Recordações - Rita Célia Faheina

A este sentimento que nos faz chorar sem que seja de dor, de sofrimento, deram o nome de saudade.


"Eu vou, vou pro Ceará 
Eu vou, vou ver meu bem. 

Meu povo tá chorando, 
Vou lá chorar também. 

Eu vou dizer pro mar 
Que "arespeite" ao menos 
A casa do meu bem... 

A praia de Iracema 
Foi sempre o meu amor 
Não leve o meu coqueiro 
Deixe em paz meu bangalô". 

Humberto Teixeira nem lembrava mais da letra quando dona *Marlene Teixeira cantarolou pra ele a música de sua autoria em um dos últimos encontros que os dois tiveram, na década de 70. Prima e quase irmã, devido a grande convivência que tinham, ela guarda em sua casa, em Iguatu, na Região Centro-Sul do Ceará, várias recordações como troféus, fotos e recortes de entrevistas do "doutor do baião", título que ganhou de Luiz Gonzaga, de quem foi um grande parceiro e amigo. 

"Éramos muito unidos e quando ele foi embora da cidade (Iguatu) para o Rio de Janeiro, sempre nos correspondíamos, mandávamos cartões, cartas e ainda hoje me correspondo e falo, por telefone, frequentemente, com a Denise e sua mãe (a atriz Denise Dumont, filha única de Humberto e Margarida Teixeira que mora em Nova Iorque, EUA)". A ex-mulher do compositor é tradutora e pianista. 

Marlene, que diz estar com uns "70 e poucos anos", recorda que o primo não gostava de aparecer, por isso tem tão pouca coisa sobre ele, como reportagens e gravações de entrevistas. Relembra de uma das últimas entrevistas que Humberto concedeu no Ceará e ela assistiu. "Consta do acervo do pesquisador Miguel Ângelo de Azevedo, o Nirez", informa. 

A mãe de dona Marlene, **Alice era a maior amiga de Lucíola Teixeira, mãe de Humberto. Em Iguatu, sempre moraram próximas. "Tia Lucíola era muito enérgica com os filhos. A casa que eles moravam era grande e tinha um sótão. Os meninos e meninas - além de Humberto, Joacir, Ivan, Juarez, Luzanira, Djanira (esposa do compositor Lauro Maia), Glaura e Ivanira - tinham de estudar e cumprir as tarefas, antes de brincar. Mas eram todos muito bons e inteligentes". 

Marlene aponta para a foto do tio, o maestro Lafaiete Teixeira, que dependurou na parede da sala de visitas, e recorda que foi ele quem iniciou Humberto na música. "Tio Lafaiete, irmão de papai (***Joel Leônidas Teixeira) e de tia Lucíola foi quem o ensinou a tocar gaita, e depois ele aprendeu flauta e bandolim. Com 12 anos, Humberto foi para o Rio de Janeiro, mas nunca esqueceu Iguatu. Sempre que podia vinha fazer uma visita aos familiares". 

Ela relembra da época em que ele se candidatou a deputado federal, na década de 50, quando foi a Iguatu fazer campanha ao lado de Luiz Gonzaga. "Quando assumiu, criou a Lei Humberto Teixeira, um projeto que incentivava a divulgação da música brasileira no Exterior. Ele escrevia e falava muito bem, porém cantar era uma negação. Lembro ainda que, na adolescência, tinha uma loucura por piano, mas o pai dele não deixava porque dizia que era coisa de mulher", recorda. 

Nos anos 60 e 70, Marlene foi visitar o primo no Rio de Janeiro e ficou se comunicando assiduamente com a mulher do compositor, Margarida e a filha Denise, atriz que foi casada com o ator Cláudio Marzo de quem tem um filho, Diogo. "No Rio, Humberto mesmo projetou sua casa e ali viveu com a família até sua morte, em 1979". 

Dona Marlene lembra que todos sentiram muito a morte do "doutor do baião" porque era muito presente na família e gostava de sempre estar junto dos parentes. Na semana passada, Marlene teve uma surpresa agradável: recebeu da Jobim Music a biografia, as músicas e partituras do primo. "Soube que Denise esteve no Rio de Janeiro e vou me comunicar com ela para contar sobre o presente. Fiquei muito feliz, porque é um reconhecimento de tudo o quanto o Humberto foi e continua sendo para a Música Popular Brasileira". 

* Tialena
** Vovó Alice
***Vovô Joel
“...Não vale a pena chorar/não vale a pena maldizer, o melhor é sorrir, sorrir e esquecer...” trecho da canção "Insensatez " de autoria de Tialena.

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