por Danton
Ilimitadas são as tentativas de certos e incertos juristas, ou, como costumo dizer, dos jusabichões de plantão, no objetivo de suprimir direitos fundamentais de defesa dos réus do chamado mensalão. Nesse sentido, a Folha de São Paulo de ontem (23) manchetou: “Último recurso dos réus do mensalão pode nem existir”.
O novo golpe em marcha consiste em usurpar o único recurso a que os réus teriam direito, chamado em juridiquês, de embargos infringentes, com efeitos modificativos, previsto no Regimento Interno da Suprema Corte, desde a malfadada ditadura militar. É cabível esse recurso desde que se tenha uma condenação bastante apertada, isto é, com pelo menos quatro dos onze juízes votando a favor da inocência do réu.
Na prática, quinze réus têm direito a interpor os embargos infringentes que podem modificar, em tese, o resultado final de algumas condenações, cujos placares foram apertados, com enorme dúvida sobre a culpabilidade, ante a existência de quatro votos absolutórios.
Como se fosse pouco a supressão do direito a que a maioria dos réus teria ao duplo grau de jurisdição, ou seja, de ser julgado em primeira instância, em respeito ao corolário do juiz natural, abrigado na Constituição, os jusabichões agora querem negar, pela vez primeira, o cabimento desse recurso.
O pseudo-debate é porque a Lei 8.038, de 1990, que cuida de alguns procedimentos no STF e STJ não tratou da possibilidade de embargos infringentes no Supremo. A simplicidade do raciocínio é risível: se a tal lei não mencionou é porque o recurso não pode existir mais, foi revogado.
Ora, são inúmeros os procedimentos não versados nessa lei e nem por isso deixaram de existir no processo constitucional. Não vou perder meu tempo explicando essa obviedade em respeito ao leitor.
Sem por lenha na fogueira em que se queimam as “bruxas” da República, Gilmar Mendes (aqui chamado de Gilmar Dantas(*)) soprou inocente declaração à Folha:
“O que se diz é que a Lei 8.038 pode ter revogado a norma do regimento sobre os embargos infringentes, mas isso vai ter que ser definido porque não foi objeto de discussão”.
É, em uma coisa Mendes tem razão: isso jamais foi discutido.
Claro! Nunca se duvidou desse direito dos réus, nunca nenhum juiz pensou em desrespeitar o Regimento Interno do STF para suprimir esse único recurso possível em uma Suprema Corte que, como bem avaliou o maior dos nossos criminalistas, Nelson Hungria, “tem o privilégio de errar por último”.
E após o erro, bem, daí não cabe recurso nem para Sua Santidade ou para o Todo Poderoso.
Curioso é que somente agora essa “dúvida” foi levantada.
Quanto ao “que se diz” sobre a eventual revogação implícita ou tácita, em bom juridiquês, inexiste essa possibilidade, pois a Lei 8.038 não cuidou dos embargos infringentes no âmbito do Supremo.
Mas ele já existia, existe e ponto final.
Não se pode agora interpretar norma que verse sobre direito fundamental (ampla defesa) de forma restritiva, de modo a suprimir esses direitos, pois isso implica em “chute-na-canela” da deusa Themis (com chuteira profissional) ou “batuque-no-caixão” do príncipe da hermenêutica e ex-ministro do Supremo, Carlos Maximiliano (com baquetas profissionais).
Lamentavelmente, não me espanta mais que, somente agora, para os réus do chamado mensalão ) o do PT, como diz este blog), se discuta a legalidade desse tradicional e então pacífico recurso interno.
Ao que parece, os réus desta ação penal estão a receber, dos jusabichões de plantão, um curioso tratamento VIP: “Vamos Imputar a Pena”, custe o que custar.
E nesse estranho duelo Supremocracia x Democracia que relatei em artigo anterior (leia aqui)(**), depois de assistir, entre outras coisas, à supressão de prerrogativa do Congresso Nacional para cassar mandatos, na hipótese de condenação criminal, conforme determina o artigo 55 da Constituição, não tenho dúvida que poderá constar no acordão da AP 470 o seguinte epitáfio: “Aqui jaz a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988”.
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