Enquanto a ministra Carmen Lucia visita presídios, para ver o que todo mundo já conhece, alguns homens de preto abusam do poder. Ela não vê os acontecimentos à sua volta, onde a ditadura da toga vai se desenvolvendo mediante um comportamento visivelmente politico, parcial e dissociado de qualquer senso de justiça. A escandalosa perseguição a Lula pela Operação Lava-Jato, a vergonhosa sentença do juiz Sergio Moro que o condenou e o julgamento do Tribunal Regional Federal da 4ª Região do recurso da sua defesa, entre outros, são alguns dos principais sinais da transformação do Judiciário em perigoso poder político, que suprimiu a presunção de inocência, a exigência de prova e as garantias constitucionais do cidadão. E os órgãos superiores da Justiça, o STF e o CNJ, de quem se esperava providências para recolocar o Judiciário em seus trilhos jurídicos, simplesmente fingem que não estão vendo nada, numa aprovação tácita dos atos que mereceram condenação dos maiores juristas do Brasil e do exterior.
A mobilização de brasileiros de todo o país para o julgamento do recurso de Lula no próximo dia 24, em Porto Alegre, não tem apenas o objetivo de defendê-lo e ao seu direito de concorrer às eleições presidenciais deste ano mas, também, de impedir que se cometa uma inominável injustiça, que abrirá um perigoso precedente para outras escandalosas injustiças, já que a partir daí qualquer pessoa estará sujeita a ser condenada por conta apenas da sua cor partidária e da convicção de um juiz. Porque a grande questão no caso da condenação do líder petista não é exatamente a falta de provas, mas a falta de crime. Sem crime não pode existir prova. Todo mundo tem consciência disso, inclusive os membros do Supremo Tribunal Federal, mas nenhum ministro tem coragem de contrariar o todo poderoso juiz de primeira instância Sergio Moro que, numa inversão hierárquica, costuma fazer críticas à Suprema Corte. Diante dessa situação, alguns magistrados se sentem estimulados e encorajados a imitar o comportamento do juiz de Curitiba. E transformaram Lula no réu número um deste país.
Juristas de renome, inclusive o ex-juiz federal e atual governador Flavio Dino, condenaram a sentença de Moro que condenou Lula, por absoluta falta de justificativa legal, mas o presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª. Região, desembargador Thompson Flores, que julgará o recurso no dia 24, a considerou “irretocável”. De onde se conclui que ou o desembargador Flores não leu a sentença ou não entende nada de leis, porque é impossível que tanta gente especialista em Direito divirja do texto que ele considerou perfeito. Ou então ele nem se preocupou em ler a sentença porque sabe que a decisão é política e, portanto, não precisa de embasamento jurídico. Acontece que o poder que tem autoridade legal para tomar decisões políticas é o Congresso Nacional e não o Judiciário. Nesse caso, a quem recorrer? Ao Supremo, que tem se passado por cego, surdo e mudo diante da perseguição a Lula? Ou ao Conselho Nacional de Justiça, que há tempos se tornou mera figura decorativa, não apreciando sequer as reclamações contra o juiz Moro, cuja suspeição já foi negada diversas vezes?
Além de Thompson Flores, também o desembargador Gebran Neto, relator do processo no TRF-4, insinuou o seu voto favorável à confirmação da condenação de Lula ao afirmar, durante recente evento em Buenos Aires, que nos julgamentos de casos de corrupção não se deve mais esperar uma “prova insofismável” para condenar o acusado, bastando uma “prova acima de dúvida razoável”, desde que haja “convergência” dos elementos probatórios. Alguma dúvida sobre o seu voto? Como a legislação ainda não mudou, é claro que um juiz precisa de prova para condenar um réu, o que inexiste no caso do ex-presidente. Espera-se que os outros dois desembargadores que integram aquela Corte, pouco conhecidos porque não perseguem a fama e se comportam com discrição, julguem o caso dentro dos padrões jurídicos, fazendo efetivamente justiça. Se tal acontecer, a sentença de Moro será fatalmente derrubada e saberemos que nem tudo está perdido na Justiça brasileira. Até porque sabe-se que a maioria dos magistrados não aprova o comportamento adotado pelo juiz de Curitiba e outros dos seus colegas, mas por serem discretos, sem ambição ao estrelato, preferem manter-se quietos, no anonimato.
A simples expectativa do julgamento de Lula pelo TRF-4, no entanto, além das inevitáveis repercussões no processo eleitoral deste ano, serviu também para revelar o tamanho do ódio disseminado no país pela mídia golpista e pelas redes sociais, como se pode perceber por algumas atitudes esdrúxulas. O prefeito tucano de Porto Alegre, Nelson Marchezan, por exemplo, numa atitude fascista infantil, própria de quem tem medo da democracia, chegou a pedir a presença do Exército para expulsar os manifestantes pro-Lula que pretendem ocupar aquela cidade no dia 24. Por burrice ou ingenuidade confundiu as Forças Armadas com a policia e foi ironizado. O juiz Osório Ávila Neto proibiu manifestações numa área de 500 mil metros quadrados em torno da sede do tribunal. A chefe de gabinete do desembargador Flores, Daniela Tagliari Kreling Lau, fez campanha nas redes sociais pedindo a prisão de Lula e a sargento Flavia Abreu, da Brigada Militar Gaúcha, também foi às redes sociais para ameaçar os manifestantes. Até onde se sabe, ninguém sofreu sequer uma advertência, de onde se conclui que os seus superiores aprovaram a atitude deles. O ódio dessa gente, como é fácil perceber, já atinge as raias da loucura.
O fato é que não é mais segredo para ninguém que todo esse teatro montado pela Lava-Jato, com a cumplicidade da mídia, tem o objetivo de eliminar Lula da vida pública, impedindo-o de concorrer às eleições presidenciais deste ano, conforme programado pelos que planejaram nos Estados Unidos o golpe que derrubou Dilma. A Lava-Jato está cumprindo a sua parte, como confirmou um alto funcionário do governo norte-americano. Resta saber o que acontecerá no dia 24 e nos dias seguintes. De uma coisa ninguém tem dúvidas: tudo dependerá do resultado do julgamento. Diante da gravidade do momento, porém, em que é praticamente impossível um prognóstico sobre os prováveis acontecimentos, os homens que detém uma parcela de poder neste país e, sobretudo, os que concorreram para essa grave situação de risco, devem meditar bastante sobre seus atos, porque serão responsáveis pelos danos causados à Nação e ao seu povo e cobrados, no futuro, pelos seus próprios filhos. E, também, pela sua própria consciência. Por isso, nunca é demais lembrar as palavras do Cristo: “A semeadura é livre mas a colheita é obrigatória”.
por Ribamar Fonseca - jornalista, escritor e colunista de Brasil 247
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