A cinco meses de deixar a Presidência, Lula recorre a uma frase que diz ter ouvido de Felipe González, ex-primeiro-ministro da Espanha, para definir sua condição futura: “Ex-presidente é que nem aquele vaso chinês que você ganha de presente. Você não sabe onde colocar o ex-presidente”.
Em ritmo de conta-gotas, o futuro “vaso chinês” vai revelando o espaço que deseja ocupar depois que for convertido em “ex”. Faz as contas: “Tenho 64 anos e, quando deixar a Presidência. vou ter 65 anos. Logo, ainda tenho uma contribuição política para dar ao país”.
Dias atrás, avisara que, fora do governo, fará o que não fez em oito anos de mandato: vai defender a reforma política como “um leão”. Descobre-se agora que Lula tem planos bem mais ambiciosos. Deseja liderar “a construção de uma frente ampla de partidos”.
Revelou o “sonho” numa entrevista à revista “IstoÉ”. Definiu a “frente ampla” como “uma espécie de seleção brasileira” suprapartidária. Convocado, o escrete não se ocuparia apenas da reforma política. Faria “um programa para o Brasil”.
Deseja acabar com o PT? “Não”, Lula responde. Acha que o PT, “organizado no Brasil inteiro, tem muita força”. Mas avalia que é possível “construir uma coisa mais forte do que um partido. Esclarece que a frente “pode ter gente da maioria dos partidos”.
Inquirido sobre a participação do PSDB no projeto, Lula cuidou de esclarecer que sua frente, embora “ampla”, tem limites: “Eu acho que acabou o tempo da ilusão em que a gente poderia trabalhar junto com o PSDB. Eu acreditei nisso. E muita gente do PT acreditou nisso”.
Alegou: os tucanos “escolheram outro projeto”. Recordou: ao virar presidente, FHC tentara reunir em torno de si “gente que na época se comportava como de esquerda, como o PPS”.
Diagnosticou: “Qual foi o problema? Foi a reeleição, que conduziu para uma relação promíscua com o Congresso. E a coisa desandou um pouco”. Nos lábios de um presidente que enxerga no retorvisor o escândalo do mensalão, a menção à promiscuidade alheia soa desconexa.
No curso da entrevista, o próprio Lula reconheceu: não fosse pela Sodoma mensaleira, seu candidato à Presidênsia seria outro. Recordou-se ao entrevistado que, antes de se fixar em Dilma Rousseff, cogitara outros nomes –Antonio Palocci e José Dirceu, por exemplo.
E Lula: “Obviamente, se não tivesse acontecido com o PT o que aconteceu em 2005, o quadro político poderia ser outro”. Ao acomodar Dilma Rousseff na Casa Civil, enxergou-a com outros olhos: “[...] Percebi que estava diante de um animal político não trabalhado. Um animal político que foi educado a vida inteira para ser técnica. E eu comecei a falar: bom, agora nós temos que descobrir o lado político de Dilma”.
Tomado pelo que disse na entrevista, sua opção anterior seria Palocci, não Dirceu. Reobriu-o de elogios. Apeado do ministério da Fazenda pelo escândalo da violação do sigilo bancário do caseiro, Palocci é, hoje, a voz de Lula no comitê de Dilma.
Será ministro dela caso o PT vença a eleição? Lula absteve-se de responder. Mas suas palavras tiveram o peso de um sim: “No Brasil, nós temos, se é que temos, raríssimas pessoas com a inteligência política do Palocci. [...] Devo muito do sucesso do meu governo ao Palocci. [...] É muito jovem e acho que tem muita contribuição para dar”.
Lula saboreia os efeitos da superpopularidade: “Fico feliz em saber que ninguém quer fazer campanha falando mal de mim. É uma coisa boa, é agradável”. Mas apressa-se em avisar: “Eu tenho um lado, um partido e um candidato”.
Não receia ofuscar o brilho de Dilma, diminuindo-a na campanha? “Não existe a possibilidade”, acredita. Por quê? “Vai chegando o momento em que o clima na sociedade, na imprensa, no debate, é da candidata, não é do presidente”.
Eleita, Dilma não será engolida pelo PT? “Quem fala isso não conhece a Dilma. Ela é uma mulher de personalidade muito forte. O PT está na direção da campanha da Dilma, como estava na direção da minha”.
Uma eventual gestão de sua pupila seria estatizante? “Não há essa hipótese. Eu conheço bem a Dilma e sei o que ela pensa. Obviamente que nós não queremos ser estatizantes, mas também não vamos carregar a pecha que nos imputaram nos anos 80, quando se dizia que o Estado não valia nada...”
Acredita em segundo turno? “Eu acho que é uma eleição que pode terminar no primeiro turno. Mas se for para o segundo, não existe nenhum problema. Vamos fazer uma bela campanha”.
Instado a dizer algo sobre José Serra, Lula disse: “Acho que ele deu azar”. Explicou: “Foi candidato num ano [2002] em que eu não tinha como perder. Agora, é candidato num ano em que a Dilma tem todas as condições de ganhar, porque o governo está muito bem e porque as coisas vão melhorar”.
- Serviço: Aqui, a íntegra da entrevista de Lula.
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