O golpe continua



Retomada a ofensiva contra Lula para fechar o roteiro do golpe, por Tereza Cruvinel
São redundantes e ociosas as considerações morais sobre o que fez Antonio Pallocci, o primeiro petista a delatar o ex-presidente Lula em busca da salvação numa delação premiada. Há algum tempo circula no PT um diagnóstico atribuído a José Dirceu: "Pallocci já virou cachorro". Na ditadura, cachorros eram os militantes que se tornavam colaboradores da repressão, levando companheiros à prisão e à morte. Certo é que a Lava Jato, Janot e Moro retomaram a ofensiva contra o PT e o ex-presidente, apesar das lambanças envolvendo Temer, Geddel e outros partidos da coalizão governista, e pode estar em curso uma ação coordenada para fechar o cerco com a prisão de Lula. E Pallocci, com seu depoimento, forneceu uma das peças mais importantes para o roteiro que começou a ser montado esta semana. Um roteiro de filme de ação vertiginosa, em que o telespectador perde o encadeamento das cenas e o significado da narrativa.

É preciso que o telespectador se confunda e permaneça assistindo passivamente ao filme, sem compreender claramente o papel dos personagens, até que venha o desfecho.

Até à semana passada, tudo apontava para a apresentação de uma segunda denúncia contra Temer que tinha chances de vingar. Base rachada, tucanos em crise, munição esgotada para comprar votos, Rodrigo Maia sendo tentado a tornar-se condutor alternativo (e mais eficiente) da agenda neoliberal. Eis que esta semana ocorre uma reviravolta no enredo, numa sequência vertiginosa que parece levar a um final já programado.

Segunda-feira, 4 - O dia havia sido pasmacento e de poucas notícias em Brasília mas o início da noite foi agitado pela informação de que Janot daria um coletiva para fazer revelações graves e urgentes. Era a confissão das trapalhadas da PGR na condução do acordo de delação da JBS, que forneceu oxigênio a Temer e deixou o procurador fragilizado e exposto. Lula chega neste dia a São Luis (MA) para o encerramento de sua caravana pelo Nordeste, onde foi recebido por multidões em clima de reencontro.

Terça-feira, 5 - Janot, humilhado em todas as manchetes do dia, volta seu arcabuz contra o PT e denuncia o partido, Lula, Dilma e outros por formação de organização criminosa. Na mesma terça-feira a Polícia Federal estoura o depósito de dinheiro de Geddel Vieira Lima, com R$ 51 milhões, mas o fato gravíssimo, envolvendo um dos arqueiros do golpe, acabou servindo foi à ofensiva contra Lula. A manchete do jornal O Globo – Janot denuncia Lula, Dilma e PT por organização criminosa – foi ilustrada por foto das malas de dinheiro de Geddel. Para quem apenas olha, lá estava o fruto da roubalheira petista. No mesmo dia começou a circular nas redes um vídeo assinado pela Polícia Federal, mas que pode ser fake. OPTesouro perdido, é o título. As cenas mostram apenas a contagem da dinheirama de Geddel. O título remete ao nome da Operação Tesouro Perdido mas a montagem gráfica, juntanto P e T sem espaço, é de uma má fé repugnante. Nesta altura deve ter gente pensando que o tesouro de Geddel era mesmo do PT.

Quarta-feira, 6 – Janot volta a denunciar Lula, agora por obstrução da Justiça, por conta de fatos já desidratados e inconsequentes, como sua nomeação frustrada para o ministério de Dilma. Em Curitiba, Moro chama novamente Pallocci a depor em momento estratégico, faltando uma semana para o depoimento de Lula. Pallocci faz o que se esperava dele: muda o depoimento anterior, em que defendeu Lula, capricha na retórica, falando num "pacto de sangue" que Lula teria feito com a Odebrecht, e que teria garantido ao PT, a partir de 2010, uma conta-propina de R$ 300 milhões. O caso JBS e o dinheiro de Geddel perdem evidência e crescem os sinais de que o cerco a Lula está se fechando.

Quinta-feira, 7 – As manchetes do jornais são sobre o "pacto de sangue" Lula-Odebrecht. No desfile da Independência, um Temer agora reoxigenado pelas trapalhadas da JBS e de Janot, consegue ficar diante do público sem receber vaias nem aplausos. Ele é um morto-vivo mas agora tem chances efetivas de ficar no cargo até o final do mandato.

O golpe segue seu roteiro com a eficiência de sempre. Para completar-se com pleno êxito, é preciso que Lula seja logo preso ou inabilitado para disputar a Presidência no ano que vem.

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