Fuxcelarizou geral

O STF está mais próximo dos anseios da população. Só é preciso tomar cuidado para que os 11 ministros não substituam o Legislativo. Afinal, a democracia requer cada um no seu quadrado e interação respeitosa entre os Poderes
Royalties do petróleo, perda de mandato parlamentar, ficha limpa, tempo de TV para partidos recém-criados e por aí vai. O Supremo Tribunal Federal (STF) a cada dia decide sobre mais um tema polêmico. Tudo deságua ali. E, dia sim outro também, o parlamento vai perdendo a primazia na política e na economia, com um deslocamento geral dos holofotes para o STF. Não por acaso, o relator do processo do mensalão e atual presidente da Casa, Joaquim Barbosa, aparece entre os potenciais candidatos a presidente da República.
Ontem, não foi diferente. Foram duas pauladas do Supremo sobre as excelências. A primeira foi a decisão sobre a perda automática do mandato dos três parlamentares condenados na Ação Penal 470, um bolo que o ministro Celso de Mello confeitou com duras declarações contra a presidência da Câmara. A frase do ministro Celso de Mello merece reprodução: 
Os parlamentares nem tiveram tempo de digerir essa decisão quando lá vem outra: o ministro Luiz Fux determina que o Congresso deve seguir a fila dos vetos — leia-se, deixar para o final do rol de 3.060 vetos aquele da presidente Dilma Rousseff à distribuição dos royalties do petróleo. Para quem chegou da Europa ou dos Estados Unidos hoje, vale lembrar que, na semana passada, os congressistas aprovaram a urgência para votação desse veto de Dilma e a expectativa era a de que fosse votado ainda hoje.
Essas duas decisões esquentaram esta semana e colocaram o STF e o Legislativo em rota de colisão. No caso dos royalties, o plenário da Casa sempre foi soberano para decidir sobre o que deve ser votado. No caso dos mandatos dos condenados, é certo que um presidiário não pode estar ali, votando as leis do país, ainda que o PT considere esse julgamento político. Mas antes que ministros do STF e congressistas entrem nas vias de fato, é preciso haver equilíbrio, o que está faltando em ambos os temas avaliados ontem.
No caso da perda dos mandatos, a impressão que se tem é a de que essa discussão agora é que vai começar. É preciso deixar claro que se o caso fosse tão tranquilo e cristalino como votou o ministro Celso de Mello, teria sido resolvido por um placar maior do que 5 a 4. Em segundo lugar, o inverso também já ocorreu. O mesmo STF que hoje determina a perda do mandato automática absolveu por falta de provas políticos que o Congresso cassou no passado. O caso mais emblemático foi o do ex-presidente Fernando Collor, hoje senador eleito democraticamente por Alagoas, onde fez carreira política. Ontem, alguns deputados, como Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), comentava que talvez seja preciso uma emenda constitucional para clarear a questão de forma cabal. Ocorre que, a quatro dias do recesso, os parlamentares não vão tratar do tema agora.
E por falar em discussão...
O julgamento do mensalão e a popularização do Supremo Tribunal Federal com ministros mais jovens, que até tocam guitarra, começa a derrubar a velha máxima de que decisão judicial não se discute, cumpre-se. Ok, cumpre-se, mas se discute. Tanto é que, de uns tempos para cá, até manifestações em frente ao STF já ocorreram. E nem sempre foi apenas por questões relacionadas a julgamentos de políticos, como o do mensalão. Para quem não se lembra, houve uma grande mobilização quando de decisões como a união homoafetiva e o aborto em casos de anencefalia. É o povo mais próximo do STF e vice-versa. Só é preciso tomar cuidado para que os 11 ministros do Supremo não substituam o Legislativo. Afinal, a democracia requer cada um no seu quadrado e interação respeitosa entre os Poderes.
Denise Rothenburg  nas Entrelinhas

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