Apostas e riscos no governismo

A operação anti-Serra pode se desdobrar numa anti-Aécio, dado que na sucessão presidencial o governo teme a união efetiva dos dois governadores

Fragmentos de conversas esta semana com um punhado de membros da cúpula do governo revelam um otimismo quase eufórico com as perspectivas políticas. O Palácio do Planalto acredita ter neutralizado a Comissão Parlamentar de Inquérito da Petrobras no Senado Federal, depois de indicar ali uma bancada majoritária de uns fiéis e outros dispostos a negociar a fidelidade em tempo real.

Governos tendem a pintar cenários róseos, mas existe base objetiva para otimismo. Os métodos de intimidação empregados topicamente na CPI dos Cartões, quando vazou do palácio o conteúdo de um “banco de dados” com despesas supostamente constrangedoras do ainda presidente Fernando Henrique Cardoso, estão engatilhados para emprego na CPI da Petrobras. E há uma vantagem: dado que tucanos e democratas estiveram no governo há nem tanto tempo, e dadas as ótimas relações de ambos com o ambiente empresarial, o PT acredita que domesticá-los nesta CPI será tarefa ainda mais fácil.

Após quase nove meses de retração econômica, a realidade enterrou a tese de Luiz Inácio Lula da Silva de que o Brasil seria o último país a entrar na crise e o primeiro a sair dela. Entramos junto com todos, como mostrou o número do PIB do quarto trimestre de 2008. E a China está à nossa frente na fila de saída. Aliás, estamos tentando engatar nosso vagãozinho na locomotiva chinesa. Mas não há sinal, avalia o governismo, de que a oposição tenha um plano para colar no presidente e na candidata dele, Dilma Rousseff, a responsabilidade pelo reboquismo e pelas dificuldades econômicas.

Na pior das hipóteses, a conta pelo colapso nas exportações -desemprego e corrosão da renda- será enviada para Henrique Meirelles no Banco Central. Ou para Guido Mantega no Ministério da Fazenda, o encarregado de periodicamente divulgar as projeções benignas que também ciclicamente são desmentidas pelos números da vida. Ausente o desgaste político para Lula e Dilma, e diante da certeza de que uma hora a economia vai voltar a crescer, tratar-se-ia apenas de esperar pela conclusão da travessia.

O PT e o Planalto avaliam também que vai de vento em popa a operação para transformar Dilma em destino do voto potencialmente capaz de oferecer um terceiro mandato para Lula. Se antes a chefe da Casa Civil era só um nome tirado do bolso do colete, ela já adquiriu vida própria, tornou-se a candidata do PT e de parte considerável do governismo. A ansiedade do PMDB seria um sintoma. Não de força, mas da busca de um caminho que combine a liberdade para confrontar o PT nos estados e a vontade de aderir ao projeto federal do petismo.

Mas, se tudo está dando tão certo, o que pode dar errado? A preocupação maior é a economia medíocre criar um ambiente nacional de mau humor. Mesmo sem uma ação mais afirmativa da oposição ao longo deste ano, tal fato poderia enfraquecer o discurso de Lula de que tudo deve continuar como está. E os governistas sabem que numa campanha eleitoral há maneiras de demolir o bom humor artificialmente mantido pelo efeito-gogó.

Outro incômodo é o PMDB. A montagem do rolo compressor na CPI da Petrobras é útil ali, mas sedimenta na opinião pública a duvidosa imagem construída para o partido. O PT quer o apoio do parceiro, mas não quer o ônus de ser apontado na campanha como patrocinador de uma aliança que perpetuará os piores hábitos da política nacional. Seria entregar de bandeja um senhor discurso ao PSDB. Ainda que o ímpeto ético dos tucanos, pensa o governo, esteja baqueado pela cassação do governador da Paraíba e pelo pântano de denúncias em que se atola a governadora do Rio Grande do Sul.

Mas preocupação mesmo é com a hipótese de uma união efetiva dos governadores de Minas Gerais e São Paulo na sucessão. Não apenas por somar o peso específico dos dois estados. Mas também pelo prestígio gerencial de Aécio Neves e José Serra, prestígio que dificulta a tarefa de vender o peixe do “desastre administrativo” que seria um governo comandado por ambos.

Daí que o presidente da República tenha dado a largada a um movimento anti-Serra. Que, caso necessário, pode se desdobrar numa operação anti-Aécio.

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