Velha questão: são os líderes providenciais que fazem a História ou é a História que providencia os líderes necessários? O apartheid resistiria por muito mais tempo se não existisse o Mandela ou fatalmente acabaria mesmo sem ele? A pergunta também serve para Gandhi e Martin Luther King, só para ficar em líderes inspiradores — ou convenientes — recentes.
Mandela preso transformou-se num símbolo que catalisou a reação internacional ao odioso sistema sul-africano e motivou o boicote econômico que puniu e finalmente derrotou o racismo oficial do país, e sua atitude conciliadora depois da prisão facilitou a transição para uma democracia, pelo menos de fachada.
Mais do que qualquer outra personalidade parecida, Mandela reforçaria a tese de que são os grandes homens que fazem as grandes mudanças históricas. E o corolário inevitável: são os grandes bandidos que enegrecem a História com sua ambição ou loucura.
Outra velha questão: o nazismo foi um surto de irracionalidade nacional personificada num maluco de bigodinho ou uma consequência mais ou menos lógica da história europeia até então, uma convulsão só esperando para acontecer, com ou sem o bigodinho?
Precisamos de heróis. Precisamos que eles tenham cara, biografia, retórica e martírio. Gostamos de pensar que os discursos de Luther King apressaram a dessegregação racial nos Estados Unidos, que a rebeldia de Gandhi correu com os ingleses da Índia e que foi o sacrifício de Mandela que acabou com o apartheid.
E se isto não for verdade, se concluirmos que eles foram heróis de ocasião e as mudanças aconteceriam mesmo sem sua inspiração, restam os exemplos de coragem que legam. Não a nada tão grandiloquente quanto a história das nações, mas, pessoalmente, a cada um de nós.
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