Gasto com juros está quase igual ao de pessoal


Do Valor

João Villaverde, de São Paulo
Uma diferença que já foi superior a cinco pontos percentuais hoje é menor que 0,5 ponto. Se o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) este ano for de 6%, como as estimativas do mercado apontam, os gastos do governo com pessoal e encargos podem atingir a marca de 5% do PIB, ao mesmo tempo em que as despesas com pagamentos de juros da dívida pública oscilarão num nível pouco superior a isso. Na década, será a menor diferença entre as duas rubricas do orçamento federal e, mantida essa dinâmica, os gastos podem eliminar a diferença histórica já no ano que vem, com ambas alcançando 5% do PIB.
As despesas com juros, que como proporção do PIB já beiraram os 10% nos anos 90, já são metade disso. Os R$ 169,1 bilhões empenhados pelo governo com pagamentos de juros da dívida pública em 2009 equivaleram a 5,4% do PIB. Ao mesmo tempo, os gastos com encargos e pessoal vêm ganhando força rapidamente. Em 2008, foram, segundo dados do Tesouro, R$ 130,8 bilhões. No ano passado, os gastos tiveram ampliação de 15,9%, alcançando R$ 151,6 bilhões – o equivalente a 4,84% do PIB. Para 2010, após o corte promovido pelo Planejamento na semana passada, os gastos com pessoal devem alcançar R$ 167,5 bilhões e, com isso, bater em 5% do PIB. As despesas com juros, por outro lado, devem diminuir um pouco, alcançando 5,3% – uma vez que o impacto da alta da Selic, que virá a partir do mês que vem será diluído pelos títulos pré-fixados, mais procurados.
Os gastos com juros são impactados principalmente pelas oscilações da Selic, a taxa básica da economia. Entre 2000 e 2006, a taxa Selic média anual foi sempre superior a 15%, com auge de 23,45% em 2003. Em 2007 e 2008 variou na faixa dos 12% e, no ano passado, atingiu a mínima de 10,07%. Já as despesas com pessoal respondem à decisões do Executivo, que pode ampliar o salário de carreiras do setor público ou arrochar salários. Nos últimos dez anos, despesas com pessoal e encargos sociais oscilaram em níveis próximos a 4,5% do PIB, elevando-se mais consideravelmente a partir de 2007.
As despesas mais elevadas com pessoal, no entanto, só passaram a ocupar parcela maior do PIB quando a atividade recuou – em 2007 e 2008, com alta de 6,1% e 5,1% no PIB, respectivamente, a elevação dos gastos foi diluída. No ano passado, quando o PIB sofreu queda de 0,2%, a relação atingiu 4,8%. A previsão de gastos para essa rubrica em 2010 é de R$ 167,5 bilhões, uma alta de 10,4% em relação a 2009. Com isso, os gastos com pessoal em proporção do PIB devem atingir 5% neste ano, a maior fatia do PIB na década.
Em movimento contrário, as despesas com juros perdem espaço no Orçamento. Entre 2000 e 2007, os gastos com pagamento de juros tomaram pelo menos 6% do PIB, tendo alcançado 8,5% em 2003. A partir de 2008, a parcela do PIB transferida a detentores de títulos públicos foi inferior a 6% pela primeira vez – 5,4%.
Dos R$ 169,1 bilhões pagos em juros nominais pelo setor público em 2009, o governo central foi responsável por R$ 149,8 bilhões, ou 88,5% do total. Em 2008, por outro lado, a participação do governo central foi bem menor: 58,8% da carga total de R$ 163,6 bilhões gastos com juros. O aumento da participação do governo central no bolo, em detrimento das estatais e dos governos regionais, se deu mesmo em cenário de queda na Selic. Entre 2008 e 2009, a Selic caiu de 13,75% para 8,75% ao ano. “Não fossem algumas medidas anticíclicas, as despesas com juros poderiam ter sido ainda menores no ano passado”, afirma Amir Khair, especialista em contas públicas.
Segundo Khair, duas estratégias de R$ 100 bilhões cada acabaram por aumentar a dívida corrigida pela Selic: o aumento de capital do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a liberalização do depósito compulsório. “O capital repassado pelo Tesouro ao BNDES foi corrigido pela Selic e os R$ 100 bilhões liberados do compulsório foram todos revertidos pelos bancos às operações compromissadas”, diz o economista.
As operações compromissadas são modalidades financeiras em que os bancos emprestam reais ao BC e são remunerados pela Selic. “O dinheiro do compulsório, em sua maior parte, não foi repassado para o crédito, mas passou a onerar os cofres públicos”, avalia.
Na semana passada, o BC sinalizou que voltará a elevar a Selic, após 19 meses de cortes ou manutenção da taxa. A alta, segundo calcula o mercado, deve levar a Selic para algo entre 11% e 12% ao ano até o fim de 2010. Segundo Bráulio Borges, economista-chefe da LCA Consultores, o impacto nos gastos será diluído pela forte alta do PIB.
Além disso, diz Borges, os títulos pós-fixados colocados em mercado ao longo do ano terão custo mais baixo que os pré-fixados, que embutem altas maiores que as que virão na Selic. “O mercado está cobrando prêmios muito altos para adquirir títulos públicos”, afirma ele, que calcula que “se todos os títulos vendidos daqui para frente pelo governo fossem corrigidos pela Selic, ainda que ela suba ao longo do ano, os gastos com juros seriam menores”. Nas contas do economista, o valor despendido com juros seria de 4,8% do PIB e não 5,3%, mantida a gestão de rolamento da dívida mobiliária.
Para Fernando Montero, economista-chefe da Convenção Corretora, gastos menores com juros não deveriam, necessariamente, refletir-se em aumento de despesas com pessoal e encargos. Segundo o economista, mais dinheiro transferido para pessoal acarreta em mais juros. “Quanto mais se amplia o gasto primário, maior é o estímulo ao consumo e o fortalecimento da demanda. Como a oferta não cresce de maneira tão dinâmica, passamos a consumir os investimentos estrangeiros”, raciocina. “Ao fim de 2010, teremos consumido toda a poupança externa disponível”, diz. Assim, avalia Montero, os juros precisarão subir para compensar o alargamento do déficit com o exterior e ao mesmo tempo controlar a demanda interna.
“Mas é claro que um ajuste fiscal seria mais eficaz, porque não atrapalharia o crescimento e não ampliaria os custos do Estado com pagamento de juros”, afirma Montero, para quem um aperto nas despesas com pessoal não ocorrerá em 2010, mas em 2011. “O início de governo, tanto em nível federal quanto estadual, costuma ser mais firme nos gastos, que são expandidos em anos eleitorais”.
A maior participação dos gastos com pessoal e encargos no PIB – de 4,3% em 2005 para 5% neste ano – deve ser analisada de outra forma, diz Khair. “É preciso verificar quanto da receita anual é revertida nos gastos.” Ele calcula que as despesas com pessoal e encargos em 2009 foram equivalentes a 20,5% da receita total, tendo se acelerado frente aos 18,3% apurados em 2008. Entre 2003 e o ano passado, diz Khair, os gastos com pessoal responderam por 19,8% da receita, em média. “Quase quatro pontos percentuais inferior à média apurada entre 1997 e 2002″, afirma.
Para Borges, da LCA, os gastos com pessoal devem ser analisados de forma “detalhada”. “É fácil olhar os números e achar preocupante”, afirma, mas “houve recomposição salarial em uma série de carreiras do funcionalismo, especialmente a partir de 2007″. São gastos que não serão repetidos. Afinal, avalia Borges, o aumento salarial só ocorre uma vez e seu impacto tende a se diluir com o crescimento da economia.

2 comentários:

  1. aumentam-se os gastos com pessoal sem que os benefícios sejam revertidos em favor do povo

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  2. Sr. Laguardia, pelo teu comentário cheguei a conclusão que funcionário público não é povo. Sabe que analisando pela otica e pratica tucana concordo contigo?
    Pra oces povo nem gente é.
    Mas, tenho dó de ô6 pois na democracia quem decide somos nós.

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