O recente envio de mais de mil soldados da Arábia Saudita e 500 policiais dos Emirados Árabes Unidos à monarquia do Barein indica que os Estados Unidos, verdadeiros donos da situação na região, estão cada vez mais preocupados com a ação dos grupos oposicionistas bareinitas, que desejam democratizar o país.
A rebelião que de início foi às ruas pela instauração de uma monarquia parlamentarista foi reprimida com balas. Uma evidência de que os Estados Unidos procuram obter controle sobre a oposição foi a pressão que o presidente Barack Obama fez sobre o rei Hamad al Khalifa para fazer a polícia e o exército recuarem, porque já havia se acertado com a oposição do país para a abertura de "diálogo".
Ministros pedem demissão
Dois ministros do governo real bareinita pediram demissão de seus cargos nesta quarta, após a forte repressão promovida pelas forças policiais anti-motins do Barein e por soldados da Arábia Saudita contra manifestantes que tentavam protestar na Praça Pérola, no centro de Manama, capital do reino.
As forças militares sauditas foram colocadas em ação e chegaram a invadir um hospital da cidade onde manifestantes feridos estavam sendo tratados. Testemunhas afirmaram que os sauditas teriam tomado todas as pessoas do prédio — inclusive enfermeiros e médicos — como prisioneiros, ameaçando utilizar munição real contra eles.
Um médico do Hospital Salmaniya relatou à emissora britânica BBC que "eles estão ao redor do hospital com suas armas e estão disparando em qualquer pessoa que passe diante do complexo hospitalar".
Outras organizações afirmaram que os médicos que procuraram auxiliar os manifestantes feridos pela polícia foram agredidos. A polícia bareinita bloqueou o acesso ao hospital.
Um dos demissionários, o ministro da saúde Nezar bin Sadeq al-Baharna, afirmou que não conseguia mais ver pessoas sendo agredidas pelos policiais no hospital Salmaniya.
Dentre os sauditas também estão militares do Catar e de Omã. Há também relatos de que juízes xiitas teriam renunciados a seus cargos na Corte do país, por causa "dos eventos sangrentos e do uso de força excessiva além de armas", segundo reportou a imprensa iraniana.
Em seguida à repressão, que deixou cinco mortos, o presidente americano Barack Obama ligou para o rei Abdullah da Arábia Saudita e para o rei Hamad do Barein. Segundo o porta-voz da Casa Branca, Jay Carney, Obama expressou aos monarcas sua "profunda preocupação" com as revoltas da oposição no Barein e a violência na repressão.
Importância crucial
Embora seja um país diminuto e com uma população relativamente pequena — 1,2 milhão de habitantes — o Barein é de enorme importância para o imperialismo e o sionismo. Seu território de 750 km² no Golfo Pérsico abriga a Quinta Frota da Marinha de Guerra estadunidense, que controla as águas por onde passam 20% do petróleo mundial e é base de logística para as provocações contra o Irã. Dali partiram os ataques ao Iraque na primeira Guerra do Golfo, em 1990, e há oito anos.
O Barein é uma das mais diversificadas economias no Golfo Pérsico. Com os setores de meios de transporte e de comunicação altamente desenvolvidos, o Barein transformou-se em sede de numerosas empresas com negócios no Golfo. Como parte de seus planos de diversificação, o Barein implantou um Tratado de Livre Comércio com os Estados Unidos em agosto de 2006, que foi o primeiro TLC assinado por um Estado do Golfo com os EUA. A economia do país depende basicamente do petróleo. Sua produção e refino resultam em mais de 60% das receitas de exportação bareinitas, 70% dos lucros do governo e 11% do PIB nacional.
Desconstruir e desvirtuar
No Barein, o imperialismo procura desconstruir e desvirtuar a onda revolucionária em curso no Oriente Médio e não há dúvidas de que por trás das ações de sauditas e emirados está a mão do Pentágono. Como prova disso, basta procurar na internet alguma declaração de qualquer autoridade dos Estados Unidos propondo a derrubada da monarquia bareinita, marroquina ou saudita — países satélites dos EUA no Norte da África e Oriente Médio —, ou pedindo uma reunião urgente do Conselho de Segurança da ONU para punir os agressores.
Em editorial publicado em 23 de fevereiro, o jornal americano The Wall Street Journal disse que "os EUA e a Europa deviam ajudar os líbios a derrocar o regime de Kadafi". Antes e depois desse editorial não há qualquer menção de Washington sobre uma intervenção para ajudar os manifestantes do Kuwait, da Arábia Saudita ou de Barein a derrocar seus ditadores.
Muito menos em relação a Israel, o satélite americano mais importante do Oriente Médio. Não houve qualquer intervenção norte-americana para ajudar o povo palestino de Gaza quando milhares de palestinos morreram em consequência do bloqueio promovido e executado por Israel. Nem haverá, já que Obama vetou uma resolução do Conselho de Segurança da ONU que condenava a construção de casas israelenses nos territórios ocupados da Palestina.
Posto avançado no Golfo Pérsico
Em termos populacionais, o Barein é pouco expressivo, abrigando pouco mais de 1,2 milhão de habitantes, cifra que pode ter baixado após êxodos provocados pela luta da maioria xiita contra a minoria sunita do reino de al Khalifa. Cerca de 16% de cada mil habitantes do país são estrangeiros migrantes.
Além do petróleo, outras atividades econômicas de monta são a produção de alumínio — segundo maior item de exportação do país —, o setor financeiro e o de construção civil. O Barein disputa com a Malásia o posto de centro internacional do setor bancário islâmico. O desemprego, especialmente entre a juventude, é um dos problemas mais graves da economia do país, o que fez com que a monarquia retirasse benefícios dos trabalhadores imigrantes e aumentasse os custos das empresas que empregavam estrangeiros.
O país tem 611.000 trabalhadores, segundo estimativas da monarquia bareinita publicadas em 2010. A dívida pública em 2009 passava dos 59%, enquanto a inflação rondava os 3,3%. O maior cliente das exportações bareinitas é a Índia (mais de 4%), seguida da Arábia Saudita (2,78%), país que responde por 22,95% das importações que a economia do país gera por ano. O segundo maior exportador para o Barein é a França, com 9,76%, enquanto os EUA respondem por 7,95% das importações.
O líder da oposição xiita no Barein, o religioso Ali Salmane, é representante da Associação do Entendimento Nacional Islâmico (Aeni). A associação conta com 18 deputados na Assembleia, em um total de 40 parlamentares, e Salmane repudia todas as formas de repressão aplicadas pelo reinado contra os cidadãos. “As soluções de segurança não podem resolver as crises”, afirmou, depois de uma repressão sangrenta praticada contra manifestantes há dez dias..
Cerca de 88% dos habitantes são islâmicos, dos quais 70% são da confissão xiita. Como o comando do país está nas mãos da minoria sunita, eles reivindicam mais ofertas de empregos e oportunidades e se dizem discriminados. Também querem melhores moradias para a população, a libertação dos presos políticos, assim como a criação de um Parlamento representativo. Al Khalifa está no poder há 40 anos.
Tropas sauditas
O monarca da Arábia Saudita, Abdullah bin Abdul Aziz, já vinha afirmando que era necessário aplacar a ira do povo com medidas econômicas, tanto na Arábia quanto no Barein, para onde chegou a enviar dinheiro. Como os protestos perduraram, acabou enviando soldados ao país vizinho, em conjunto com os Emirados Árabes Unidos que, curiosamente, declararam o envio de tropas por meio de seu chanceler, em coletiva de imprensa ao lado da secretária de Estado dos Estados Unidos, Hillary Clinton.
Os opositores denunciaram o envio de tropas como "ocupação aberta do reino do Barein e uma conspiração contra o povo desarmado", denunciando também que mais tropas sauditas já se encontravam no país.
Antes concentrados na praça Pérola, onde haviam instalado barricadas e tendas à maneira da praça Tahrir do Egito, o movimento bareinita vinha realizando atos nas ruas de Manama. Além da liderança xiita do movimento oposicionista, há também entre eles republicanos e defensores de uma monarquia constitucional.
A ameaça de uma intervenção militar estrangeira na Líbia está obviamente associada a esses acontecimentos no Barein, os fatos aí estão estreitamente entrelaçados e ligados à estratégia de domínio imperialista, que também passa pela contenção da democracia no Egito, na Tunísia e nos demais satélites árabes ainda submissos ao imperialismo.
O objetivo central dos Estados Unidos é conter e desvirtuar, neste momento, a onda revolucionária em curso no Oriente Médio e Norte da África.
por Humberto Alencar,
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