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O roteiro original
A Lava Jato acaba por se parecer com uma daquelas novelas para as quais ainda não está pronta a atração que a substituirá e, assim, o roteirista introduz novos personagens e passa a criar reviravoltas na história.
Já mostramos há algum tempo que Lula foi condenado no Caso do Tríplex com base em uma reportagem do jornal O Globo e em uma declaração de Leo Pinheiro – ex-presidente da OAS e condenado na Lava Jato - dando aval ao que a matéria do jornal dizia. O tríplex era de Lula. Nenhuma prova foi apresentada, nem pela reportagem nem por Leo Pinheiro.
Leo Pinheiro inocentara Lula anteriormente. Mas sua delação premiada, onde acusava José Serra e Aécio Neves, tinha sido recusada pelo PGR e, agora, Leo via pela frente muitos anos de prisão. Mudou, então, de versão e passou a acusar Lula. Sua pena foi reduzida pelo juiz Moro, em reconhecimento por sua colaboração à condenação do ex-presidente. Final feliz.
Na tela - “the end” e créditos – só que não.
A vida como ela é
Rodrigo Tacla Duran é um advogado condenado por Moro por envolvimento com a Odebrecht. Duran que tem dupla cidadania fugiu para a Espanha e de lá disparou acusações que vão desde a falsificação de informações nas delações da Odebrecht até oferecimento de facilidades junto à Lava Jato por parte do advogado Carlos Zucolotto Junior.
Zucolotto, foi sócio da esposa de Moro em um escritório de advocacia e é padrinho de casamento de Moro. Tudo revelado pelo jornal Folha de São Paulo. Assim, Moro viu-se na mesma situação de Lula. Uma acusação baseada apenas em uma matéria de jornal contendo declarações sem evidências que a comprovem.
Ato contínuo, a defesa de Lula pediu a Moro que incluísse Duran como testemunha. Moro negou com a seguinte declaração:
"A palavra de pessoa envolvida, em cognição sumária, em graves crimes e desacompanhada de quaisquer provas de corroboração não é digna de crédito, como tem reiteradamente decidido este Juízo e as demais Cortes de Justiça, ainda que possa receber momentâneo crédito por matérias jornalísticas descuidadas".
Essa declaração deveria constar da não-proferida decisão de Moro inocentando Lula. Já que, para condená-lo, tudo que Moro usou foram igualmente “matérias jornalísticas descuidadas” e “a palavra de pessoa envolvida em graves crimes e desacompanhada de quaisquer provas de corroboração”.
Nelson Rodrigues não escreveria melhor trama e melhor final. A vida como ela é.
Moro gosta de ficção
Pouco antes de negar a solicitação da defesa de Lula, Moro compareceu à pré-estreia do filme ”Polícia Federal – a lei é para todos”. Fosse uma ironia e seria um grande título. O filme conta, pela ótica dos policiais, a história da perseguição da Lava-Jato ao presidente Lula. Um filme de “mocinhos e bandido”. Seria diversão barata, não fosse o orçamento e facilidades de que dispôs.
16 milhões de reais na elaboração do filme. Acesso a informações e às dependências – inclusive à carceragem – da Polícia Federa de Curitiba. E isso é só o começo.
2.000 convidados para a pré-estreia – 8 salas de cinema reservadas em um shopping center da capital do Paraná. Jornalistas convidados com passagem e hospedagem pagas.
Trailer Oficial divulgado na internet nos sites dos principais jornais e revista do pais. Na Folha, capa de página inteira no caderno de cultura do jornal e mais análise em página interna.
Avaliação ruim.
Exceto a avaliação ruim, tudo mais tem um custo. Na imprensa nacional, não há almoço grátis.
Quem banca? Quem sabe? Os patrocinadores estão incógnitos. São “empresários”. Carlinhos Cachoeira - banqueiro do jogo-do-bico - também era chamado de empresário. Até ser condenado pela Justiça.
Os patrocinadores - esse é o principal atrativo do filme – mas a imprensa não se interessou por ele. Nem Moro se preocupou em colar a sua imagem a um produto que ninguém sabe quem está pagando. Se bem que, após aquela foto com Aécio, liberou geral.
Roteiro original adaptado
A única coisa que parece incomodar Moro é a lembrança do seu pedido de desculpas ao STF pela divulgação, em março de 2016, dos grampos de Lula e Dilma:
"Diante da controvérsia decorrente do levantamento do sigilo e compreendo que o entendimento então adotado possa ser considerado incorreto, ou mesmo sendo correto, possa ter trazido polêmicas e constrangimentos desnecessários. Jamais foi a intenção desse julgador provocar tais efeitos e, por eles, solicito desde logo respeitosas escusas a este Egrégio Supremo".
Dói tanto que Moro resolveu reescrever a história e, em entrevista ao jornal New York Times, desescusar-se:
“I think that democracy wins when, shall we say, people learn what thier leaders do in the shadows”
Dispensável a tradução – as sombras da alma Freud e Nelson Rodrigues explicam.
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