Quando eu tinha a tua idade
Ai, meu Pai do céu, não nos deixe cair na tentação de dizer ao nosso filho ou à nossa filha qualquer coisa que comece com “Quando eu tinha a tua idade...”. Dificilmente haverá, nas sempre difíceis relações entre pais e filhos, frase mais perigosa. Para começar, ela alarga a brecha entre as gerações, este fosso que separa adultos de crianças ou adolescentes, e cuja largura, nesta era de rápidas transformações, se mede em anos-luz. No entanto, os pais a usam, é uma coisa automática. Olhamos o quarto desarrumado e observamos: “Quando eu tinha a tua idade, fazia a cama sozinho”. Examinamos a redação feita para a escola e sacudimos a cabeça: “Quando eu tinha a tua idade, não cometia esses erros de ortografia. E a minha letra era muito melhor”.
Sim, a nossa letra era melhor. Sim, íamos sozinhos até o centro da cidade. Sim, aos dez anos já trabalhávamos e sustentávamos toda a família. Sim, éramos mais cultos, mais politizados, mais atentos. Conhecíamos toda a obra de Balzac, entoávamos todas as sinfonias de Beethoven. Éramos o máximo. Mas éramos mesmo? Se entrássemos na máquina do tempo e recuássemos algumas décadas, será que teríamos a mesma impressão? Sim, íamos até o centro da cidade, mas a cidade era menor, mais fácil de ser percorrida. Sim, trabalhávamos – mas havia outra alternativa?
Cada geração recorre às habilidades de que necessita. Sabíamos usar um martelo ou consertar um abajur, mas eles dedilham um computador com a destreza de um virtuose. Nós jogávamos futebol na várzea, mas agora que a febre imobiliária acabou com os terrenos baldios, os garotos fazem prodígios com o skate nuns poucos metros quadrados.
Bem, mas então não podemos falar aos nossos filhos sobre a nossa infância? Longe disso. Há uma coisa que podemos compartilhar com eles; os sonhos que tivemos, e que, na maioria irrealizados (ai, as limitações da condição humana), jazem intactos, num cantinho da nossa alma. São estes sonhos que devemos mobilizar como testemunhas de nosso diálogo com os jovens.
Fale a uma criança sobre aquilo que você esperava ser; fale de suas fantasias:
- Quando eu tinha a tua idade meu filho querido, eu era uma criança como tu. E era muito bom. Eu era alegre, era feliz exatamente como tu é hoje.
Coleção melhores crônicas: Mocyr Scliar. Luis Augusto Fischer. Global Editora (Adptado).
Clique no anúncio que te interessa, o resto não tem pressa
- Quando eu tinha a tua idade meu filho querido, eu era uma criança como tu. E era muito bom. Eu era alegre,
ResponderExcluir"era feliz exatamente como tu é hoje.". TEM CERTEZA DISSO?