O orgulho de ser idiota

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A burrice envaidecida no Reino de Bolsonaro, por Wilton Cardoso Moreira
Os idiotas, em algumas ocasiões da história, se convencem da “genialidade” de sua idiotia e, por isso, se envaidecem dela. Tornam-se pavões da burrice, exibindo-a como se fosse a coisa mais bonita e rara do mundo. Qualquer semelhança com Eduardo Bolsonaro não é mera coincidência.
Vamos começar pelo capitão da nave do caos, Jair Bolsonaro. Há comentaristas que implicam com seu português e sua educação formal deficiente, como implicavam com Lula. Mas isto é o que menos importa. O que conta mesmo é a inteligência política de cada um e, nesta seara, comparar Bolsonaro com Lula é até covardia. O petista é, hoje, o político brasileiro (e talvez do mundo) mais inteligente que existe. Os poucos brasileiros à sua altura estão todos mortos. Lula está no patamar de gente como Juscelino, Getúlio e Joaquim Nabuco. A sua prisão, com o objetivo de impedi-lo de disputar as eleições é a prova de que até seus adversários reconhecem isso. Politicamente, o homem é realmente um perigo para os adversários, ganhe ou perca as eleições que dispute.
Bolsonaro, por outro lado, não sabe e não parece ter capacidade de aprender nada de nada nesta área. Não tem a mínima ideia, por exemplo, de política externa ou de economia. Não que ele precise ser especialista nestas áreas, como são o diplomata e o economista, mas tem que entendê-las a fundo em sua dimensão política, como afetam a vida do povo e mexe com os interesses das elites, que relação mantêm com o poder político, quais são seus diversos atores e suas demandas, como se comportam, quais seus pontos fracos e fortes, como reagem se contrariados, que poder de retaliação eles têm, os custos e benefícios políticos de alianças etc.
Dois exemplos cristalinos do exercício vaidoso da burrice por parte de Bolsonaro, antes mesmo de assumir a presidência, são a saída repentina dos médicos cubanos e a provável mudança da embaixada brasileira para Jerusalém.
Cuba sabia que teria que sair do acordo e creio que desejaria fazê-lo antes de Bolsonaro assumir, pois este, no poder, poderia substituir ou absorver os médicos cubanos de forma mais planejada e ainda dizer que enxotou os comunistas daqui. Pois não é que ele deu, com suas declarações desastradas, a chance de Cuba se retirar do programa Mais Médicos, e como parte ofendida?
No caso da embaixada, nossos concorrentes agroexportadores estão ávidos para Bolsonaro cumprir sua promessa de mudar nossa representação diplomática para Jerusalém, contrariando o direito internacional e as recomendações da ONU e do bom senso diplomático. Como dois e dois são quatro, os árabes vão retaliar, fechando seu rico mercado de proteína animal para nós. Ato contínuo, nossos ferozes concorrentes lutarão entre si para ocupar o vazio deixado por nossas exportações, que levaram décadas de muito esforço diplomático para se consolidarem.
Quando digo burrice, não estou falando de ignorância, mas de burrice mesmo, de falta de capacidade de ler e entender o mundo, de aprender, contextualizar, de abstrair e fazer correlações entre as ideias e o mundo real, de pensar estrategicamente o jogo de poder nacional e mundial, sabendo calcular bem a distância entre o que se quer e o que se pode e planejar o caminho a seguir para se chegar mais próximo dos objetivos, se adaptando às constantes imprevisibilidades da política. O clã Bolsonaro, pai à frente, não tem inteligência alguma para esse jogo complexo do poder e, para piorar, se cerca de políticos de quinta categoria, como Onix Lorenzoni e Delegado Waldir, para assessorá-los.
Marxismo cultural e globalismo: o achado filosófico do século

O pior é que esta burrice atinge também o núcleo, digamos, “intelectual” do futuro governo, que parece ter como “think tank” a Escola Eu-Sozinho Atrológo-Filosófica Olavo de Carvalho. Até agora, parece que três discípulos mais entusiasmados desta escola comporão o futuro governo: os futuros deputado Eduardo Bolsonaro, chanceler Ernesto Araújo e ministro da educação Ricardo Vélez Rodríguez.
Vamos nos concentrar nos dois últimos e em seu mestre Olavo, uma vez que parecem ser, por profissão ou vontade, intelectuais. Escrevem e falam bem a língua padrão, têm (e fazem questão de mostrar) cada um sua carga de erudição e se aventuram a pensar, ao que parece, de forma original. É neste último quesito que mora o perigo. Eles acreditam num tal “marxismo cultural” que domina o mundo das ideias no Ocidente e estaria por trás do “globalismo” que está acabando com as tradições ocidentais, as nações e o modo de vida cristão.
Vou tomar o que eles chamam de globalismo pelo que entendemos de globalização no plano cultural e econômico. Ora, é óbvio tanto para o mais liberal, quanto para o mais conservador dos intelectuais, que as ondas globalizantes modernas, que começam com o mercantilismo ibérico, tomam novo impulso com o imperialismo inglês e outro ainda com a hegemonia econômica norte-americana no pós-guerra são manifestações capitalistas, impulsionadas pelos mercados. Os interesses que movem o “globalismo” são os do dinheiro, da disputa de mercados e matérias-primas, da reprodução do capital, das elites capitalistas das metrópoles, chame como quiser, mas não há comunismo por trás de nenhuma onda globalizante. Nos dias de hoje é fato empírico que a globalização, seja cultural ou econômica, favorece as grande corporações mundiais e algumas poucas imensas fortunas individuais. Onde está o marxismo “nisso daí”?
E mais, o que todas estas ondas de globalização fizeram, ao longo dos séculos, foi justamente disseminar a cultura do ocidente e matar as culturas locais não ocidentais. Culturalmente, o Japão de hoje é muito mais parecido com os EUA e Europa atuais do que com o Japão do século XIX, ainda feudal. Se o catolicismo e outras tradições ocidentais estão sendo levados de roldão no processo de modernização, é porque é da natureza deste processo destruir e recriar continuamente suas próprias bases culturais e materiais. Não precisamos ler Marx (“tudo que é sólido se desmancha no ar”) para saber disso, basta estudar Weber e os iluministas. Estes, aliás, advogavam a morte das tradições em prol da razão e do progresso. E definitivamente Weber e os iluministas não são marxistas – os segundos, inclusive, por uma questão cronológica.
Mas os nossos ilustres intelectuais bolsonarianos devem culpar o “marxismo cultural” pelo “globalismo” porque Marx e a maioria dos marxistas defendem que a luta pela emancipação socialista deve ser global e não nacional. Mas eles deixam bem claro que assim o pensam porque o capital é, desde sempre, uma força mundial e, por isso, seu enfrentamento só pode se dar por um movimento socialista internacional, sob pena de derrota. Então, o marxismo não é o inventor do “globalismo”, mas o internacionalismo socialista que os marxistas defendem á uma consequência do “globalismo” inerente ao capital. Os marxistas são tão claros nisto, é uma relação simples de causa e efeito que Olavo e seus pupilos invertem por incapacidade de leitura, ou seja, por burrice.
Aliás, os marxistas de verdade são minoria nas áreas de humanas das universidades ocidentais, mas não podemos negar que o pensamento de Marx, assim como o de Freud, foi absorvido, em maior ou menor grau, por muitas correntes de pensamento. Vamos considerar, com muita boa vontade, que os marxistas “raiz” (que não vão me perdoar pelo que direi) e os que, de alguma forma, foram influenciados por Marx sejam todos marxistas. Nesta categoria estariam então os sociais-democratas, keynesianos, progressistas em geral e culturalistas. Ampliando o marxismo dessa forma (o que é um absurdo, mas vá lá), é bem provável que a maior parte da academia possa ser chamada, de fato, de marxista. O mesmo se pode dizer, seguindo este “raciocínio”, dos professores das áreas de humanas formados pela academia e que darão aulas aos filhos das “pessoas de bem” no ensino básico.
Suponhamos então que estes educadores (da academia e do ensino básico) disseminem em suas aulas as suas ideias vermelhas, mesmo que sejam “marxistas” apenas por influência longínqua. Chamemos isso de “marxismo cultural”. Vejam bem, dei dois temerosos passos, primeiro, ao considerar marxismo correntes de pensamento que apenas consideram Marx um pensador fecundo e, depois, aceitar que os professores que pensam mais ou menos de acordo estas com correntes disseminam o marxismo entre jovens e crianças.
Depois, considerando que esta doutrinação dos alunos no “marxismo cultural” vem sendo praticada no Brasil e no Ocidente desde a década de 60, quando o socialismo real da URSS começou a cair em desgraça nos meios intelectuais ocidentais, podemos nos perguntar: após esta maquiavélica conspiração gramsciana ser levada a cabo, o que ela colheu como resultado? O que há de pensamento ou prática marxista sendo efetivada na sociedade ocidental? A subjetividade do indivíduo ocidental vêm, desde as revoltas dos anos 60, se tornando mais e mais capitalista e o que se espalha como rastilho de pólvora na alma dos jovens é o empreendedorismo, a ética do trabalho, a meritocracia, a educação como preparação para o mercado e a reivindicação liberal da igualdade de condições para a competição no mercado.
O liberalismo nos costumes e as revindicações de igualdade para as minorias, como mulheres, LGTBs e negros, em nada contraria a ideologia liberal ou neoliberal de livre-mercado, antes a reforça, ao incluir no mercado massas antes alheias ao circuito do dinheiro. A social-democracia e todos os que advogam o estado do bem estar social (as chamadas esquerdas) nada mais fazem que reforçar o domínio do capital ao democratizá-lo. Isto é fato histórico e os 30 anos gloriosos do capitalismo, todos eles sob a batuta social-democrata, o provam: o mundo ocidental não ficou menos capitalista depois deles, muito pelo contrário.
Onde está o marxismo cultural aí? Onde está a massa de revolucionários querendo derrubar o capitalismo? Onde estão os sonhos subversivos dos jovens e suas utopias de esquerda? Ao contrário, a maioria absoluta das pessoas estão tão imersas no modo de vida capitalista que sequer consegue tomar consciência dos problemas sociais e ecológicos que o capitalismo provoca, quanto mais pensar em alguma alternativa a ele.
Se há um conceito que talvez seja pertinente à situação atual não é o “marxismo cultural” mas sim o de “capitalismo cultural” ou, para ser mais preciso, de “cultura capitalista”, no sentido em que o capitalismo acaba por se configurar como totalidade não apenas na dimensão material, como um sistema econômico, mas também na dimensão simbólica, que molda a subjetividade dos indivíduos, sua forma de ver, sentir e se comportar no mundo. Ou seja, o capitalismo é uma cultura, no sentido antropológico do termo.
É preciso, então, muita burrice para encontrar, na realidade atual do capitalismo global, qualquer tipo de hegemonia, predomínio ou até mesmo influência de “marxismo cultural”. A constatação da existência da hegemonia marxista, no âmbito da cultura ocidental, é resultado de uma incapacidade intelectual primária do Olavo de Carvalho e seus olavetes: a de relacionar teoria com realidade. Afinal, se o real não se conforma às minhas ideias, às favas com o real.
Mas Olavo de Carvalho, Ernesto Araújo e Ricardo Vélez Rodríguez se pavoneiam com as teorias do globalismo e do marxismo cultura e se veem como santos guerreiros da intelectualidade a combater estas ideias malévolas espalhadas pelos demônios vermelhos. E não param por aí, pois em conjunto com a “intelectualidade” evangélica combatem também a “ideologia de gênero” que, aliás, faz parte do programa herético do marxismo cultural.
A quantidade de seguidores de Olavo de Carvalho vinha amealhando indicavam a ele que sua genialidade era certa: o critério dos pavões para sua qualidade é o volume dos aplausos. A sua eleição, pelo clã Bolsonaro, como pensador oficial da república e conselheiro presidencial, coroam o pavão, e seus pavõezinhos, como reis absolutos da estupidez nacional.
Não é à toa que as esperanças de racionalidade e parcimônia estejam sendo depositadas, pelos analistas da direita e da esquerda, nos genrerais linha-dura que comporão o governo Bolsonaro! O generais Heleno e, por incrível que pareça, Mourão, se transformaram, de repente, num oásis de bom senso em meio à idiotia gerneralizada da nova corte que assumirá o nosso pobre reino tropical.
Vida que segue...
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