A revista Retrato do Brasil fez em suas últimas edições de 2012 uma série de reportagens especiais sobre o julgamento da AP 470, chamado pela imprensa de julgamento do mensalão. Elas mostram como a tese do desvio de dinheiro público do Banco do Brasil simplesmente não se sustenta.
Compartilho com vocês o link das edições de outubro, novembro e dezembro, além de colocar um resumo bastante completo sobre o material.
RESUMO DAS REPORTAGENS
O resumo é composto por sete breves tópicos:
O caso Visanet - sinopse das acusações
O que é a Visanet
Os pagamentos à DNA
As auditorias
A lista dos serviços prestados pela DNA
Bônus de volume
A acusação de propina
1) O caso Visanet – sinopse das acusações
Henrique Pizzolato, ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil, foi condenado por quatro crimes no julgamento da AP 470: corrupção passiva, porque teria recebido R$ 326 mil para favorecer Marcos Valério via antecipações de pagamento à agência DNA; lavagem de dinheiro, por ter recebido dinheiro em espécie e ocultado essa movimentação; um “pequeno peculato”, por ter desviado R$ 2,9 milhões por meio dos chamados bônus de volume, isto é, recursos dados pelos veículos de promoção e mídia em função do volume de serviços cobrados do BB, que seriam devidos ao banco, mas foram dados para uma empresa de Valério com a anuência de Pizzolato; e um “grande peculato”, pelo desvio de R$ 73,8 milhões, que também seriam do BB e foram dados para a mesma empresa de Valério, a partir de um fundo de incentivos ao uso de cartões da bandeira Visa.
Estavam em debate duas posições. De um lado, a dos réus, que sustentam a tese do caixa 2. Essa tese foi desenvolvida por Delúbio Soares e Marcos Valério, já em 2005. Eles sustentam ter repassado clandestinamente R$ 55 milhões para pagar dívidas de campanha do PT e partidos associados a ele nas eleições. Disseram que o dinheiro vinha de empréstimos tomados – pelo PT, mas, principalmente, pelas empresas de Valério.
De outro lado estava a tese da maioria da CPMI dos Correios, a tese do mensalão. Ela dizia que os R$ 55 milhões admitidos pelos acusados como caixa 2 não existiam. Seriam dinheiro público os R$ 76,7 milhões (73,8 milhões + 2,9 milhões) da soma do grande e do pequeno peculatos de Pizzolato, desviados do BB para Valério.
O relator do processo, Joaquim Barbosa, disse que o BB não tinha recibos do dinheiro gasto por Marcos Valério nos serviços prestados.
2) O que é a Visanet
Visanet é o nome fantasia da Companhia Brasileira de Meios de Pagamento (CBMP), fundada no Brasil em 1995 e que passou a operar mais amplamente a partir de 2001. O capital controlador da CBMP é da Visa International Service (Visa), que tem 10%; do Bradesco, com 39%; e do BB, 32%. O restante está dividido entre cerca de 20 outros sócios – bancos como Itaú, Santander e BankBoston. Pode-se dizer, porém, que o controle da CBMP sempre foi da Visa, empresa americana do mundo financeiro globalizado criado nas últimas décadas. Ela é a possuidora dos direitos dos cartões de crédito e débito da bandeira com seu nome, emitidos em cerca de 200 países.
A partir de 2001 a CBMP começou a operar no Brasil o Fundo de Incentivo Visanet (FIV), “com o objetivo único”, como diz um de seus documentos, “de realizar ações de marketing destinadas a incentivar o uso dos cartões Visa pelos consumidores”.
O FIV era formado por uma porcentagem dos negócios com os cartões e a CBMP destinava os recursos assim obtidos a ações de promoção e marketing dos mesmos, a serem comandadas pelos sócios. A CBMP arrecadou para o FIV cerca de meio bilhão de reais entre 2001 e fins de 2005, quando o fundo foi encerrado; na verdade, mudou de nome, devido à má repercussão das histórias divulgadas a respeito dele no mensalão.
O BB foi o líder dos negócios com cartões de bandeira Visa nesse período. Sua parte no FIV foi grande e crescente: aproximadamente R$ 150 milhões entre os anos de 2001 e 2004: R$ 60 milhões nos anos 2001–2002 – no governo Fernando Henrique Cardoso, portanto – e R$ 90 milhões nos anos 2003–2004, já no governo Lula, quando Pizzolato era diretor de Comunicação e Marketing do BB.
O FIV era administrado por um comitê gestor, formado por um presidente, um diretor de Finanças e Administração e outro de Marketing, todos da Visanet, a quem cabia verificar se os recursos estavam sendo empregados “de acordo com as diretrizes, a estratégia do negócio e as condições do Regulamento”.
Os contratos com a DNA
Os recibos dos gastos da agência de publicidade DNA, de Valério ficavam com a CBMP, que fazia pagamentos diretamente à agência. Ao definir sua participação no FIV, em 2001, o BB decidiu, por questões fiscais, que os recursos do FIV não passariam por seu orçamento. E nunca fez um contrato específico com a CBMP nem com a agência DNA para o uso dos recursos do FIV. Essa situação persistiu até meados de 2004. A DNA trabalhava com publicidade e promoção para o BB desde 1995. Entre 2001 e 2002 dividia os trabalhos de promoção com uso do dinheiro do FIV com outras agências contratadas para servir o banco.
3) Os pagamentos à DNA
Quanto ao desvio de R$ 73,8 milhões do BB para Valério, os ministros concluíram que, no cargo de diretor do BB, Pizzolato teria comandado, sozinho, o desvio do banco para a agência de publicidade DNA, principalmente na forma de adiantamentos, sem que se tenha comprovado a realização de qualquer propaganda ou promoção. Também isoladamente, ele teria prorrogado um contrato de publicidade com a DNA, no período de abril a setembro de 2003.
E, além disso, sem qualquer processo licitatório, Pizzolato teria dado a conta de publicidade do Banco Popular, lançado na época pelo BB, para a mesma agência de Valério, como se pudesse decidir tudo sozinho.
No caso das quatro notas técnicas de liberação de recursos para a DNA apresentadas pelo relator, Joaquim Barbosa, contra Pizzolato, o comitê de marketing da Visanet examinou todas as suas ações e as aprovou. Essas notas técnicas são planos de trabalho elaborados pelos gerentes executivos das áreas de varejo e publicidade do banco que recebem o “de acordo” dos diretores dessas áreas. No caso das notas apontadas como ilegais, em todas elas Pizzolato apenas deu o seu “de acordo” em conjunto com os demais diretores.
Além disso, todas tinham, no mínimo, a assinatura dos dois gerentes executivos dos comitês de marketing do BB – Cláudio de Castro Vasconcelos e Douglas Macedo – e dos dois diretores das áreas de varejo e marketing – respectivamente, Fernando Barbosa de Oliveira e Pizzolato. Como o dinheiro do fundo Visanet é considerado privado, conforme as interpretações tanto do BB como da Visanet, em seu voto para incriminar Pizzolato, Barbosa disse que não importava se os recursos eram públicos ou privados.
Mas o dinheiro não estava no BB e só quem podia tirá-lo do fundo Visanet eram os representantes legais do BB junto ao fundo. Pizzolato não tinha essa representação; logo, não tinha a posse do dinheiro.
4) As auditorias
Os autos da Ação Penal 470 contêm diversas evidências de que a DNA realizou os trabalhos pelos quais recebeu os R$ 73,8 milhões.
Dos autos do processo, com aproximadamente 50 mil páginas, cerca de metade é dedicada a três auditorias do BB sobre o uso do Fundo de Incentivo Visanet (FIV), do qual teriam sido desviados os R$ 73,8 milhões.
Em nenhuma parte, nem em uma sequer das páginas dessas gigantescas auditorias, afirma-se que houve desvio de dinheiro do banco. Nem o BB nem a Visanet processaram Pizzolato até agora.
No site da Retrados do Brasil, há um endereço onde pode ser localizada a mais completa dessas auditorias sobre o caso BB-Visanet. Lá estão os 108 apensos da AP 470 com os trabalhos dessa auditoria. São documentos em formato pdf equivalentes a mais de 20 mil páginas e foram coletados por uma equipe de 20 auditores do BB num trabalho de quatro meses, de 25 de julho a 7 de dezembro de 2005 e depois estendido com interrogatórios de pessoas envolvidas e de documentos coletados ao longo de 2006.
A auditoria foi buscar provas de que o escândalo existia. Fez um levantamento amplo do que foram as ações do FIV desde sua criação em 2001.
Um resumo da auditoria, de 32 páginas, está nas primeiras páginas do terceiro apenso (Vol. 320). Resumindo-a mais ainda se pode dizer que:
* As regras para uso do fundo pelo BB têm duas fases: uma, de sua criação em 2001 até meados de 2004, quando o banco adotou como referencial básico para uso dos recursos o Regulamento de Constituição e Uso do FIV da Companhia Brasileira de Meios de Pagamento (CBMP); e outra, do segundo semestre de 2004 até dezembro de 2005, quando o BB criou uma norma própria para o controle do fundo.
*Entre 2001 e 2004, a CBMP pagou, por ações do FIV programadas pelo BB, aproximadamente R$ 150 milhões de reais. E, nos dois períodos, sempre 80% dos recursos foram antecipados pela CBMP, a pedido do BB, para as agências de publicidade contratadas pelo banco.
*O BB decidiu, em 2001, por motivos fiscais, que os recursos do FIV não deveriam passar pelo banco. A CBMP pagaria diretamente os serviços através de agências contratadas pelo BB. A DNA e a Lowe Lintas foram as agências, no período 2001-2002. No final de 2002 o BB decidiu especializar suas agências e só a DNA ficou encarregada das promoções do FIV. Os originais dos documentos comprobatórios das ações ficavam na CBMP, não no BB, em todos os dois períodos.
*O fato de o BB encomendar as ações, mas não ser o controlador oficial das mesmas, fez com que, nos dois períodos, 2001-2002 e 2003-2004, fossem identificadas, diz a auditoria, “fragilidades no processo e falhas na condução de ações e eventos”, que motivaram mudanças nos controles de uso do fundo. Essas mudanças foram implementadas no segundo semestre de 2004, a partir de 1 de setembro.
*O relatório destaca algumas dessas “fragilidades” e “falhas”. Aqui destacaremos a do controle dos serviços, para saber se as ações de promoção tinham sido feitas de fato. Os auditores procuraram saber se existiam os comprovantes de que as ações de incentivo autorizadas pelo BB no período tinham sido de fato realizadas.
*Procuraram os documentos existentes no próprio banco – notas fiscais, faturas, recibos emitidos pelas agências para pagar os serviços e despesas de fornecedores para produzir as ações. Descobriram que, para os dois períodos 2001-2002 e 2003-2004 igualmente, somando-se as ações com falta absoluta de documentos às com falta parcial, tinha-se quase metade dos recursos despendidos.
**Os auditores procuraram então os mesmos documentos na CBMP, que é, por estatuto, a dona dos recursos e a controladora de sua aplicação e dos documentos originais de comprovação da realização dos serviços. A falta de documentação comprobatória foi, então, muito pequena - em proporção aos valores dos gastos autorizados, de 0,2% em 2001, 0,1% em 2002, 0,4% em 2003 e 1% em 2004.
*Dizem ainda os auditores: com as novas normas, em função das mudanças feitas nas formas de controlar o uso do dinheiro do FIV pelo BB, entre janeiro e agosto de 2005 foram executadas sete ações de incentivo, no valor de R$ 10,9 milhões e se pode constatar que, embora ainda precisassem de aprimoramento, as novas regras fixadas pelo banco estavam sendo cumpridas e os “mecanismos de controle” tinham sido aprimorados.
Ou seja: o uso dos recursos do FIV pelo BB foi feito, sob a gestão do petista Henrique Pizzolato, exatamente como tinha sido feito no governo FHC, nos dois anos anteriores à chegada de Pizzolato ao banco. E mais: foi sob a gestão de Pizzolato, em meados de 2004, que as regras para uso e controle dos recursos foram aprimoradas.
Em toda a documentação da auditoria, existem questionamentos, são apresentados problemas. Mas de detalhes. Não é disso que se tratou no julgamento da AP 470, no entanto. A acusação que se fez e que se pretende impor é outra coisa. As campanhas de promoção não só existiram como deram resultados espetaculares para o BB tendo em vista os objetivos pretendidos. O banco tornou-se o líder nos gastos com cartões Visa no Brasil.
Em 2003, o banco emitiu 5,3 milhões desses cartões, teve um crescimento de cerca de 35% no seu movimento de dinheiro através deles, tornou-se o número um nesse quesito entre os associados da CBMP. No final do ano, 18 de dezembro, às 14h30 horas, em São Paulo, no Itaim Bibi, rua Brigadeiro Faria Lima 3729, segundo andar, sala Platinum, de acordo com ata do encontro, os representantes dos sócios no Conselho de Administração da CBMP se reuniram e aprovaram o plano para o ano seguinte. Faturamento esperado nas transações com os cartões Visa para 2004: R$ 156 bilhões. Dinheiro do FIV, ou seja: recursos para as promoções dos cartões pelos vários bancos associados, 0,10%, ou seja 1 milésimo, desse total: R$ 156 milhões. Parte a ser usada pelo BB, que era, dos 25 sócios da CBMP, o mais empenhado nas promoções: R$ 35 milhões.
As antecipações
As antecipações, mostrou o trabalho dos auditores, tanto as de 2001–2002 como as de 2003–2004, foram repassadas às agências de publicidade contra a apresentação de documentos fiscais no valor global das ações. No caso das do período 2001–2002, no documento do BB que pedia as antecipações constava o valor de cada ação. No caso das de 2003–2004, o valor de cada ação era apresentado em 93 ações de incentivos distintas, cada uma delas “descritas em nota técnica específica”, em documento da Dimac.
A defesa de Valério disse que a maior parte dos recursos repassados pela Visanet, em torno de 66%, foi empregada no pagamento de veiculação junto às maiores empresas de mídia do País. Ele apresentou uma relação de pagamentos feitos pela agência, com o número das notas fiscais emitidas para fornecedores, os valores e as comissões devidas à DNA, em que os maiores valores são pagos às emissoras de TV Globo, Record, SBT e Bandeirantes, além de várias agências de publicidade subcontratadas, como a D+, a Meta 29, a Ogilvy e a Markplan, além de casas de show, da BBTur – Viagens e Turismo e outras empresas.
A denúncia diz ainda que, embora o BB tenha contratado três agências para cuidar da publicidade, apenas a DNA foi beneficiada com antecipações de recursos. Isso é falso, diz a defesa de Pizzolato. Em 2001–2002 foram feitas antecipações para todas as empresas de publicidade do BB que prestavam serviços de promoção dos cartões Visa.
5) A lista dos serviços prestados pela DNA
Além das auditorias, mais um importante documento desmonta a acusação de desvio no BB. Na edição de dezembro , a Retrato do Brasil mostra um documento reservado da CBMP, preparado por um grande escritório de advocacia de São Paulo para ser encaminhado à Receita Federal, no qual a companhia lista todos os trabalhos feitos pela DNA, que confirma informações constantes das outras três auditorias do BB. Porém, acrescenta um dado essencial: mostra que a empresa tem os recibos e todos os comprovantes — como fotos, vídeos, cartazes, testemunhos — atestando que os serviços de promoção para a venda de cartões de bandeira Visa pelo BB foram realizados.
Como se pode verificar na tabela que a revista mostra, os projetos de uso dos recursos do fundo dos quais os R$ 73,8 milhões teriam sumido eram todos, se realizados, de enorme exposição pública. Se não realizados, eram praticamente impossíveis de inventar.
Nenhuma das instâncias com poder para tal mandou fazer essa simples prova da existência material do delito: investigar se as ações de incentivo haviam sido realizadas ou não.
Tanto o procurador-geral que ofereceu a denúncia, Antonio Fernando Souza, como o ministro Joaquim Barbosa fizeram simplesmente uma investigação policial, de campo, e não só de documentos, para saber se os serviços haviam sido realizados.
Em 2006, Souza tentava obter da companhia os papéis originais das prestações de contas feitas pela agência de publicidade DNA, de Marcos Valério, a respeito dos serviços, seus e de fornecedores contratados para fazer os trabalhos de promoção para a venda dos cartões, mas a CBMP resistia.
No dia 30 de junho de 2006, Joaquim Barbosa autorizou a busca e apreensão de documentos da CBMP. A empresa apelou à presidência do STF. Mas a então presidente, Ellen Gracie, reafirmou a busca, feita em julho. Houve petições dos advogados da companhia para que fossem devolvidos documentos protegidos pelo princípio da inviolabilidade das relações advogados-clientes.
Os documentos que ficaram foram encaminhados ao Instituto Nacional de Criminalística. O material permitia construir a tabela, do final de 2006, que a Retrato do Brasil publica de um dos maiores escritórios de advocacia do País a serviço da CBMP, que argumentou, a fim de evitar o pagamento de impostos indevidos pela companhia, terem sido todas as ações de incentivo realizadas.
E observou, apenas, que algumas podem ter sido realizadas sem promover especificamente os cartões da bandeira Visa, que era o essencial para a CBMP, uma empresa controlada pela Visa Internacional, parte do oligopólio internacional dos cartões de crédito e débito de uso global.
Com os documentos, era possível entender a forma de funcionamento do Fundo de Incentivo Visanet: a CBMP pagava os serviços de promoção dos cartões por meio da DNA, serviços esses programados pelo BB, sem que existissem contratos entre a CBMP e a DNA, nem entre o BB e a DNA, para operação desses recursos específicos.
Nos autos, existe um parecer jurídico do BB que considera perfeitamente legal essa engenharia jurídica. Ela foi construída desde 2001 pelo banco estatal e a empresa de cartões multinacional e seus outros sócios. Sobre ela, Pizzolato não teve a menor influência.
6) Bônus de volume
Os dois peculatos – desvios de R$ 2,9 milhões e R$ 73,8 milhões do BB – que Pizzolato teria cometido a favor da agência DNA, de Valério, formam os pilares de sustentação do mensalão. Esses R$ 2,9 milhões teriam sido desviados por meio de bônus de volume, ou BVs.
A acusação é de que a DNA de Valério embolsava indevidamente bonificações que seriam do BB, dadas a ela, pelas empresas com as quais contratava serviços para promoção dos cartões Visa do BB, em função do volume dessas contratações. No interrogatório judicial de Pizzolato, em 2008, o juiz Granado leu um trecho da denúncia do então procurador-geral que afirmava que as bonificações de volume pagas pelos fornecedores de serviços para a DNA – jornais, TVs, empresas de promoção contratadas pelo publicitário para os trabalhos de estímulo ao uso dos cartões Visa do BB – deveriam ter sido repassadas ao BB pela agência de Valério e não o foram. O próprio Granado informou que esse procedimento era antigo: cinco agências, entre 2000 e 2005, embolsaram esses BVs e não apenas a DNA.
Pizzolato fez, então, primeiro, um esclarecimento. Mostrou que existem dois tipos de bonificação. Uma é o BV, fruto da relação entre a agência de publicidade e o fornecedor de mídia – TVs, rádios, jornais, revistas, etc. “O nome já diz, é uma bonificação em função do volume”, disse Pizzolato. Não se restringe ao volume de publicidade veiculado pela agência por um cliente, como o BB. Todas as agências que prestavam serviços para o banco tinham vários clientes e o BV era dado pelas empresas de mídia às agências pelo volume total de anúncios veiculados. “Isso, doutor, é praticado em todo o mercado, público e privado”, disse Pizzolato a Granado.
O próprio Tribunal de Contas da União (TCU) confirma isso em uma auditoria a que Granado tinha se referido, acrescentou Pizzolato: “[O TCU] diz que o BV foi praticado no Banco do Brasil de 2000 a 2005, por todas as cinco agências que prestaram serviços ao banco nessa época”. Pizzolato explicou depois que o BV se distingue de bonificação de espaço, que vem da relação entre o BB e os fornecedores de mídia. “Os fornecedores – jornais, rádios, televisões – costumam oferecer uma bonificação de espaço, de mídia, para que o período de compra seja mais longo. Por exemplo, eu comprei 60 dias de espaço no Valor Econômico. O Valor Econômico me faz uma proposta: se você comprar noventa dias ou seis meses eu te ofereço, como bonificação de mídia, o caderno especial de domingo, porque vou lançar um caderno especial, um encarte. Pode dizer também: eu te dou mais 5% de desconto”. Nesse caso, o banco participa da negociação. E todo esse tipo de bonificação foi revertido para o BB, disse Pizzolato ao juiz. Nesse caso, não há transação financeira, disse Pizzolato a Granado.
Tal entendimento é de amplamente aceito e praticado no mercado publicitário.
O BB mostrou a Barbosa que apresentou recursos contra decisão do TCU que mandava o banco pedir auditoria nas cinco agências que contratara, para poder juntar, aos autos do processo naquele tribunal, todas as notas fiscais relativas a serviços de BVs emitidas por essas cinco agências. O BB mostrou que isso não foi aceito por nenhuma delas. Todas informaram que “as notas fiscais relativas a BVs, por dizerem respeito a negociações privadas entre elas e seus fornecedores, nada tinham a ver com seus contratos firmados com o Banco do Brasil” e não estavam contempladas entre os documentos que poderiam ser fiscalizados pelo banco.
A lei 12.232/2010, que dispõe sobre as normas gerais para licitação e contratação de serviços de publicidade pela União, foi editada para regulamentar o que já existia nas relações de fato entre agências e anunciantes públicos e privados. É de 2008 e legaliza a retenção, pelas agências, dos BVs nos contratos com as empresas estatais.
7) A acusação de propina
Para justificar a acusação de que Pizzolato recebeu R$ 326 mil, a acusação trabalhou para provar que ele teria comprado um apartamento de R$ 400 mil no mês seguinte ao recebimento de dinheiro de Valério, mas fracassou. Pizzolato provou que comprou o apartamento com suas economias, com um cheque do BB e mais R$ 100 mil em espécie, resultado da venda de dólares que comprara – ele mostrou o comprovante de aquisição.
Ao depor na CPMI em 2005, Pizzolato abriu para a Justiça, imediatamente, todos os seus sigilos bancário, fiscal e telefônico. Mostrou que tinha recursos mais que suficientes para comprar o apartamento que a acusação sugeria ter saído de suborno recebido. Em 2005, por exemplo, recebia R$ 4 mil da Previ, R$ 19 mil do BB, R$ 18 mil a título de participação no conselho da Embraer e mais R$ 4 mil devido à atuação no conselho da Associação Nacional dos Funcionários do BB.
Em 2003, seu patrimônio era de R$ 1.304.725,45. Em 2004, de R$ 1.768.090,23, já incluído o apartamento comprado em fevereiro daquele ano. Seu rendimento bruto anual em 2004 foi de R$ 717.611,46 – aproximadamente 60 mil reais por mês.
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