Coluna semanal de Carlos Chagas


Em São Paulo, a guerrilha virou guerra. 86  policiais militares e 18 agentes penitenciários  foram assassinados este ano. Mais 65 civis só nos últimos dez dias. Ignora-se quantos traficantes,   mas, pelo  menos, o dobro. Acima e além desse conflito declarado entre polícia e bandidos,  a verdade é que escoou pelo ralo o conceito de  segurança pública. Meliantes  de toda espécie transitam pela cidade,  prontos para a cada esquina e a cada  minuto assaltar, roubar, invadir, sequestrar e matar.    Sair às ruas, em especial depois que o sol se põe, é uma temeridade, não só na periferia, mas nos Jardins e no Morumbi. A maior e mais rica comunidade do país transformou-se num campo de batalha, com direito à extensão ao entorno e a outros centros nem tão próximos assim.
                                                       Autoridades e a  mídia não conseguem mais minimizar a conflagração. Há que  noticiar  os crimes,   como prometer providências, mesmo sem expor inteiramente  o caos que assola    São Paulo. Estariam os governantes temerosos  da reação inevitável do cidadão comum, prestes a alistar-se nos batalhões da justiça pelas próprias mãos?   Logo assistiremos  a  participação de todos no confronto que o poder público não consegue mais conter.  O número de paulistanos  armados multiplicou-se. Quem não tinha revólver agora tem. E leva na cintura, na bolsa  ou no carro, quando  precisa deixar sua  casa. O infeliz que vem na calçada em sentido contrário é o inimigo. Quem atravessa a rua no farol é um potencial ladrão do veículo cujo motorista encontra-se pronto para arrancar,  avançando  o sinal vermelho. No bar,  senta-se  na cadeira  encostada na parede, para garantia  da retaguarda. No ônibus, finge-se ler um jornal ou uma revista, mas presta-se mesmo é atenção no vizinho do lado ou em pé diante do suposto leitor. Quem fica  parado diante da  vitrina para conhecer a mais nova parafernália eletrônica é filmado e vigiado lá de dentro.   Olhar  nos olhos, aproximar-se do outro sem razão plausível, pedir  informação ou ficar   na fila do metrô  contando  moedas  tornou-se um risco, já que ninguém garante tratar-se de   gestos  naturais  ou da preliminar de um assalto ou coisa pior. Daqui a pouco será melhor atirar primeiro e perguntar depois.
                                                        O que imaginam fazer Geraldo Alckmin e agora Fernando Haddad?  Podem muito pouco.  Mas também movimentam-se cercados de seguranças e  por montes de correligionários. O perigo imediato  não é com eles, estarão  blindados. Vale o mesmo para o prefeito Kassab e, com um pouco de  sorte, para seus  secretários. Também permanecem  protegidos os potentados financeiros e seus pimpolhos,  envoltos no cinturão da segurança privada. Mas o povo? Aquela outrora comunidade amena, amável, simpática e feliz vai-se transformando em  tropa de choque privada, para sua própria preservação. Mesmo assim, sem conseguir...
                                                        (Esse desabafo vai por conta de quem pretendia passar o fim de semana na paulicéia  mas achou melhor voltar no mesmo  dia.)

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