O laranja do Trump, seus laranjas e os ladrões da polícia federal, por Armando Rodrigues Coelho Neto
Eis, pois, o clã do Coiso e seus asseclas, se asseclas forem, se honestos ou bandidos forem. A justiça se justiça for o dirá. Se eu fosse um matuto da roça, provavelmente estaria escrevendo sobre as agruras do sertão nordestino e as perspectivas de vida do agricultor da região onde nasci. Mas, sou um matuto da cidade, um ser urbano, nascido e criado no Recife, de onde, após superar conflitos emocionais, sociais e políticos, fui me aventurar na Polícia Federal. Para quem sonhou ser trapezista, fui feliz no Globo da Morte, corda bamba e em minhas estripulias como policial. É isso que me inspira.
Foi na corregedoria da Polícia Federal que conheci o GAMA, uma sigla criada para designar um grupo de policiais bandidos que lá atuava. GAMA significava Grupo de Assalto a Mão Armada. Sim, havia dentro da PF um grupo de policiais que assaltavam a mão armada. Uns foram apanhados, outros não havia provas, mas havia convicção e acabaram demitidos por motivos outros. A testosterona da Farsa Jato não funcionava, não existia domínio do fato e só rolava o preto no branco, por que a Constituição era respeitada.
Ainda estava viva a memória da ditadura: nem delegado nem procurador inventavam nada, não faziam festinha para a imprensa. Ninguém discutia decisão do dito supremo em cadeia nacional de televisão. Tudo isso, vejam bem, pouco depois dos tempos em que o servidor podia ser tudo, até ladrão e ou corrupto, menos comunista, esquerda - esse conjunto de ideias que até hoje não foram bem absorvidas na instituição. Por exemplo, eu que nada ou pouco li sobre isso, sei que o Brasil nunca foi comunista nem socialista. Mas, até o outro filho do Coiso que trabalhou na PF via comunista embaixo da cama.
Pois bem. O leitor sabe como os ladrões do GAMA e outros policiais federais corruptos da instituição justificavam o padrão de vida superior ao possível com seus rendimentos? Não? Explicavam tudo “vendendo carro”. Naquele tempo o COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) era uma criancinha e não existia “PT roubando” para ser tão eficiente. Até por que, como convertiam em dólares e o dólar no câmbio negro era uma pouca vergonha anunciada no Jornal Nacional, fazia parte da “corrupção com limites” que a Farsa Jato tanto gosta.
Sem COAF eficiente para correr atrás do GAMA, seus participantes explicavam “movimentação financeira atípica” e “padrão de vida atípico” vendendo/comprando carro. Assim, alguns policiais incautos, mesmo não sendo do GAMA, arriscavam em vão uma melhora de caixa. Então, todo fim de semana eles iam para a Feira do Automóvel no Anhembi, em São Paulo, tentar comprar/vender carro. Como não tinha fiscalização, nunca foi possível aferir se os lucros na compra e venda de carro justificavam o padrão de vida superior aos salários. Como diria Chicó, de Ariano Suassuna (Auto da Compadecida), não sei, só sei que foi (era) assim.
Enquanto policiais honestos iam para a CEASA fazer compras comunitárias, compartilhavam moradias e ou juntavam contra-cheque, a turma do GAMA e assemelhados comprava itens de luxo nos empórios freqüentados por “cidadãos de bens”. Acho exagero e me recuso a acreditar, mas diziam que a casa de um dos bandidos do Gama, que morava no interior de São Paulo, tinha até abrigo nuclear. Tempos em que políticos roubavam “com limite” e ninguém era condenado por atos genéricos, imprecisos, difusos e sequer havia PowerPoint. A turma da Farsa Jato era uma trupe de “galas ralas” (só nordestino sabem o que é isso!).
Por que voltei a essa história do GAMA?
É que fiquei perplexo ao saber que o Poste do Trump toma posse amanhã e que sua equipe se deu por satisfeita com as explicações dadas por um certo Queiroz, laranja do filho do Coiso. Ele se explicou à moda antiga, no melhor estilo dos policiais federais bandidos do GAMA, ou seja, vendendo/comprando carros. Quanta eficiência, não? Nem dono de certas agências se dá tão bem. E o bom é que entrava grana todo mês no dia certo. Como disse Bruno Boghossian, mestre em ciência política, “A explicação foi pior do que o silêncio”. Foi ou não foi?
Armando Rodrigues Coelho Neto - jornalista e advogado, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-integrante da Interpol em São Paulo
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