Decisão do STF mudará o cenário do impeachment para Dilma

por Cíntia Alves
Se o impeachment de Dilma Rousseff for pautado pela lei 1079/1950, basta - não que seja fácil - a oposição angariar dois terços de votos da Câmara (342 de 513, portanto) para afastar imediatamente a presidente do poder. Só depois o processo por crime de responsabilidade fiscal seria enviado ao Senado, onde outros dois terços de votos definiriam o destino final de Dilma.
Mas se a Constituição de 1988 prevalecer sobre a lei de 1950, Dilma, em eventual derrota na Câmara, terá uma segunda chance no Senado, pois o afastamento só seria determinado após apreciação, pelos senadores, do que foi determinado pela Casa comandada por Eduardo Cunha.
Esse é o teor da ação que está nas mãos do ministro Luiz Edson Fachin, que suspendeu a tramitação do impeachment até a próxima quarta (16), quando afirma que levará ao plenário do Supremo Tribunal Federal uma espécie de roteiro legal para o processo de impedimento de Dilma, por solicitação do PCdoB.
Fachin afirmou à imprensa essa semana que estuda o impeachment de Fernando Collor e as leis que tratam do processo para esboçar o rito certeiro. Outro ministro, Marco Aurélio Mello, disse que o plenário do STF não vai "legislar" sobre o impeachment, mas apenas dizer se prevalece o que foi estabelecido pela lei de 1950, pela Constituição ou ainda pelo regimento interno da Câmara.
Duas liminares concedidas pelos ministros Teori Zavascki e Carmén Lúcia já indicam que o regimento interno da Casa - usado por Cunha para escrever um manual do impeachment a pedido da oposição - não é a melhor norma para nortear a discussão. Restam, conforme apontado na ação do PCdoB, a Constituição e a lei 1079.
A principal questão levantada até agora por juristas ligados ao governo é que a Constituição não recepcionou o inciso 5º do artigo 23 da lei 1079, que diz o seguinte: "São efeitos imediatos ao decreto da acusação do Presidente da República, ou de Ministro de Estado, a suspensão do exercício das funções do acusado e da metade do subsídio ou do vencimento, até sentença final",logo após a votação do impeachment pelo plenário da Câmara dos Deputados.
No artigo 86 da Constituiçao, o rito está firmado da seguinte forma:
Art. 86. Admitida a acusação contra o Presidente da República, por dois terços da Câmara dos Deputados, será ele submetido a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal, nas infrações penais comuns, ou perante o Senado Federal, nos crimes de responsabilidade.
§ 1º O Presidente ficará suspenso de suas funções:
I - nas infrações penais comuns, se recebida a denúncia ou queixa-crime pelo Supremo Tribunal Federal;
II - nos crimes de responsabilidade, após a instauração do processo pelo Senado Federal.
A Constituição ainda prevê que se passar o prazo de 180 dias e o julgamento não estiver concluído pelo Senado, "cessará o afastamento do presidente, sem prejuízo do regular prosseguimento do processo." Além disso, "enquanto não sobrevier sentença condenatória, nas infrações comuns, o presidente não estará sujeito a prisão".
Hoje, o grupo de Michel Temer e Eduardo Cunha, com ajuda do PSDB, trabalha para formar maioria pelo impeachment de Dilma. Na votação da comissão especial que fará a primeira análise do processo, eles ficaram a distância de 70 votos dos dois terços necessários ao impedimento.
A decisão do Supremo não entra no mérito do pedido de impeachment, mas pode mudar os rumos do processo se julgar que a Constituição deve pesar sobre a lei de 1950. Dessa maneira, ficará a cargo do Senado definir se Dilma sai ou fica. E, até agora, a presidente tem contado com a maioria na Casa, ainda que apertada, além da ajuda de Renan Calheiros para confrontar o PMDB de Temer e Cunha.