Na guerra, a maior vítima é a verdade. Trata-se de uma verdade histórica, mas desconsiderada pelo jornalismo corporativo brasileiro. Aceitam-se todas as versões do Departamento do Estado dos Estados Unidos e rejeitam-se todas as informações da Rússia – embora seja mais que evidente que os dois lados mentem, como ocorre em toda guerra.
Recentemente, o portal OpenDemocracy trouxe um apanhado da luta interna na Ucrânia, pela liberdade jornalística durante a guerra.
O governo da Ucrânia aprovou uma série de normas, incluindo restrições ao acesso de jornalistas à linha de frente da guerra, assim como a censura ao canal estatal United News Maratahon.
Segundo a alegação das autoridades, a iniciativa visa combater a desinformação russa e, também, alinhar a legislação da mídia da Ucrânia com a União Europeia.
“Por algum tempo, especialmente nos primeiros meses da guerra, realmente havia uma espécie de consenso entre a sociedade, os jornalistas e as autoridades em relação às ações na mídia”, disse Serhiy Shturkhetskyi, chefe do Sindicato de Mídia Independente da Ucrânia, ao OpenDemocracy. “Os jornalistas ucranianos passaram este período com dignidade. Agora novas regras estão sendo estabelecidas”, acrescentou Shturkhetskyi, e “a situação não está se desenvolvendo a favor dos jornalistas”.
As zonas de guerra foram divididas em cores. As zonas vermelhas estão completamente proibidas. As amarelas são abertas a jornalistas credenciados, desde que acompanhados por assessores de imprensa do Ministério da Defesa. As zonas verdes estão abertas a todos os jornalistas credenciados – embora o credenciamento seja um processo demorado.
Os jornalistas também precisam negociar individualmente com unidades militares. Mas se a situação da guerra mudar, licenças e acordos tornam-se inválidos.
O que chamou mais a atenção é que as zonas vermelhas foram abertas para jornalistas selecionados, da TV estatal.
Segundo o Ministério da Cultura ucraniano, “implementar uma política de informação unificada é uma prioridade para a segurança nacional”.
Além disso, valendo-se do clima de guerra, o governo da Ucrânia passou a interferir na mídia, mantendo certos canais fora do ar e lançando novos.
Três canais de TV nacionais – Canal 5, Direct e Espreso – foram inesperadamente desconectados da principal rede de TV digital em abril do ano passado. Antes da desconexão, o governo ordenou que cooperassem com outros canais de televisão como parte da United News Marathon. Todos os três canais estavam associados ao ex-presidente Petro Poroshenko, um opositor de longa data do atual presidente, Volodymyr Zelensky.
No mês passado, a organização Repórteres Sem Fronteiras pediu às autoridades a reabertura dos canais. Em comunidade, sustentaram que o governo nunca foi transparente em relação à censura.
“Atualmente, a Ucrânia tem pelo menos três canais de TV estatais. O aparecimento de um quarto sinaliza a transição do país para um sistema de televisão controlado pelo Estado”, disse Syumar ao openDemocracy. “Isso anula a política de desnacionalização [na mídia] que seguimos desde 2014 de acordo com os padrões europeus.
A Fundação de Iniciativas Democráticas, uma organização de pesquisa ucraniana, realizou uma pesquisa com 132 jornalistas em janeiro. 62% dos entrevistados consideram a United News Marathon uma forma de “censura” (18% discordaram). Apenas 11% são a favor da continuação da Maratona, enquanto 65% acreditam que ela deve ser interrompida e as emissoras devem retornar ao seu trabalho normal.
A pesquisa também sugeriu que a autocensura por parte dos jornalistas está crescendo, medida em relação a pesquisas semelhantes de 2019. O número de jornalistas dispostos a esconder a verdade sobre a guerra passou de 12% em 2019 para 25%.
Aparentemente, apenas o jornalismo brasileiro continua acreditando nas versões da Ucrânia sobre a guerra.
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