Assembleia de cotistas
O Congresso Nacional consumou ontem no vapt-vupt um ato para o qual não tivera coragem, ou força, ou ambas, na passagem de 2006 para 2007: equiparou o salário dos parlamentares ao dos ministros do Supremo Tribunal Federal.
E fez isso sem ao menos precisar conceder em outra alternativa, de reajustar sim os vencimentos de suas excelências mas cortando na verba indenizatória. Aquela usada pelos parlamentares para despesas relativas ao mandato.
Tive a curiosidade de fazer uma busca no noticiário daquela época, quando a proposta gerou reações e enfrentou resistência, ao ponto de inviabilizar-se. Autoridades econômicas apressaram-se a negar a possibilidade financeira do aumento. Hoje, os mesmos personagens, nos mesmos postos, recolhem-se ao silêncio.
Houve quatro anos atrás também alguma reação dos movimentos sociais, com destaque para a União Nacional dos Estudantes (UNE). Hoje, nada.
Os personagens não mudaram. Mudou foi o ambiente. Na política, a situação era algo paralela, com Luiz Inácio Lula da Silva tendo conquistado a reeleição. Talvez a diferença hoje esteja na relativa fraqueza dos equipamentos à disposição da sociedade para resistir ao poder. Uns foram absorvidos. Outros, derrotados na recente eleição.
Veremos qual a reação. Se vier, virá de canais insuspeitados. A política insititucional encontra-se acomodada e, digamos, encaixada na arquitetura do exercício do poder. Sua aparência é de uma sociedade por ações.
Mais que um desenho clássico de situação e oposição, parece uma assembleia de cotistas.
O Executivo não reagirá à proposta de aumento porque nela está contemplado. E o Judiciário ficará agora mais confortável, menos saliente, na companhia das outras duas hastes do tripé.
Os parlamentares antes do aumento ganhavam abaixo do razoável? Sim. O salário de quase R$ 27 mil reais é adequado para deputados, senadores, presidente, vice e ministros de Estado? Sim. O problema não é esse.
Preocupante é a coisa ter acontecido sem debate, sem resistência, sem indignação. Vimos transitando de um ambiente de histerias automáticas para um de acomodações automáticas. Tão ruim quanto, ou até pior.
Do exagero na crítica sempre se recolhe algo útil. Da paz dos cemitérios, nada.
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