Crônica dominical

Orfãos da esperança
Os noticiários do dia-a-dia, não só aqui, no Brasil, como no resto do mundo são os arautos da tristeza, das desgraças, do infortúnio e da infelicidade alheia. Tirante as fofocas sociais, as vitórias do time preferido, o peitoral da Tammy, o decote generoso ou as transparências da moda. Tudo é desgraça, é morte lenta e gradual de qualquer esperança que se vislumbre e se alimente. Os lugares bonitos que conheci no interior do Afeganistão não são notícia, mas os insistentes ataques terroristas dos talibãs idiotas e radicais, sim. É papel e responsabilidade da imprensa de informar as mazelas diárias. A imprensa não pode nem deve ser calada ou censurada, é verdade sólida, mas aí vem a tentativa ridícula de controla-la. Não para esconder as dores causadas pela violência à qual todos já se acostumaram, mas para minimizar escândalos, os mesmos que são responsáveis pelos doentes deitados nos corredores de hospitais, sejam quais forem os hospitais, não importa em que Estado. É de doer ver um médico ser esfaqueado por delinquentes protegidos. Abandonados, nunca. São os mais focados pelas leis vigentes, e ai de quem tocar neles! A eles, tudo. Sem exagero. Podem portar armas de fogo ou facas afiadas. Inimputáveis, esses pequenos monstros assassinos só podem ser apreendidos, termo apenas legal para dar a eles maior cobertura e certeza de impunidade e liberdade imediata para repetir seus gestos de crescente violência, contra quem lhes apareça pela frente, não podem ser mostrados. As vítimas podem ser exibidas, sangrando serenamente deitadas no asfalto, na calçada, dentro de casa, atrás dos muros, onde der. Ele, não. Proteção total! E que ninguém se meta a besta de querer se defender. Não pode. Menor é protegido pela lei. Um pai de família, um cidadão decente será punido por crime inafiançável se fizer uso de uma arma para defender a família ou a própria vida dentro de casa, pasmem! Vez por outra, deixo o romantismo de lado, esqueço das estrelas das quais cuido e explodo assim, em uma revolta que é da maioria. Ainda tenho bem nítido na memória as vezes que pude me afastar da cidade e passear de mãos dadas com o perfumes Trussardi ou até mesmo mais baratos, na dunas mágicas no lugar onde é o Porto das Dunas.
Além de praticamente não ter mais dunas, ir lá na companhia de um amor proibido em noite de lua cheia é suicídio. Melhor Cabul ou Mazar-E-Sharife. "Perdeu! Perdeu!" Frase mágica que imobiliza e congela, em uma fração de segundo, a decisão de morrer ou sobreviver. E esse "perdeu" tanto vale para um celular barato, uma bolsa Prada, uma correntinha Michelin como para as vidas diante da frieza de um bandido de 14, 15,16, 17 anos e 364 dias, portando um 38 ou uma pistola que roubou de... Quem? Um policial. Bandido roubando e matando policial e tatuando, acintosamente: matador de polícia! E aí, a esperança morre também. Os cidadãos não têm o direito à defesa de suas vidas, da santidade de seus lares. Os bandidos mirins estão protegidos pelas leis e a conveniência política os quer protegidos e apenas apreendidos, e isso se for um crime muito bárbaro, mas logo estão rindo da nossa cara e pisando sem dó sobre os restos de esperança das pessoas boas. Aquele cidadão decente, sua mulher que trabalha, seus filhos que estudam, e que moram nas periferias, são, e quando são, sobreviventes ao voltar inteiros para casa.
Algum deles geralmente retorna com uma violência que viu para contar ou sem um objeto que se lhes tenham sobrevivido dentro de um ônibus, nos terminais, nas ruas iluminadas, escuras e becos impunes. A polícia tenta, mas geralmente bem depois, quando a bandidagem corre e some pelos mesmo becos das favelas à margem da via Expressa, por exemplo. E fogem rindo, gritando, debochando das pessoas e matando retalhos dessa esperança que um dia já foi a profissão do brasileiro. Esperança? Estamos órfãos!
by A. Capibaribe Neto



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