(...) "Aqui, a história não se repete como farsa, as farsas se repetem como história.
O golpe de 64 foi farsesco, descontando-se o que teve de ignóbil. Depois dele, vivemos 20 anos com generais se sucedendo na Presidência da República sem votos, uma farsa reincidente. Entre os generais presidentes tivemos de bufões a um falso pastor, que autorizou assassinatos de Estado, como nos contou, recentemente, a CIA. Diante desse teatro burlesco, a população teria todo o direito de gritar “E os palhaços? Onde estão os palhaços?”, se fosse permitido gritar. Para ser uma farsa completa, só faltaram palhaços em cena ou, no mínimo, um amante só de cueca escondido no armário.
E agora tem gente desfilando com faixas que pedem intervenção militar já. Quer dizer, pedem uma repetição da farsa. Como gostaram da outra, provavelmente querem uma farsa igual àquela, uma volta àqueles dias. São movidos a nostalgia, mais do que a qualquer projeto realista. Mas o movimento está crescendo, pelo que se ouve e se lê, e não se minimize o poder da nostalgia mobilizada; quanto mais irrealista, mais perigosa.
A farsa de 64 começou com um general de opereta, impaciente com a demora das conspirações, decidindo comandar seus tanques contra o governo Jango sem esperar por ninguém. Foi a faísca que incendiou o resto. Muito cuidado com faíscas e generais impacientes, portanto."
Luis Fernando Veríssimo em O Globo
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