Na véspera da eleição de 1989, quando a juventude ainda me permitia entrar num bar após um dia inteiro de trabalho, encontrei uma mesa de amigos jornalistas, petistas, e tivemos todas as provocações que se possa imaginar sobre quem passaria ao segundo turno para enfrentar Collor.
A certa altura, peguei a mão de um dos mais fortemente petistas, meu amigo Fernando Paulino, e lhe disse: “sabe qual é a diferença entre nós? É que metade do PT não irá com Brizola, se ele passar ao segundo turno e a metade que virá, virá rebolando, de salto alto.” E apertei-lhe a mão, prossegui: agora se o Lula passar, nós vamos segurar na mão dele nem que seja para irmos juntos para o inferno”.
Os fatos mostraram que foi assim e Brizola nunca faltou a Lula no momentos dos embates eleitorais decisivos. E, 2002, inclusive, isto foi causa de uma incompreensão amarga com Ciro Gomes, ao final do primeiro turno.
O PT, quase todo, não compreendeu o trabalhismo para além do discurso de turma do pré-vestibular, com aquela história de “Carta del Lavoro”.
A História, a porretadas práticas, abriu a cabeça de alguns, melhor assim. Aprenderam que a política se faz tanto com intenções quanto com concessões. Com muitos erros no varejo e um grande acerto no atacado do processo histórico.
E tudo o que criticavam no velho Getúlio se desfez na imensa vontade que têm agora, de cantar para Lula a marchinha do Francisco Alves: “Bota o retrato do velho outra vez/ Bota no mesmo lugar/ O sorriso do velhinho faz a gente se animar” (Aliás, a patrulha era tanta que só transcreviam uma das estrofes, que dizia “trabalhar”, em lugar de “se animar”.)
Podemos e devemos discutir erros do PT, a sua natureza essencialmente udenista – que como todo udenismo se acaba como Greta Garbo no Irajá – mas não podemos deixar de ver que foi com Lula que, pela primeira vez em décadas – talvez com um pequeno momento de intervalo, na campanha das Diretas-já, que convenientemente se abortou por uma solução pessedista, com Tancredo – o povo brasileiro se viu como coletividade e ao país como um esperança.
Igualmente, também não fecho os olhos à natureza do PT – não a de Lula – de expressão da classe média à qual o movimento social, mais pela figura de seu líder operário, aderiu. Isso não é, em si, nem mau nem desinteressante, porque a esquerda no Brasil sempre teve – ainda bem! – uma adesão da classe média e dos intelectuais à imensa massa popular, expressa em seus escritores, seus músicos, seus poetas, que maravilha!
Virou moda, agora, descer a lenha no PT, inclusive por parte de gente que, com ele, viveu sua experiência de ser governo.
O PT merece, claro, boas pauladas ideológicas, a começar por sua “vocação civilizatória” neobandeirante, que crê (ou cria) que iria “civilizar” o Brasil com sua “modernidade inclusiva”.
Mas não vou fazer coro com a direita, no momento de dificuldades do partido, que não sabe para onde se volta e nem sabe o que vai fazer.
Se eu tivesse de dizer algo ao PT, diria: “beba história”.
É amargo, dói na garganta, nos deixa, paradoxalmente, sóbrios para agir com lucidez e loucos para sonhar .
E, como há 26 anos, há gente que vai segurar firme a mão de quem fizer isso e ficar firme.
Para desespero dos petistas “neoliberais”, dizer que é preciso recolocar uma referência aos olhos do povo brasileiro.
O que está em jogo é ele mesmo: o retrato do velho, outra vez.
É o que querem destruir.
É o que temos de defender.
no Tijolaço
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