Norma Bengell

Também eu ceei com os doze naquela ceia 
em que eles comeram e beberam o décimo terceiro. 
A ceia fui eu; e o servo; e o que saiu a meio; 
e o que inclinou a cabeça no Meu Peito.

E traí e fui traído. 
e duvidei, impacientemente, e descartei-me; 
e pus com Ele a mão no prato e posei para o retrato 
(embora nada daquilo fizesse sentido).

Não subi aos céus (nem era caso para isso), 
mas desci aos infernos (e pela porta de serviço): 
comprei e não paguei, faltei a encontros, 
cobicei os carros dos outros e as mulheres dos outros.

Agora, como num filme descolorido, 
chegou o terceiro dia e nada aconteceu, 
e tenho medo de não ter sido comigo, 
de não ter sido comido nem ter sido Eu.


Manuel António Pina (Sabugal, Portugal, 18 de novembro de 1943) - Além de poeta, é jornalista. Traduzido em várias línguas, em sua obra também se destaca a literatura infanto- juvenil. Também já escreveu peças de teatro e se dedica também às crônicas. Recebeu vários prêmios ao longo de sua carreira como o Grande Prêmio de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores em 2005 e o Prêmio Camões em 2011.

Um comentário: