita como à esquerda do espectro político, é mesmo estranho que não se fale no nome do candidato Ciro Gomes, do PDT, o mais temido pelos conservadores, se Lula não chegar às urnas em outubro.
Ciro seria no momento, na minha modesta e irrelevante opinião, o único nome capaz de liderar uma frente de esquerda para ir ao segundo turno, já que os dois nomes alternativos do PT, Jaques Wagner e Fernando Haddad, não chegam a empolgar nem o próprio partido.
Wagner já disse que não quer ser candidato e Haddad foi derrotado no primeiro turno quando tentou a reeleição na disputa municipal de 2016.
Aos que acham impossível o PT apoiar Ciro Gomes, lembro um episódio que testemunhei no final de 1993.
Na cantina do Mário, próxima ao Instituto Cidadania, onde eu trabalhava como assessor de imprensa de Lula, o então candidato petista, já em campanha para 1994, se reuniu com os tucanos Ciro Gomes e Tasso Jereissati para discutir algo que também parecia impossível: uma aliança do PT com o PSDB.
Numa longa conversa, discutiu-se uma chapa Lula-Tasso, com as bençãos de Ciro.
Alguns meses depois, no entanto, embalado pelo Plano Real, Fernando Henrique Cardoso, então ministro da Fazenda, lançou-se candidato ao Planalto em aliança com o PFL de ACM, e o resto da história nós conhecemos.
Ciro acabou indo para a Fazenda no final do governo de Itamar Franco, depois da queda de Rubens Ricupero, que havia assumido o lugar de FHC.
Na época em que trabalhamos juntos, nos dois primeiros anos do governo de Lula, tive longas conversas com Ciro, ministro da Integração Nacional. Morávamos no mesmo hotel e muitas vezes dividimos o café da manhã.
Tive dele a melhor impressão. Ciro fala sempre o que pensa, sem pensar duas vezes, gosta de uma boa briga, e talvez esse seja o seu maior adversário como demonstrou em duas campanhas presidenciais: o temperamento mercurial.
É um político atípico para os padrões nacionais, um sujeito que não faz média com ninguém, vai em frente naquilo que acredita, e há tempos vem construindo um programa de governo do qual não ouvimos falar porque não tem acesso aos grandes meios de comunicação.
Em resposta ao leitor Pedro Paulo, respondi que considero Ciro Gomes preparado, sim, além de ser o único presidenciável competitivo não citado nas delações da Lava Jato.
Bom de debate e de discurso, se conseguir unir o campo da esquerda, o que não será nada fácil, em breve poderemos ouvir falar no nome dele.
Se falarão bem ou mal, é outra questão, mas não dará para ignorá-lo.
Vida que segue.
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Briguilina: Eu falei faz tempo. Defendi a chapa Lula/Ciro. Continuo pensando do mesmo jeito. Desde já Lula e Ciro assumem a chapa e colocam nas ruas. Caso a máfia jurídica impeça a candidatura de Lula, então Ciro assume a cabeça de chapa e a frente progressista escolhe um nome para ser vice dele, que pode ser ou não do PT. O mais importante será o programa que devem apresentar ao país.
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