Relação entre Cemig e Andrade Gutierrez não chama atenção da quadrilha do Moro

Jornal GGN - A equipe da força-tarefa da Operação Lava Jato encontrou um documento na sede da Galvão Engenharia, em São Paulo, que indica que um consórcio liderado pela construtora Andrade Gutierrez buscou "interesse político" e "boa vontade" da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), para ser contratada para as obras da usina hidrelétrica de Irapé, na cidade mineira Grão-Mogol.

Os investigadores encontraram o material em novembro de 2014, na 7ª etapa da Lava Jato. Mas as informações só foram divulgadas mais de um ano depois porque deputados do PSDB da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) pediram o acesso às investigações, com o objetivo de apurar eventuais irregularidades envolvendo a Cemig "a partir de 2009", durante o governo do ex-presidente Lula.

De acordo com o deputado estadual Gustavo Valadares (PSDB-MG), líder da Minoria na Assembleia, a oposição tem "todo o interesse em debater contratos firmados pela Cemig com a Andrade Gutierrez e outras empresas", porque, segundo ele, essa "será uma oportunidade para que os petistas expliquem quais as razões que levaram o governo Lula a vender, em 2009, as ações que o BNDES tinha da estatal mineira exatamente para a Andrade Gutierrez".

Com o pedido, o Ministério Público Federal, com o aval do juiz da Vara Federal de Curitiba Sergio Moro, liberou o documento à Assembleia, destacando que chamou a atenção dos investigadores a inclusão no documento da expressão: "criar interesse político na contratação do nosso consórcio EPC obtendo 'boa vontade' [as aspas estão no documento] da Cemig".

Em 2009, contudo, o Estado de Minas Gerais era governado pelo atual senador Aécio Neves (PSDB-MG), que retomou o projeto de privatização da Cemig, continuado no governo de sucessão tucana de Antonio Anastasia. Naquele ano, a Cemig comprou a participação da Andrade Gutierrez na Light do Rio de Janeiro por R$ 785 milhões, pagos à vista. Em troca, a empreiteira comprou 33% das ações ordinárias da estatal mineira, com R$ 500 milhões de entrada e o restante dos R$ 1,6 bilhão financiados em 10 anos com a emissão de debêntures pelo BNDES, a juros e taxas facilitadas.


Investigada, a Cemig informou nesta quarta-feira (02) que sua acionista AGC Energia, subsidiária da Andrade Gutierrez, recebeu a solicitação da BNDESPar para a permuta de debêntures por 54.342.992 ações ordinárias e 16.718.797 ações preferenciais da Cemig. O acordo previa que a BNDESPar poderia se tornar importante acionista da Cemig por meio da permuta de debêntures, de que é titular por ações.

Em setembro do último ano, o GGN publicou detalhes da parceria não explicada entre a Cemig e a Andrade Gutierrez, que levou a negócios desastrosos, arruinando o balanço da estatal mineira, mas livrando a empreiteira de prejuízos certos. Republicamos a reportagem, a seguir:

Publicado em 01/09/2015

A divulgação de um balanço desastroso pela Cemig (Companhia Energética de Minas Gerais) deve-se muito mais a operações ruinosas com a Andrade Gutierrez do que aos efeitos da redução tarifária do final do primeiro governo Dilma Rousseff.

O balanço do terceiro trimestre do ano passado mostrou uma queda de 96% no lucro líquido – que passou de R$ 788,8 milhões no terceiro trimestre de 2013 para penas R$ 29,1 milhões.

Outro dado que chamou a atenção foi o da equivalência patrimonial, negativo em R$ 102,1 milhões contra um resultado positivo de R$ 349,1 milhões no mesmo período do ano anterior.

Ambos os resultados estão diretamente relacionados com operações da Cemig com a empreiteira Andrade Gutierrez – envolvida com a Lava Jato – na hidrelétrica de Santo Antônio, em Rondônia.

Os resultados operacionais
Os resultados operacionais foram satisfatórios. Sempre em relação ao mesmo período do ano anterior, houve crescimento de 8,1% na receita líquida, que foi de R$ 3,83 bilhões. O volume de energia fornecida aos consumidores aumentou 7,7% com aumento médio de 14,76% nas contas residencial, comercial e industrial.

Houve aumento de 22,4% nos custos operacionais, que bateram em R$ 3,42 bilhões, principalmente devido ao gasto maior com a compra de energia de outras geradoras par que revenda, pois a seca impediu que honrasse o contrato de fornecimento com os distribuidores. Os gastos totais foram de R$ 1,78 bilhão, aumento de 22,8%.

Os investimentos em Santo Antônio
A Cemig detinha uma participação de 10% na usina Santo Antônio, em Rondônia, pela qual investira R$ 610 milhões. A usina vinha registrando prejuízos recorrentes.

Aí, teve início a operação que jogou a Cemig no fundo do poço.

O controle da usina pertence ao fundo FIP Malboure, do qual participvam a Cemig, a Andrade Gutierrez e outros sócios.

No dia 6 de junho, a Cemig adquiriu da Andrade Gutierrez Participações S.A. o equivalente a 83% de sua participação no FIP, ou 12,4% do total do fundo, ao custo de R$ 654 milhões. Os demais cotistas compraram a participação restante por R$ 124 milhões.

O argumento da Cemig é que precisaria investir em Santo Antônio para compensar a devolução de ativos de geração cuja concessão venceu e ela não aceitou renovar.

A operação de Santo Antônio, no entanto, revestiu-se de algumas peculiaridades.

Os interesses cruzados
A Andrade Gutierrez é a maior acionista individual da Cemig, depois do governo de Minas. Controla 33% do capital, possui assento no Conselho de Administração e indica justamente o Diretor de Novos Negócios da empresa

Ela participava da Santo Antônio como investidora e também como construtora, ao lado da Norberto Odebrecht. Em agosto ameaçou paralisar os trabalhos, devido às dificuldades de recebimento pelo trabalho realizado.

Para cobrir as despesas, o Madeira Energia S.A (MESA), consórcio que administra o empreendimento, anunciou uma nova chamada de capital para os acionistas.

Aí montou-se a operação:

1. No dia 6 de junho, a Cemig adquiriu a parte da Andrade Gutierrez na usina.

2. No dia 21 de outubro, a Santo Antônio energia convocou Assembleia de Acionistas que aprovou aumento de capital de R$ 1,59 bilhão., a maior parte para honrar dívida com as empreiteiras, que chegava a R$ 700 milhões.

3. Além de adquirir a participação da Andrade Gutierrez, a Cemig precisou subscrever o aumento de capital. Sua participação equivale a R$ 3,617 bilhões, ou 17,7% do valor patrimonial da companhia.

4. A Andrade Gutierrez recebeu pela venda da sua participação como acionista, livrou-se da nova chamada de capital e recebeu os pagamentos atrasados, de seu trabalho na construção da usina.

Tudo não passaria de um negócio de oportunidade, se a Usina Santo Antônio estivesse bem. Atualmente – segundo o jornalista José Antônio Bicalho – ela produz pouco mais da metade da energia prevista. Com isso está sendo obrigada a comprar energia no mercado livre para cumprir seus contratos com as distribuidoras.

A jogada na Guanhães
Operação semelhante foi realizada na Guanhães Energia.

O tema Guanhães voltou ao noticiário graças ao doleiro Alberto Yousseff, que reiterou denúncia do ano passado, de que tinha recebido R$ 4,3 milhões referentes à venda de participação na Guanhães Energia. Afirmou não saber do destino do dinheiro, se para pagamento de propina para funcionários da Cemig ou para políticos.

A operação foi assim:

A Cemig era sócia minoritária (49%) da Guanhães Energia, que está construindo quatro pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) no interior de Minas. Os 51% do controle estavam com a Investminas, do ex-secretário de Assuntos Estratégicos do governo Collor, Paulo Leoni Ramos. As PCHs enfrentaram inúmeros problemas. Estavam planejadas para entrar em operação de outubro de 2013 a fevereiro de 2014 mas ainda não começaram a produzir.

No ano passado, a Guanhães registrou prejuízo de R$ 32,7 milhões, devido à contabilização de valor de ativos de R$ 21,5 milhões, decorrentes de problemas técnicos de implantação.

Mesmo assim, em fevereiro de 2012, o Conselho de Administração da Light )na qual a Cemig é sócia majoritária) aprovou a aquisição de 51% da Guanhães pelo montante de R$ 25 milhões. A proposta foi levada à Light pela Cemig.

Em ambos os casos, os sócios são investigados pela Lava Jato.

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