[...] 2 sentimentos que atrasam a vida.
O primeiro é uma palavra em italiano que quer dizer arrependimento, mas Contardo Calligaris (”Ilustrada”, 8/12) deu a ela outra interpretação. Definiu-a como a “miragem da felicidade” e versa sobre o que seria da vida atual se tivéssemos feito escolhas diferentes em algumas, ou uma das, milhões de escolhas que fizemos ao longo da vida.
Esses pedaços de passado, alguns de encruzilhadas difíceis, nas quais tivemos que decidir que lado estaríamos, voltam, fantasiados. Ah! Se eu tivesse me formado em engenharia, em vez de ser ator, teria sido um sucesso retumbante. Ou, a minha vida frustrou-se, pois casei antes da hora…
Na maioria das vezes, decidimos o que somos capazes de decidir. Ou, o que temos a ousadia de querer. Mais ainda, a coragem de arriscar. Depois, muito depois, a tal da miragem pode voltar, toda enfeitada e arrumada, para explicar o que poderia ter sido e não foi.
É uma forma de não encarar o erro. Ou o medo. De negar a falta de discernimento na escolha, mas é pior. Funciona como um tecido que impede novas escrituras. Impede buscar o novo. Viver.
O outro sentimento, o ressentimento, é parecido no que concerne ao esvaziamento da vida. Enquanto um vê a vida passar, delirando no que poderia ter sido, no outro, o indivíduo se afunda num mar de mágoa.
Ambos os mecanismos imobilizam. Para o ressentido, o esquecimento não existe e o prazer é ficar no poço da insatisfação. Às vezes, até quem provocou a ofensa já está em outra, mas a vida para o ressentido continua nublada e sem graça e empacada.
A incapacidade de virar a página impede o fluir da vida e a procura pelo novo. Essa dificuldade em poder continuar, sentir a dor das escolhas equivocadas ou das ações que foram ofensivas sem usar artifícios, é o que faz alguns superarem os entraves e outros se perderem num rodamoinho sem fim.
Gosto desta frase atribuída a Shakespeare: “Guardar ressentimentos é como tomar veneno e esperar que a outra pessoa morra”. Só que o óbito é seu.
Diferentemente do “pentimento” e do arrependimento, ocorreu-me um terceiro sentimento também forte: a cicatriz.
A pessoa não fica atrelada de forma atrapalhada ao passado. Mas permanece um sentimento de dor e interrogação. Se abrir mais fundo, e houver ainda possibilidades de retomar a situação que marcou, fica a frustração que a falta de ousadia traz. E uma perda do que poderia ser ainda vivido. Se cutucar a ferida, o risco de uma reviravolta real na vida é grande. Talvez o empecilho maior seja o medo da perda da ilusão e do sonho, que acalentam e acalmam a insatisfação.
A vida é curta, dizia minha mãe. Eu acrescentaria: aprenda a ser feliz.
por Marta Suplicy
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