Crônica dominical de Paulo Coelho

Fragmento de um diário inexistente IV

Fort Lauderdale, fevereiro de 1994 - Depois de uma exaustiva manhã dando palestras para crianças, vou almoçar com uma amiga advogada, Shelley Mitchel. No restaurante, sentamos numa mesa ao lado de um bêbado, que insiste em puxar conversa o tempo todo. Fala do sofrimento por ter sido abandonado por sua mulher, diz o quanto está triste, pergunta-nos o que deve fazer.
A certa altura, Shelley pede ao bêbado para ficar quieto. Mas ele insiste:
- Por quê? Eu falei de amor como um homem sóbrio nunca fala. Demonstrei alegria e tristeza, tentei comunicar-me com estranhos. O que há de errado nisto?
- O momento não é apropriado - responde ela.
- Quer dizer que existe hora certa para sofrer por amor?
Depois desta frase, convidamos o bêbado para a nossa mesa.
Rio de Janeiro, 1972
Na época em que eu praticava meditação zen-budista, havia um momento em que o mestre ia até o canto do dojô (local onde os discípulos se reuniam) e voltava com uma varinha de bambu. Todos os alunos que não haviam conseguido se concentrar direito, precisavam levantar a mão neste momento; então o mestre se aproximava, e dava três golpes em cada ombro.
No primeiro dia, isto me pareceu medieval e absurdo. Mais tarde, entendi que muitas vezes é necessário colocar no plano físico a dor espiritual, para ver o mal que ela causa. No caminho de Santiago, aprendi um exercício que consistia em cravar a unha do indicador no polegar quando pensasse algo prejudicial.
As terríveis consequências dos pensamentos negativos são percebidas muito tarde. Mas fazendo com que eles - através da dor - se manifestem no plano físico, nos damos conta do mal que nos causam, e terminamos por evitá-los.
San Martin de Unx, dezembro de 1994
Caminho por uma aldeia deserta na Espanha, e escuto uma banda de música. É feriado, todos estão se divertindo numa festa em uma casa particular - menos eu. Estou só, e não tenho com quem conversar. Há quatro meses estou viajando para a promoção dos meus livros, e me pergunto se afinal vale a pena tudo isto - se não devia largar tudo agora, e voltar para o Brasil. As ruas da aldeia são estreitas, anoitece, e a solidão fica mais difícil de aguentar.
De repente, ouço a voz de um homem cantando; deve ser o único na cidade que não foi à festa. "Por quê?", pergunto para mim mesmo. Será que não gostam dele? Será que ele não gosta de festas? De qualquer maneira, escuto sua voz, e sinto que está alegre. Consigo entender alguns versos da canção:
"Nestes dias todos os ventos do mundo/ sopram na direção de quem sonha./ Nestes dias a chuva sempre desenha/ o rosto de quem amamos".
Anoto os versos num bloco que às vezes carrego comigo. Nunca conhecerei este homem. Nunca saberei seu rosto ou sua idade. E ele nunca saberá que, nesta tarde gelada, me ensinou que eu não estava sozinho, e me devolveu a alegria e a coragem.
Rio de Janeiro, 1994
Um padre da Igreja da Ressurreição, em Copacabana, aguardava pacientemente seu momento de comprar carne no supermercado, quando uma mulher tentou "furar" a fila.
Começou então um festival de agressões verbais dos outros fregueses, que a mulher respondia com igual veemência. Quando a situação parecia insuportável, alguém gritou: "Ei, madame, Deus te ama!".
- Foi impressionante - conta o padre. - Num momento em que todos pensavam em ódio, alguém falou de amor. Na mesma hora, a agitação desapareceu por encanto. A mulher se encaminhou para o seu lugar correto na fila, e os fregueses se desculparam por reagirem tão agressivamente.

Sonegômetro: Brasil toma “goleada” em sonegação de tributos, aponta Sinprofaz

Em 2014, o Brasil deve ultrapassar a marca de impostos sonegados registrada no ano passado, que foi R$ 415 bilhões
O valor de impostos sonegados no Brasil está próximo de alcançar R$ 300 bilhões. Os dados são do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz) e foram calculados pelo sonegômetro: ferramenta em forma de placar, que calcula quantos reais o país deixou de arrecadar com a sonegação de tributos.
Para facilitar o entendimento do contribuinte, o presidente do Sinprofaz, Heráclio Camargo, fez uma comparação entre o valor de tributos sonegado e o gasto global com a Copa do Mundo de 2014 – segundo dados da Matriz de Responsabilidade Consolidada do Ministério do Esporte. Ele explica que a sonegação fiscal no país em um ano foi doze vezes maior que os gastos com a Copa (da ordem de R$ 25,6 bilhões).
“Houve uma discussão muito grande na sociedade sobre os gastos da Copa. Chegamos agora, no começo de agosto, com 12 vezes esse valor – de R$ 300 bilhões, sonegados no Brasil. Então, se a Copa do Mundo motivou uma discussão, por que não a sociedade discutir com muito mais ênfase esse 12 a 1 da sonegação contra o Brasil?”, questionou. “É uma goleada que o Brasil infelizmente toma da sonegação de tributos”, disse o presidente do Sinprofaz.
Heráclio Camargo frisou que a intenção do Sinprofaz é trazer a discussão da tributação e sonegação para a sociedade. “É uma questão que está presente no dia a dia. A tributação está embutida em todos os produtos e serviços. As pessoas devem saber disso para cobrar contrapartidas dos governos”.
Em estudo iniciado em 2012 e publicado em 2013, o Sinprofaz mostra que se não houvesse sonegação fiscal, o peso da carga tributária poderia ser reduzido em 28,2% e ainda assim, manter o mesmo nível de arrecadação.
A expectativa do Sinprofaz é que, em 2014, o Brasil deve ultrapassar a marca de impostos sonegados registrada no ano passado, que foi R$ 415 bilhões. Segundo o sindicato isso se deve ao crescimento econômico e à inflação. “Infelizmente, nós atingiremos os R$ 300 bilhões antes do que a data do ano passado.”
Foto de capa: Marcello Casal Jr/ABr
http://www.revistaforum.com.br/blog/2014/08/sonegometro-brasil-toma-goleada-em-sonegacao-de-tributos-aponta-sinprofaz/
da Agência Brasil

Charge do dia

Duke/O Tempo

Luis Nassif : Mirian Leitão pode ter sido alvo de acerto interno na Globo

Vamos juntar algumas pecas de quebra-cabeça.

Peça 1 – a denúncia em si.
Mirian Leitão pode ter sido alvo de acerto interno na Globo
O Globo transforma em denúncia o uso de um computador da rede wi-fi do Planalto para alterar o perfil de dois jornalistas na Wikipedia.

A rede possui certamente mais de dois milhares de usuários internos do Palácio, incluindo a Sala de Imprensa. É um mero problema corporativo ao qual não está imune nenhuma grande corporação. É essa a razão de, em muitas empresas, o servidor bloquear acesso às redes sociais.

Trata-se, portanto, de uma questão funcional menor que, dentro do padrão atual do jornalismo brasileiro, é tratado como escândalo.

Até aí explica-se: coma falta de filtros jornalísticos até bocejo de padre vira escândalo.

Peça 2 – a divulgação do conteúdo apócrifo no perfil de Mirian Leitão.

Aí o quadro fica um pouco mais complicado.

Qual a razão do jornal dar o destaque que deu às acusações a Mirian – envolvendo, inclusive, episódios menores ocorridos por ocasião da Operação Satiagraha? Não tem lógica. Transformou uma caso restrito de trollagem na Wikipedia, que até então passara despercebido, em tema nacional, expondo sua própria colunista de uma maneira aparentemente incompreensível.

Incompreensível, talvez, para quem não acompanha profissionalmente os meandros do jornalismo.

Peça 3 – o papel de Mirian no sistema Globo. 

Em temas econômicos, Mirian permanece representante do establishment financeiro.

Mas, nos últimos anos, cresceu jornalisticamente, e ganhou luz própria em temas muito além dos financeiros.

A dimensão pública que conquistou deu-lhe uma autonomia relativa de opinião em relação a parte da pauta, assim como para poucos outros jornalistas, como Jânio de Freitas.

Abraçou bandeiras legitimadoras indo clara e corajosamente na contramão dos que passaram a definir a linha editorial do grupo, como na questão das políticas de cotas para negros, na denúncia dos crimes da ditadura. Sua posição certamente pesou na mudança da linha editorial do jornal, especialmente em relação aos crimes da ditadura. 

Teve inclusive a coragem de investir contra colunistas agressivos da nova direita.

Talvez por aí se entenda melhor a represália de que foi alvo.

Tempos atrás, a Folha abriu espaço em sua página de opinião para que um neocon agredisse dois repórteres que ousaram criticar o discurso anti-cotas de Demóstenes Torres no STF (Supremo Tribunal Federal). Na sequência, foi a vez de Jânio de Freitas sofrer ataques dentro do próprio jornal.

A briga interna de O Globo não chegou a esse ponto. Mas a divulgação desnecessária da trollagem mostra que, por lá, a vingança se come a frio. Não foi represália das Organizações Globo, mas de grupos internos.

Jogou Mirian aos leões da Internet que, por alguns dias, terão carne fresca para se refestelar.

PS - Pessoal, para que não prosperem teorias conspiratórias: o episódio, se ocorreu, foi motivado por disputas internas, não como política da empresa contra sua colunista.

A taxa de inflação de julho foi a menor nos últimos quatro anos

Esta é, claramente, uma boa notícia para o Brasil. Você diariamente lê e ouve informações apocalípticas sobre a inflação.

E os brasileiros sabem o que inflação significa. Nos dias de Sarney – e de Mailson, hoje transformado em professor de economia em colunas e artigos na mídia – a inflação chegou a 80%.

Ao mês.

De novo: aquela é uma boa notícia.

Como você faz para lidar com ela, se você gostaria secretamente que a taxa disparasse para usar isso contra Dilma?

Um giro breve pela imprensa me mostrou, ou me confirmou, que há dois caminhos.

O mais simples é ignorar, e torcer para que o leitor não perceba e não se sinta prejudicado pela desinformação.

Foi o que a Veja fez em seu site.

O segundo é embrulhar a boa notícia cuidadosamente em duas más notícias.

Foi o que o Jornal da Globo fez.

Ali está dito, logo na primeira linha, que o que fez a inflação baixar foram os juros altos e a baixa taxa de crescimento.

Dois fatos negativos – juros altos e crescimento baixo – obliteram a informação positiva.

Isso quer dizer que você fica sem possibilidade de ser elogiado no campo da inflação.

Se ela sobe, você é o responsável. Dilma e equipe, quero dizer.

Se ela desce, você não tem mérito nenhum. É culpado, na verdade, pelas coisas ruins associadas à boa notícia. No caso, os juros altos e o baixo crescimento.

E note: controlar a inflação sempre se fez exatamente assim. Você eleva os juros, e isso diminui o consumo porque o crédito fica mais caro.

Menos consumo significa menos inflação. E menos crescimento, também.

Quando, num momento de desconcertante franqueza, Aécio prometeu a empresários "medidas impopulares", estava se referindo exatamente a isso.

Foi aplaudido pela plateia.

E na hipótese de fazer isso como presidente, caso se eleja, em algum momento aparecerá a notícia de uma baixa taxa de inflação.

A Veja não a omitirá. O Jornal da Globo não fará ressalvas.

Essa a diferença.

O público das grandes empresas de jornalismo é constantemente manipulado.

A sorte, para a sociedade, é que a internet oferece hoje um contraponto.

Ou seríamos todos, ou quase todos, manipulados.

Sobre o Autor

O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

Veja comete mais um crime

Uma perícia contratada pelo senador Delcídio Amaral (PT/MS) demonstra que a revista Veja editou a fita que motivou a capa da última semana, sobre uma suposta farsa na CPI da Petrobras; "Do arquivo analisado separamos segmentos que demonstram a edição do mesmo, sendo claramente perceptível pelo menos duas interrupções na sequência das falas", diz a análise do IPC, o principal instituto de perícias do Mato Grosso do Sul; "O uso de palavras separadas de sua sequência original pode trazer interpretação destoante do efetivo contexto em que teriam sido empregadas"; ontem, em entrevista ao 247, o ministro Ricardo Berzoini defendeu que Veja apresente a íntegra de sua fita gravada com uma caneta espiã; a revista da Marginal Pinheiros aceitará o desafio?
 
247 - O laudo elaborado pelo Instituto de Perícias Científicas de Mato Grosso do Sul revela que a gravação da conversa entre dois funcionários da Petrobras – José Eduardo Barrocas e Bruno Ferreira – e uma outra pessoa não identificada, divulgada esta semana pela revista Veja, foi editada, o que compromete qualquer avaliação sobre a participação de senadores em uma suposta tentativa de fraudar os trabalhos da CPI da Petrobras, conforme denunciado com alarde pela revista.
 
O documento, assinado pelo perito Fernando Klein, conclui , com base na análise feita na gravação disponibilizada pela Veja em seu site na Internet, com duração de 2 minutos e 40 segundos, que não há uma sequência lógica que permita vincular o senador Delcídio do Amaral (PT/MS) a eventual orientação repassada aos depoentes da CPI da Petrobras, uma vez que no momento imediatamente anterior à citação do nome "Delcídio" na conversa há uma interrupção de 1 minuto e 14 segundos na gravação, o que comprova a montagem.
 
O laudo esclarece que o uso de arquivo editado pode trazer interpretações equivocadas em relação ao contexto de todo um diálogo.
 
"Do arquivo analisado separamos segmentos que demonstram a edição do mesmo, sendo claramente perceptível pelo menos duas interrupções na sequencia das falas, a primeira com 1 minuto e 12 segundos e a outra com 1 minuto e 30 segundos. O uso de palavras separadas de sua sequência original pode trazer interpretação destoante do efetivo contexto em que teriam sido empregadas. Dessa forma, não há credibilidade para a interpretação do conteúdo e da aplicação dos diálogos constantes na gravação de 2 minutos e 40 segundos disponibilizada no sítio eletrônico da revista Veja, dada a evidente edição do mesmo", assegura o perito.
 
O IPC é o maior e mais conceituado instituto de perícias de Mato Grosso do Sul. Ele é responsável por pelo menos 70 % de todas as investigações periciais requisitadas pela Justiça no estado. 
 
Nesta quarta-feira, em entrevista ao 247, o ministro Ricardo Berzoini, das Relações Institucionais, defendeu que Veja apresente a íntegra de sua fita gravada com uma caneta espiã.

Mas, que parece?...

Reprodução
Parece