Já era de se esperar, diante da força do capital financeiro/rentista, a nova alta da taxa de juros (Selic) de 0,5%. Ela chegou, desta forma, a 10,5%. Foi a sétima alta consecutiva deste indicador. O Brasil perde, mais uma vez, alimentando o círculo vicioso que nos acomete desde 1994, sintetizado na perversa combinação de juros altos e câmbio valorizado. A combinação, para consumo externo, seria o remédio ideal – e à brasileira – ao combate à inflação.
Entre a aparência e a essência, muitas vezes, existe uma imensa distância. A ação coordenada dos agentes dominantes do capital financeiro, iniciada como reação à tentativa da presidenta Dilma em mudar os parâmetros da política macroeconômica, surte efeitos retardados e com descomunal força.
Baseado em uma campanha orquestrada (abandono do “tripé macroeconômico”, descontrole dos gastos públicos e da inflação, etc.), os instrumentos desta ação todos nós conhecemos e se resume a um terrorismo, capaz tanto de mobilizar força política na disputa pelo poder de fato em nosso país quanto inviabilizar qualquer ambiente propício ao investimento e ao crescimento econômico, calcados na produção, e capaz de superar a predominância das finanças sobre a geração de riquezas.
A palavra-chave capaz de explicar todo esse processo não está em qualquer manual de macroeconomia. A palavra-chave é poder, poder político e a respectiva base material que o sustenta. Para tanto, observar o processo, em detrimento do imediato, é essencial e nos deve remontar ao pacto político tácito que envolveu a criação do Plano Real, como expressão da troca dos ganhos da hiperinflação pelos astronômicos lucros, baseados diretamente num dumping do Estado sobre o seu próprio orçamento, sob a rubrica dos juros ao pagamento da dívida pública.
Os juros da dívida pública transformaram-se, desde então, na base material que dá sustentabilidade política à Casa Grande do século 21, a saber, o capital financeiro, que por sua vez distribui suas migalhas aos seus súditos aquartelados na grande imprensa, nas grandes universidades e no seio do aparelho estatal. A combinação deste caldo político/financeiro pode muito bem aludir a algo próximo de um golpe de Estado e com alto grau de sofisticação, diferentemente de levantes militares típicos das décadas de 1960 e 1970.
Qual a alternativa a este estado de coisas? Poderíamos elencar uma série de medidas técnicas, entre elas, o da extinção das Letras Financeiras do Tesouro (LFTs), com o objetivo de desvincular o mercado de reservas bancárias do mercado de títulos da dívida pública. Pode-se até mesmo sinalizar para o início do fim da utilização da Selic como remédio contrainflacionário em prol de uma busca de harmonia entre oferta e procura no médio prazo e baseada no aumento da taxa de investimentos.
Toda essa receita progressista alternativa demanda força política acumulada, convicções e um acordo geral rubricado por todos os segmentos da sociedade, em torno da troca do curto prazo por uma estratégia desenvolvimentista de médio e longo prazos. Nada disso é fácil e demonstra onde estamos, pois significa proscrição de uma determinada estrutura de poder consolidada. Ideias, amplitude e radicalidade nunca foram tão necessárias como na conjuntura econômica atual.
*Renato Rabelo é o presidente nacional do PCdoB.