A instalação esta semana do Instituto Lula, uma espécie de Presidência da República para chamar de sua, com mais ministros da Casa e assessores diretos do que tem a presidente de direito, além de um Conselhão de intelectuais e assessores, entre eles dois ministros de fato em dupla jornada, revigorou a constatação que volta e meia chacoalha a pasmaceira político-empresarial:
Lula, e não
Dilma, concorrerá à Presidência em
2014.
No registro do cenário de segunda-feira o presidente se curva levemente na fotografia para dar uma impressão de que se trata de um escrete do qual é apenas o artilheiro. O disfarce, porém, revelou mesmo um Ministério completo, em pose e formação.
Todos os gestos do ex-presidente são óbvios: denotam decisão e objetivo, campanha aberta para suceder Dilma Rousseff. Na verdade, campanha continuada, permanente, como tem feito há anos, para eleger-se. Portanto, claro está que Lula trabalha para manter acesa a chama do seu eleitorado ao longo desses próximos três anos e meio.
Melhor cenário para ex é Dilma dar-se por satisfeita até 2014
Teoricamente, o ex-presidente vai usar o seu Instituto para promover andanças pelo mundo fazendo palestras, em especial para levar sua experiência à África e à América do Sul. E também para, em matéria de atividade político-eleitoral, ajudar candidatos do PT às disputas municipais de 2012. Até vai, como já foi, mas são atividades singelas demais, que seguem no automático, diante da imensa capacidade da estrutura política que montou. Lula instituiu, na verdade, o governo paralelo, uma Presidência para o ex passar o interregno.
Recebe políticos em romaria, alguns telefonam para seus líderes do Congresso da fila de espera do gabinete de Lula, outros procuram presidentes de partidos para conseguir com ele uma audiência. Mantém os laços com a aliança de partidos que o apoiaram e quer que permaneçam unidos na perspectiva do futuro poder. Alimenta as relações que estreitou com empresários que tiveram excelente trânsito no seu grupo. Procura, ele próprio, os governadores. E, palanque máximo, pede a eles uma agenda para si nos Estados.
Na coreografia da semana passada, por exemplo, Lula conseguiu que Sergio Cabral, governador do Rio, e Pezão, o vice que chefia o governo, organizassem um grande encontro no Estado, para o qual levaram os aliados, deputados, senadores, secretários. Lula presente, houve uma reclamação estridente da presidente Dilma do começo ao fim. Em outro evento da mesma semana, sem a presença física de Lula, o governador de Brasília, Agnelo Queiroz, reuniu os governadores do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, os presidentes do Senado e da Câmara, e a choradeira contra o governo federal e a presidente, os grandes ausentes não convidados à catarse, dominou a reunião. Um relatório completo foi dado a conhecer ao governo paralelo, cujas preocupações centrais vão ao encontro das preocupações centrais dos Estados: dinheiro para a Copa, dinheiro para o PAC.
Lula vai também se metendo de corpo e alma no governo de direito, sem maiores constrangimentos, não só para evitar a dispersão da base aliada, insatisfeita com o estilo da presidente, mas para manter seus ministros nos postos e tratar, caso algum deles caia em desgraça, de emplacar o substituto. Foi o que ocorreu no Ministério da Defesa.
O grande plano estratégico do ex-presidente lhe exige, porém, alguma delicadeza na tática. Na avaliação que fazem alguns de seus próximos aliados na atual empreitada, não interessaria a Dilma ou a Lula explicitar a disputa, isso os fragilizaria. Melhor, para os dois, fazer o discurso do projeto único.
Por mais que a história dos dois personagens desautorize a constatação, não haveria, segundo os aliados, acerto preliminar entre Lula e Dilma para que ela abra mão da sua reeleição permitindo a volta do ex. Acham mesmo que se ela estiver bem, vai querer disputar, e tem arsenal para isso.
Ela teria toda uma base de apoio no Congresso que segue o esquema de poder formal, teria seus ministros que trabalhariam para ela continuar no governo e eles também, teria o poder real e a caneta para levar adiante o projeto. E, claro, está construindo uma agenda própria, diferente da do ex-presidente e até, em alguns casos, em conflito com ele, como seria o caso da das ações de combate à corrupção, que acabam por aproximá-la mais de um eleitorado da classe média e até mesmo da mídia, dois grupos de quem o ex-presidente guardou distância. É o tipo de agenda que, comenta um de seus aliados próximos, a fortalecem, a diferenciam de Lula e a levam a adquirir instrumentos para a reeleição.
O poder, nas análises desse grupo, tem uma vocação, uma vida própria, e ninguém que detenha um mandato de presidente da República vai passá-lo adiante sem razão forte, mesmo que seja para devolvê-lo a quem lhe possibilitou obtê-lo. Isto significa que para Lula voltar, teria que haver uma situação excepcional. Na marra, seria impossível. Uma questão a conferir.
Se estiver à época apropriada com um razoável grau de aprovação do seu desempenho e uma aceitação razoável do governo, a presidente Dilma não seria impedida por Lula de tentar a reeleição. “Seria uma violência inominável, chocaria a vida política, as instituições, o eleitorado”, comenta um analista desta delicada equação apontando as dificuldades para tirá-la do palanque no caso de sucesso. Se, por outro lado, o governo Dilma não estiver dando certo, estará aberto para Lula o espaço da candidatura. Há, contudo, mais duas questões a considerar.
Se Dilma estiver mal, será em razão de crises econômicas e políticas com reflexos no desempenho do governo. Difícil uma situação que debilita a criatura não respingar no criador. Ele será sempre o responsável por ela, o contágio será inevitável.
Lula está em campanha, há uma grande evidência de que cava sua candidatura com garra e as dificuldades, por sua estreita relação com a presidente, como se tem visto, não o impedem de ser ousado e barbarizar. O melhor cenário para ele seria Dilma dar-se por satisfeita com um mandato exitoso. A alternativa, não tão boa assim, é o ex-presidente conseguir convencer Dilma, pela persuasão e sem agredir o eleitorado, a não disputar um novo mandato apesar do bom desempenho.
por Rosângela Bittar
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