E aos 15 minutos do segundo tempo da prorrogação veio o melhor momento da entrevista que a presidente concedeu a jornalistas da Folha de São Paulo, do portal UOL, da rádio Jovem Pan e do SBT.
Dilma Roussef revelou que traz dois hábitos dos tempos que fugia dos agentes da ditadura.
O primeiro ter dinheiro em espécie à mão, para emergências. Como está declarado em sua declaração de bens, ela tem uns 150 mil reais.
O segundo é mais estranho, ela dorme de sapatos. Quer dizer, estranho para quem não tem que se vestir com urgência para bater em retirada, situação vivida por Dilma na época dos militares.
Tanto a mídia vem escrevendo sobre Dilma, e os brasileiros desconheciam informações deliciosas como estas. Isso não depõe a favor de jornais e revistas, definitivamente.
Estamos sempre com os braços remando contra a corrente, rumo ao passado, como escreveu Fitzgerald em sua obra máxima, O Grande Gatsby.
O dinheiro guardado e os sapatos no sono são os remos de Dilma.
O resto da sabatina foi o que se esperava. Quatro jornalistas tentando morder Dilma de todas as formas.
Adjetivos negativos se espilharam. A situação econômica, ouvimos, não é simplesmente complicada. É “bastante ruim”.
A rejeição a ela, ouvimos também, não é normal, compatível com a de outros presidentes em final de mandato: é uma calamidade.
O “mercado” vê nela, também ficamos sabendo, a combinação de tudo que de ruim alguém pode fazer no Planalto: política fiscal “frouxa”, complacência com a inflação, crescimento baixo.
E a corrupção, ah, a corrupção foi inventada pelo PT.
Nem parece, enfim, que Dilma lidera as pesquisas, e que tem boas chances de ganhar no primeiro turno.
Se ela dependesse dos entrevistadores para calibrar sua autoestima, estaria frita.
Mas não.
Dilma pareceu serena diante da pancadaria. Sem ser uma oradora natural, sem ser um fenômeno da retórica, saiu-se bem nas respostas.
Em comparação com Aécio, é menos loquaz, mas não trai, como ele, contrariedade diante de perguntas duras. Uma coisa pela outra, a vantagem é dela.
O único momento em que pareceu irritada foi quando o Santander apareceu na conversa.
Dilma não ficou satisfeita com as desculpas do banco, “muito protocolares”. Ela pareceu disposta a dar uma bronca pessoalmente no presidente do banco, se encontrar uma vaga na agenda.
Foi diplomática ao falar de Israel. Não endossou a palavra “genocídio”, usada por alguém de seu governo.
Preferiu “massacre”.
Falou nas mulheres e nas crianças mortas em Gaza. Mas lembrou que o Brasil foi um dos primeiros países a reconhecer Israel.
Subiu ligeiramente de tom quando foram invocados negativamente os médicos cubanos por conta dos salários.
Disse, com razão, ser incrível que, em pleno 2014, Cuba ainda seja objeto de manifestações “fundamentalistas”.
Mas o melhor da sabatina esteve fora da política e dentro da vida pessoal – no dinheiro em espécie e nos sapatos ao dormir.
Ali se viu não a presidenta em busca de um segundo mandato, mas uma mulher em busca de seus anos dourados, como o Gatsby de Fitzgerald.