É laico o aborto?

A defesa da legalização do aborto conta com dois pilares político-ideológicos explorados pelos abortistas, sendo um deles uma demanda criada pelos próprios. Os direitos reprodutivos e a laicidade do Estado. O primeiro seria hipoteticamente suprimido pela religião, portanto cabendo ao segundo a sua garantia.
O Estado laico surgiu para evitar perseguições religiosas e não para exterminar a religião. Foi um meio para que nos países ocidentais o grupo religioso majoritário, ou o que influenciasse o poder secular, não mais criminalizasse os adeptos de outros credos ou seitas. Foi a democratização da fé ou da sua inexistência. Deu a  cada um o direito de agir conforme sua consciência.

Um erro comum é atribuir a existência do Estado laico à revolução francesa. Como uma dádiva do iluminismo. Ora, o Estado que surgiu do movimento revolucionário era ao mesmo tempo anticlerical e confessional, sendo que qualquer um destes invalida o princípio do laicismo. Esta contradição pode parecer estranha, mas é real. Enquanto o anticlericalismo estatal perseguia o cristianismo, principalmente o catolicismo, incentivava o culto ao ser supremo. A divindade revolucionária que conduziria o povo, com a deusa razão, para desvelar o novo homem.

É comum ouvirmos dos defensores da legalização do aborto a sua aprovação como prerrogativa do laicismo. O Estado deve se ater aos princípios políticos e desconsiderar os dogmas religiosos. Neste caso os chamados direitos reprodutivos femininos se imporiam às crenças. Porém devemos perguntar quem são estas pessoas. Em sua quase totalidade são adeptas do marxismo ou das suas variações. Consideram a religião uma mera criação humana. Um conjunto ultrapassado de crendices que impede o progresso e a implantação das novas teorias e doutrinas, exatamente as que elas professam.

Limitando esta discussão ao campo materialista e aos princípios estabelecidos pelos seus teóricos, teríamos de um lado as antigas superstições em oposição ao novo direito racional. Este por possuir supostas bases científicas deve se sobrepor ao arcaico. Transforma-se numa disputa entre o moderno e o anacrônico. Um confronto entre as luzes, dos herdeiros do iluminismo, que pariu o terror, e as trevas. A supremacia da razão numa valoração feita pelos interessados diretos.

Podemos defender a vida utilizando os instrumentos políticos, não é necessário centrar exclusivamente na fé. A contenda pode e deve ocorrer na disputa partidária. Não é um duelo entre a religião e o Estado. É um embate entre duas correntes dentro da sociedade. Uma que utiliza a sua ideologia e outra com os seus próprios princípios. Politicamente tão legítimos quanto quaisquer outros. Não é uma ação contra o Estado, mas aos que querem controlá-lo para os seus fins, e que se utilizam para isto da distorção da função do próprio Estado.

Ao dizerem que o Estado é laico e portanto as objeções ditas religiosas não devem ser levadas em consideração para a criação ou a manutenção das políticas públicas é totalitarismo. Isto nada tem a ver com o laicismo como fundamento. Esta postura antirreligiosa representa o surgimento de uma nova confissão. Erigida sobre o princípio da superioridade de determinada ideologia sobre qualquer outro conjunto de valores. A opinião de cada cidadão é formada por conhecimentos e influências diversas. Possui o mesmo peso para todos, independente da sua origem e motivação estar alicerçada em princípios políticos ou em crenças religiosas. Não existe nenhum impedimento para que o indivíduo exerça os seus direitos políticos observando os mandamentos da sua religião. Desconsiderar este fato é um atentado contra o preceito da igualdade.

Os abortistas criaram um sofisma. Atribuíram a si mesmos a legitimidade para propor e aprovar a morte dos nascituros, visto que apenas eles estariam em conformidade com as regras políticas. Desqualificando quem se opõe. Como se agissem contra o Estado e fora da sua doutrina fundamental.

A legalização do aborto não se baseia na laicidade do Estado, visto que ela não é contrária a religião, mas apenas o princípio que garante a liberdade de culto e os direitos dos ateus. Portanto a campanha pela legalização do aborto nada tem de laica. É confessional. É a crença na superioridade de uma ideologia, o socialismo científico e suas mutações, sobre as outras proposições para a organização da sociedade.

Os direitos políticos não são estabelecidos conforme a sua motivação. Não existe gradação para ideologia, filosofia ou religião. Vetar a manifestação contrária e alegar ilegitimidade devido a origem da convicção, como fazem os abortistas contra os que se opõem a legalização do homicídio dos nascituros, é a imposição da ditadura. Contra eles deve-se fazer valer o direito do cidadão de influir nas decisões governamentais. 

fisgado do Vermelho Não

Um comentário:

  1. Muito bom e claro o post. Parabéns pela publicação Joel.

    No estado laico há a liberdade de religião. Não se pode impor a opinião dos que não têm religião sobre os que tem religião, seria uma ditadura.

    Por outro lado, por exemplo, os cristãos, não podem deixar de pautar suas atitudes e suas opiniões de acordo com os ensinamentos de Cristo.

    Não podemos separar nossas convicções de nossas posições políticas, agora falando como cristão.

    Se o aborto é um conceito que vai contra nossas convicções religiosas, não podemos aceitar uma legislação que o imponha sobre nós.

    Considerando que a maioria do povo brasileiro é cristão, e que a maioria age de acordo com suas convicções religiosas, a aprovação do aborto seria nada mais nada menos que a imposição da vontade de uma minoria marxista sobre a opinião de uma maioria cristã.

    Isto seria um atentado ao estado democrático de direito, a imposição de uma ditadura.

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