Coluna Econômica

A volta da defesa da concorrência 
Na abertura da economia brasileira, nos anos 90, um dos pilares centrais deveria ser a reconstrução do sistema de defesa da concorrência.
Especialmente a partir do final do século 19, quando o capitalismo torna-se um sistema global e surgem as primeiras multinacionais, a repressão aos abusos do poder econômico tornou-se peça central do modelo.
O caso mais emblemático foi da Standard Oil, a grande multinacional criada por John Dwight Rockefeller. Para manter seu poder monopolista, recorreu a toda sorte de expedientes. Um movimento conduzido pela imprensa e por políticos norte-americanos decretou a divisão da empresa em um conjunto de empresas menores, acabando com seu poder de liquidar adversários.
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Por abuso de poder econômico entenda-se desde exigir exclusividade dos clientes até baixar os preços além do razoável para quebrar os concorrentes. Presume-se que, depois de alijar os concorrentes do mercado, as empresas passem a praticar preços abusivos.
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No Brasil, o papel de julgar casos de concorrência cabia ao CADE (Conselho Administrativo de Direito Econômico), mas também à Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça.
Desativado nos anos anteriores, período de fechamento de mercado e de defesa da produção nacional, o CADE foi reativado no governo FHC. Sua direção entregue ao economista Gesner de Oliveira.
Seguiu-se um período de discussão sobre os conceitos que deveriam vigorar na nova ordem econômica. Nos anos 70, uma escola de pensamento, oriunda da Universidade de Chicago, havia feito a defesa das grandes fusões, alegando que permitiram ganho de escala beneficiando os consumidores. Afastava a possibilidade de abuso no mercado, partindo da hipótese que, em um mercado aberto como o norte-americano, qualquer abuso permitiria a entrada rápida de novos competidores.
Essa questão entre os ganhos de escala dos grandes players e os riscos de controle de mercado permearam as primeiras discussões que precederam a montagem do novo sistema brasileiro.
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Todo esse processo foi atropelado pelo mais vergonhoso episódio da história do CADE: a autorização para que a Ambev adquirisse a Cervejaria Antárctica. A compra atropelava todos os parâmetros fixados para a definição de controle de mercado. O CADE possuía um sistema de computação que permitia analisar a distância entre pontos de venda, um dos tópicos da análise da concentração econômica. O voto da relatora do processo substituiu o sistema por menções ao Guia Quatro Rodas.
Foi uma decisão política convalidada por Gesner que deu um parecer que chegou a envergonhar advogados da parte vencedora.
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Agora, com a possível punição da Souza Cruz e da Phillip Morris, em um caso de abuso de poder econômico no mercado de cigarros, o sistema de defesa da concorrência tenta recuperar parte da credibilidade perdida. As duas empresas firmaram acordo com estabelecimentos comerciais exigindo exclusividade de propaganda e exposição dos produtos.

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