As forças armadas e a Democracia

Ordem do dia: todo Poder emana do Povo, por Sérgio Saraiva
"Está nas mãos dos cidadãos brasileiros de, nas eleições de 2018, sinalizar o rumo a ser seguido", General Eduardo Villas Bôas, comandante do Exército 
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Tradução: O calendário e o resultado eleitoral será respeitado.
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entrevista do comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, para a Folha de 29 de julho de 2017, merece uma análise cuidadosa. E uma dolorosa reflexão.
A começar pelo tempo investido para que as respostas fossem elaboradas – 23 dias desde o recebimento das perguntas. Não é de se crer que um comandante e uma pessoa tal qual se mostra ser o general Villas Bôas fizesse o jornal esperar por mais de três semanas em função de desinteresse ou indelicadeza - não. Logo, resta a conclusão de que as respostas foram muito bem pensadas antes de serem dadas.
Outra característica que salta aos olhos, quando lemos a entrevista, é o cuidado de contextualizar cada resposta. Mas cuidar também para que cada resposta contivesse, na maioria das vezes, uma frase conclusiva que não deixasse dúvidas de como pensam as Forças Armadas sobre a questão suscitada.
Sim, nas respostas dadas, o general deixa claro estar falando em nome das Forças Armadas.
A memória nacional ainda guarda forte as lembranças das intervenções das Forças Armadas na política interna brasileira, desde a derrubada do 2º Império em 1889 até 1985, quando do fim da ditadura de 1964 - 100 anos. Pela maior parte do século XX, as intervenções das Forças Armadas foram o fator preponderante na nossa organização sócio-política.
Logo, um posicionamento claro tal qual o do general Villa Bôas rechaçando qualquer intenção a esse respeito poderia, à primeira vista, parecer a principal colocação da entrevista.
“O Brasil e suas instituições evoluíram e desenvolveram um sistema de pesos e contrapesos que dispensa a tutela por parte das Forças Armadas. Hoje, elas estão cientes de suas missões e capacidades e mantêm-se fiéis aos ditames constitucionais”.
É possível discordar-se do general em relação a que as instituições brasileiras tenham evoluído. O golpe parlamentar de 2016 pode até ser mais sofisticado, mas é do mesmo tipo do golpe tentado em 1955. Apenas que, desta vez, sem a intervenção de alguém das Forças Armadas para garantir o respeito às urnas. Mas, tampouco, para suprir a democracia como em 1964. Evoluíram, isto sim, as Forças Armadas, quando deixaram que a sociedade civil resolvesse suas questões.
Ocorre que as questões não estão resolvidas. O golpe transformou-se em crise. E entre as consequências possíveis dessa crise, teme-se pela supressão das eleições de 2018 como forma das forças golpista manterem-se no poder.
E é em relação a esse temor a principal colocação do general. A fiança dada à realização das eleições. E o general não poderia ser mais claro: “neste momento, o que deve prevalecer é a Constituição Federal e todos, repito, todos devem tê-la como farol a ser seguido”.
Prevenindo-se contra um possível distraído que não percebesse o teor de suas palavras, o general é enfático: “...todos, repito, todos...”. Já seria ênfase suficiente em uma resposta verbal, agora, em uma resposta escrita e pensada por 23 dias, é para que não reste dúvida alguma.
E segue o general: “está nas mãos dos cidadãos brasileiros a oportunidade de, nas eleições de 2018, sinalizar o rumo a ser seguido”.
O general sabe que nossas instituições estão esfaceladas. A insubordinação aos resultados das urnas e o aparelhamento da Lava-Jato para a consumação do golpe levaram a insubordinação das instituições como um todo. Do STF à Presidência da República e ao Congresso, passando pelo Ministério Público e pela Polícia Federal.
Falta-nos uma identidade e um projeto estratégico de país. País com letra maiúscula. Por isso, costumo dizer que estamos à deriva. Acho que a falta de um projeto nacional tem impedido que a sociedade convirja para objetivos comuns. Isso inclui, até mesmo, a necessidade de referências claras de liderança política que nos levem a bom porto.
Restaram o povo e as Forças Armadas. Estas últimas poderiam estar tomadas de desejos. Estão sóbrias.
“... como tenho dito, vemos tudo isso com tranquilidade, pois o Exército brasileiro atua no estrito cumprimento das leis vigentes e sempre com base na legalidade, estabilidade e legitimidade”.
E aparentam estar conscientes de que não há solução fora de um novo pacto nacional. Lúcidas de que tal pacto passa por eleições livres e democráticas em 2018.
“...em última análise, é a população quem vai julgar os partidos e os candidatos, por intermédio do voto...”.
A população e o seu voto como juízes maiores da cidadania.
Não poderia e nem deveria ser de outra maneira. Porém, que ainda dependamos do legalismo militar como único e último aval da democracia só nos mostra que falhamos como sociedade civil em consolidá-la e que dolorosamente ainda necessitamos de “tutela por parte da Forças Armadas”. Depois do tanto que foi sonhado e foi construído no pós-democratização, é entristecedor que assim seja.
Mas que assim seja, enfim: que o povo decida nas eleições de 2018 o rumo a ser seguindo. Ainda que sob discreta tutela do general Villas Bôas.

 
General Villas Bôas
PS: Oficina de Concertos Gerais e Poesiaos anos 80 voltaram – Brasil, mostra a tua cara...***

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