Ama com fé e orgulho a terra em que nasceste/ Criança, não verás, nenhum país como este. Creio que eram esses os versos de Olavo Bilac que os cadernos marca Avante que usávamos na escola traziam na capa. Naquele tempo de nacionalismo ingênuo essas simples palavras calavam fundo no coração dos pequenos brasileiros. Pareciam referir-se à grandeza continental do país e também às suas incomensuráveis riquezas. Hoje, vejo-as apenas em sua exata medida: não veremos nenhum país como este, não só porque suas características e sua história são exclusivas, como também porque este é o nosso país e só nele nos sentimos em casa, nos sentimos "chez nous", como dizem os franceses.
Certa vez, em um boteco da Tijuca um garçom, desses tantos conterrâneos nossos que desembarcam no Rio de Janeiro para tentar a sorte, enquanto se virara para atender a freguesia, comentava matéria na TV sobre a tsunami que tinha arrasado com a Indonésia: "é por isso que eu gosto desse meu brasilzinho". Naquele tempo, o salário mínimo ainda não tinha se elevado tanto, nem a taxa de desemprego tinha caído tanto. Aquela era apenas uma manifestação espontânea de amor ao Brasil, de amor à Pátria em que nasceu por parte de um homem do povo que, mesmo sem ter conhecido outras terras, preferia a sua. Mesmo tendo sido criado em uma realidade em que catástrofes climáticas como a seca que castiga periodicamente o nordeste e as enchentes que destroem o sul acontecem, ele conservava a ilusão de que aqui nada de terrível acontece, porque estava convencido que Deus é brasileiro.
Talvez esse nacionalismo popular ainda seja uma herança do passado, do tempo do Caderno Avante, talvez esteja mesmo na alma do povo essa vontade de pertencimento, essa necessidade de se orgulhar da pátria em que nasceu. Esse vestir a camisa que se torna mais evidente na torcida pela Seleção Brasileira e que é o tipo do orgulho patriótico que emerge até nas menores nações, pois é sinônimo de amor-próprio. Esse sentimento que equivale ao versinho que tive o privilégio de ouvir uma vez o grande historiador Francisco Iglesias declamar em uma conferência a propósito do amor ao rincão natal: "Todos cantam sua terra/ também vou cantar a minha/ nas cordas da minha lira hei de fazê-la rainha".
Cabe a nós cantar a nossa terra pois outros não a cantarão. Cantarão a sua como sempre o fizeram os norte-americanos que, em sua maior arte, a do cinema, produziram uma obra de exaltação à grandeza de seu país e de seu povo. Graças ao grande poder de comunicação que têm, a filmografia dos EUA contribuiu até mesmo para que nós os amassemos, para que nós desejássemos ser como eles. Se a nós aquelas imagens de famílias maravilhosas, felizes e de hábitos simples e morigerados fascinavam, imagine como não devem ter contribuído para que os americanos comuns se vissem como um povo de maneiras tão encantadoras e civilizadas.
"O patriotismo é o último refúgio do canalha", a frase atribuída a Samuel Johnson tem sido usada para estigmatizar toda demonstração de amor ao próprio país. Certamente em nome do patriotismo muitos canalhas justificaram crimes, mas não dá para incluir nessa sentença o mesmo patriotismo singelo do garçom do boteco da Tijuca. E é deste tipo de patriotismo que o Brasil precisa agora. É deste mesmo tipo de patriotismo do povo que a elite brasileira precisa se imbuir para ver que, enquanto uma tsunami devasta o resto do mundo por conta de uma política econômica nociva que, felizmente, abandonamos, o Brasil navega em águas tranquilas com pleno emprego, salário digno para seus trabalhadores e perspectivas cada vez mais otimistas.
Para que elas se concretizem é preciso que os brasileiros ricos, aqueles que perderam o hábito de investir na indústria, no comércio, na produção, em bens, em serviços e na infraestrutura, aqueles que ficaram tão traumatizados com a avassaladora destruição que a política neoliberal dos anos 1990 produziu que preferiram investir seu capital no mercado financeiro, adiram ao projeto de desenvolvimento do Brasil e voltem a produzir com vistas ao mercado interno que só se expande. Que voltem a fazer sapatos, roupas, eletrodomésticos, móveis, brinquedos, bicicletas, produtos eletrônicos... Que invistam no artesanato popular valorizando a cultura tradicional e fazendo dos nossos bordados produtos de exportação em larga escala. Tanta gente boa ainda sabe bordar no nordeste. Imagine que maravilha dar emprego às mulheres cearenses e ainda ver sua arte brilhando nas vitrines das butiques elegantes internacionais? Que invistam recursos em inovações, em coisas inventadas por brasileiros engenhosos. Afinal foi um brasileiro que inventou a máquina de escrever, um outro inventou o avião e um terceiro inventou o Bina, lembram? É um povo otimista, criativo e empreendedor, faltava apenas esse estímulo que vemos agora ser patrocinado pelo Estado.
É preciso combater o pessimismo, as notícias enganosas contra o Brasil, renegá-las e denunciar a falácia delas. É preciso lutar contra os inimigos do nosso progresso e do bem-estar do nosso povo. É preciso ainda estimular a união dos brasileiros em torno de seu país e de seu futuro, acima de tudo. E isto só será alcançado através do espírito da conciliação e do amor fraterno, tal como na oração de São Francisco de Assis com a qual encerro essa primeira coluna do ano de 2013.
"Senhor, fazei-me instrumento de vossa paz/Onde houver ódio, que eu leve o amor/Onde houver ofensa, que eu leve o perdão/Onde houver discórdia, que eu leve a união/Onde houver dúvida, que eu leve a fé/Onde houver erro, que eu leve a verdade/Onde houver desespero, que eu leve a esperança/Onde houver tristeza, que eu leve a alegria/Onde houver trevas, que eu leve a luz/Ó mestre, fazei que eu procure mais/Consolar, que ser consolado/Compreender, que ser compreendido/Amar, que ser amado/Pois é dando que se recebe/É perdoando que se é perdoado/E é morrendo que se vive para a vida eterna".
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