Brasil menos desigual

Editorial
Folha de S. Paulo
Brasil é exemplo singular de expansão da classe média na última década; escolaridade pesa mais que Bolsa Família e aumento do salário mínimo

A análise da mudança na estrutura de renda do Brasil nos últimos 20 anos costuma atribuí-la aos programas de transferência, como Bolsa Família. Trata-se, no entanto, de um fenômeno mais profundo de inclusão, ancorado no aumento dos rendimentos do trabalho e da escolaridade.
Após três décadas de concentração de renda, os anos 1990 deram início a um processo continuado de redução da pobreza e de melhoria na distribuição. Segundo o CPS (Centro de Políticas Sociais) da FGV, entre 1994 e 2010 a pobreza caiu 67%, e mais de 50 milhões de pessoas foram incorporadas à classe média (ou classe C, definida pela renda domiciliar mensal entre R$ 1.000 e R$ 4.500, conforme dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2009).
Esse grupo correspondia em 2009 a 50,5% da população, contra 31% em 1993. Já a parcela com renda inferior a R$ 1.000, agrupada nas classes D e E, decresceu no mesmo período de 63% para 39%. E as faixas mais altas (A e B), com renda superior a R$ 4.500, perfazem 11% da população, quase duas vezes mais que em 1993.
O Brasil trilha um percurso inverso ao que se observa em outras partes do mundo. Na maioria dos países ricos, os salários têm perdido participação na renda total, e a parcela retida pelos estratos mais ricos não para de crescer.
O achatamento da classe média ocupa o centro do debate político nos Estados Unidos e na Europa. A trajetória de afunilamento da riqueza se impõe também em nações emergentes, como China, Índia e África do Sul. Parece haver uma persistente tendência de concentração de renda.
As razões para tanto são menos claras, mas podem estar associadas à urbanização mais recente, que propicia um fluxo contínuo de novos trabalhadores, oferta que tende a represar os ganhos salariais na base da pirâmide.
São várias as razões para a peculiaridade do Brasil. A queda da inflação proporcionada pelo Plano Real, de 1994, trouxe o primeiro grande movimento de inclusão dos mais pobres, mas entre 1996 e 2002 o avanço foi mais lento por efeito da recorrente instabilidade econômica no período de Fernando Henrique Cardoso na Presidência.
A partir de 2003, a desigualdade voltou a cair em ritmo mais rápido, com a aceleração do crescimento econômico, a formalização do mercado de trabalho e o alargamento da cobertura de programas sociais durante o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Tornou-se lugar-comum, nos últimos anos, atribuir a parcela principal de tais avanços às políticas de aumento real do salário mínimo e aos programas de transferência de renda. Os dados, contudo, indicam que, apesar de relevantes, esses dois elementos juntos respondem por apenas um terço da queda da desigualdade, em média (ainda que em vários Estados mais pobres essa parcela seja maior, acima de 50%).
O aumento do salário mínimo acima da inflação é importante, por seu impacto nos benefícios da Previdência, mas não atinge os mais pobres -pessoas à margem do mercado de trabalho. Visto desse ângulo, o Bolsa Família se revela mais eficaz, por focalizar aqueles que mais precisam de ajuda.
Não é só: o Bolsa Família também sai mais barato para o Tesouro. Com uma despesa anual de R$ 18 bilhões (equivalentes a 0,45% do PIB brasileiro), o programa beneficia 21% da população. Cada ponto percentual de redução da desigualdade custa quase três vezes mais se obtido pela via de aumento do salário mínimo.
Mais que elevações do mínimo e programas assistenciais, a causa predominante da melhoria distributiva parece estar no aumento da renda do trabalho em geral.
O crescimento de renda mais rápido entre os pobres tem forte correlação com o adicional de anos de estudo da população ocupada. Dito de outra maneira: o aumento da oferta educacional, com a universalização do ensino fundamental alcançada no período FHC, desempenhou papel essencial em alargar oportunidades para ganhos no rendimento dos trabalhadores.
A redução da desigualdade não é, portanto, fruto exclusivo de uma política pública isolada, como o Bolsa Família. É resultado do maior crescimento econômico da última década, mas também de políticas nas áreas de proteção social e educação que vêm de antes.
Melhorar o acesso ao mercado de trabalho por meio da educação é o instrumento mais poderoso de combate à pobreza, muito superior ao mero assistencialismo.
Qualificar a mão de obra, popularizar o microcrédito e melhorar a produtividade do setor de serviços, o que mais emprega, com impostos simplificados e leis trabalhistas que incentivem a formalização de pequenas empresas - eis a chave para solidificar os avanços sociais dos últimos anos.

5 comentários:

  1. Briguilino

    Parabéns.

    Nunca pensei que você publicaria este post. O gráfico por si só desmente a demagogia lulo petista de que o desenvolvimento social do Brasil começou com Lula.

    O gráfico e o artigo comprovam claramente o que sempre tenho dito aqui. O desenvolvimento social recente do Brasil teve início com o Plano Real, sem o qual não seria possível a arrancada que demos.

    No entanto há um cuidado que temos que tomar. O desenvolvimento social não deve ficar firmadoapenas no Bolsa Familia, e na dependência de uma distribuição de renda emergencial.

    A educação deve ser o alicerce de todo o desenvolvimento. Devemos formar mão de obra de qualidade com conhecimento tecnológico a altura das necessidades do Brasil.

    Desta forma o povo ficará cada vez menos dependente do Bolsa Família e mais independente em seu desenvolvimento social.

    Infelizmente temos visto a decadência da qualidade do ensino público no país nos últimos anos.

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    1. O gráfico e o texto mostram claramente que no governo Lula o crescimento da Classe C foi constante e muito mais acelerado que durante o desgoverno FHC. Mas inda tem gente que não enxerga isto, por que será?...

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    2. Para quem entende um pingo é letra, como diz o ditado popular.

      Tem gente que mesmo vendo que o crescimento da classe C teve início no governo FHC tem o desplante de chamar este governo de desgoverno. Puro preconceito e cegueira intelectual.

      Lógicamente a economia brasileira tinha que se organizar para que pudesse haver o crescimento social. Uma inflação que chegou a 83% em um único mês não acaba com um piscar de olhos. Uma economia desorganizada não volta para os trilhos em um ou dois anos.

      Qualquer idiota que entenda um pouco de economia sabe que a inércia faz com que leve algum tempo para que os resultados das medidas tomadas comecem a ter resultados.

      Falar em desgoverno FHC é não enxergar além do próprio umbigo. É miopia intelectual. É preconceito. No popular é dor de cotovelo.

      No futuro vamos sofrer as consequências da falta de investimentos na qualidade da educação pública, na falta de investimentos na educação básica, na falta de investimentos em ifra-estrutura, na saúde pública etc.

      Por que será que os lulo petistas sofrem tanto de miopia intelectual?

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  2. FHC foi o presidente mais incompetente de toda a história do Brasil. O responsável principal pelo Plano Real foi Itamar Franco, bom lembrarem disto. FHC, PSDB/PFL além de incompetentes são um bando de ladrões.

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    1. FHC era o Ministro da Fazenda. Lula foi contra o Plano Real, é bom lembrar disto.

      Nunca na história do Brasil houve um esquema de corrupção tão grande quanto no governo lulo petiista.

      Foi durante o governo FHC, como bem mostra o artigo em epígrafe, que o desenvolvimento social teve seu início, é bom não esquecer disto.

      O gráfico mostra isto claramente. Só não vê quem não quer ou quem está cego pela propaganda demagógica do lulo petismo.

      Não adianta voces querem esconder o sol com a peneira. Como neste artigo, a verdade sempre aparece.

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