Faça você mesmo
Ex-jornalista Ricardo Noblat atribui frase ao finado - Eduardo Campos - para atacar Roberto Amaral
Traduzindo Blablarina
Quando a liberdade de expressão mostrou sua cara ao Brasil
Charge do dia
Para confrontar a presidente e candidata Dilma Rousseff que, na entrevista ao Jornal Nacional, ousou replicar as acusações da bancada, a Globo requentou a pesquisa já divulgada pelo Datafolha há alguns dias sobre a saúde pública e privada no Brasil
Mas descobriu números que não gostaria de noticiar e jogou estas informações para o o pé da matéria:. "Para os entrevistados que disseram ter utilizado algum serviço do SUS, 26% consideram a qualidade do atendimento como ruim ou péssimo; 44% avaliam como regular; e 30% considera a qualidade boa ou excelente".
Percebe-se que a avaliação é de quem usou o SUS. O que a Globo fez: misturou alguns dados para dar impessão de que 93% desaprovam o sistema. Ou mais especificamente:
1. Considerou alguma insatisfação como insatisfação total
2. Não discriminou dados de saúde pública e privada
3. Enfatizou a soma daqueles que consideram o sistema com "ruim" ou "péssimo" com os que o consideram "regular".
4. Não diferenciou a opinião daqueles que usam o sistema de atendimento em postos e hospitais da opinião daqueles que não o utilizam para estes fins.
Para acentuar "a má avaliação" sobre o SUS, a Globo contou com depoimentos de representantes da APM (Associação Paulista de Medicina) e do CFM (Conselho Federal de Medicina) que utilizaram-se de "retórica da vingança" contra o Governo. É bom lembrar que estas entidades foram totalmente contra a vinda de médicos do exterior para atender pessoas no interior e nas periferias.
Um dos entrevistados chegou a afirnar que "é o pior momento do sistema de saúde em 40 anos" de profissão. O que é mentira, já que o SUS tem pouco mais de 25 anos.
Emissora e entidades sonegam outras informações
Pior que produzir matéria com fins eleitorais, no entanto, é o que vem fazendo as entidades e a grande imprensa contra o Sistema Único de Saúde. Podemos elencar algumas informações que podeiram servir de base para a avaliação da população brasileira.
O que a Globo, a APM e o CRM escondem da população.
1. Que a responsabilidade do SUS é compartilhada entre municípios, estados, Distrito Federal e União.
2. Que a atenção básica, por exigir adequação a realidades locais, pesa mais sobre a gestão dos municípios.
3. Que o SUS, que atende 100% da população, conta com pouco mais do dobro da receita das empresas de saúde privada, que atendem 25%.
4. Que, embora as empresas privadas tenham, portanto, quase o dobro da receita da Saúde Pública por habitante, ainda assim assistem a um aumento de 400% no número de reclamações em dez anos (as críticas ao setor privado foram ocultadas na pesquisa).
5. Que este número não aparece na mídia, porque estas empresas são grandes anunciantes.
6. Que programas do SUS são bem avaliados pela população: Farmácia Popular, vacinações e SAMU, etc.
7. Que todo mundo usa o SUS, embora não saiba (Campanhas de vacinação, por exemplo)
8. Que quando se diz que a saúde de SP é a melhor do país, se está dizendo apenas que o SUS de SP é o melhor do país, embora seja mentira. Estados do Sul, Distrito Federal e até Minas Gerais são mais bem avaliados.
9. Que conquistas do SUS, como redução da mortalidade infantil e maternal, combate a AIDs, campanhas de vacinação, etc, são reconhecidas em todo o mundo por agências internacionais.
10. Que a isenção fiscal, com dedução de gastos de saúde no imposto de renda, retira dinheiro da saúde pública
11. Que nenhum país com mais de 60 milhões de pessoas (Inglaterra ou França) ousou ter um plano universal e gratuito (ou seja, sem nenhuma forma de co-participação financeira ou desconto dos salários)
12. Que a participação social é um princípio do SUS. E portanto a população mais do que usuária poderia ser motivada a participar de conselhos municipais e estaduais.
13. Que o balanço da saúde pública no Brasil de agora é melhor que há mais de 25 anos pelo simples fato de que não havia saúde universal e gratuito. E isso foi destacado recentemente por um relatório do Banco Mundial.
14. Que, se não fosse o sistema de ressarcimento, seu plano de saúde seria mais caro.
15. Que, em tratamentos como diálise, o plano não garante muito mais que o quarto. O resto é responsabilidade pública, embora o plano não diga.
16.Que o Ministério da Saúde não faz mais campanhas porque tem que pagar pelo espaço ocupado em televisão, que, no entanto, é uma concessão pública.
17. Que hospital municipal é de responsabilidade, pasmem, municipal (controle e gerência), estadual é do estado, e federal é da União.
18. Que os números jogados no pé da matéria apontam para uma saúde "minimamente razoável" (ora, se 74% concordam que é de regular a bom, então é minimamente razoável).
19. Que os sistemas universais e gratuitos de países modelos como França e Inglaterra contam com três vezes mais recursos per capita que o SUS, simplesmente porque são países como esta proporcionalidade de PIB per capita.
20. Que vários tipos de transplante estão com a fila zerada ou quase zerada
21. Que existem hospitais de referência no SUS, como a rede Sarah, o Inca, e o Hospital de Barretos para o câncer.
22. Que, ao fazer campanha contra a CPMF, a mídia contribuiu para reduzir o financiamento do sistema. Bastava lutar pela vinculação da receita, por meio de uma emenda constitucional.
23. Que, ao sonegar milhões em impostos, como já comprovado, a empresa está prejudicando também a receita para a saúde.
24. Que tudo acima já deveria ser de conhecimento da população, se a Globo se comportasse, dentro do jornalismo, como uma emissora séria.
Com manhas de pau-de-arara, Dilma escancarou a parcialidade da Globo e o amadorismo de Bonner
Por Ricardo Amaral
A entrevista com a presidenta Dilma Rousseff expôs, com rara contundência, a parcialidade da Globo na cobertura do governo e do PT. Utilizando manhas de quem passou pelo pau-de-arara, Dilma pôs abaixo a tentativa da Globo de parecer "isenta" nesse capítulo das eleições. Isso não é banal, no momento em que a credibilidade da imprensa hegemônica segue abalada pelo fiasco histórico da "operação Copa".
A credibilidade do jornalismo da Globo saiu mais uma vez arranhada pelos esgares de William Bonner e Patrícia Poeta. As expressões de contrariedade, os dedos em riste e as interrupções grosseiras falaram mais ao telespectador do que o conteúdo de perguntas e respostas. Por algum tempo, tudo que se disser no JN contra Dilma será recebido com suspeita, porque a mensagem mais forte do programa foi: eles não gostam dela.
Dos 16 minutos cronometrados, Dilma falou 10 minutos e meio; Bonner, 4 e meio, e Patrícia quase 1 minuto. Dá 65% para ela e 35% para eles. Dilma pronunciou 1.383 palavras, contra 980 da dupla (766 só do Bonner), o que dá 60% x 40%. Isso é escore de debate, não de entrevista. A dupla encaixou 26 acusações ao governo e ao PT; algumas, com ponto de exclamação.
Nos quatro blocos temáticos (corrupção, mensalão, saúde e economia) Bonner lançou no ar 13 pontos de interrogação, e Patrícia, dois. A presidenta foi interrompida 19 vezes. Tomou dedo na cara de Bonner e de Patrícia, que reclamou de uma resposta com um soquinho na mesa. Isso não é comportamento de jornalista. Na entrevista com Aécio Neves – que muitos acharam "dura", embora tenha sido apenas previsível – a dupla fez quatro interrupções e cinco reiterações de perguntas.
Aprendi ainda foca que o segredo de uma entrevista ao vivo é dominar o assunto e buscar a pergunta seguinte na resposta do entrevistado. É uma arte difícil. Patrícia Poeta nunca soube fazer. Bonner acha que sabe – e que sabe muito. Por isso saiu-se ainda pior que a colega. Basta discordar do enunciado para desnorteá-los. Não sabem do que estão falando; seguem o roteiro e fazem cara de argúcia (com Dilma, usavam ponto eletrônico!).
Maus entrevistadores são incapazes de ouvir respostas e dialogar com o argumento do entrevistado. Não é só amadorismo; é presunção. Globais se consideram mais importantes que os candidatos. Acham-se a própria notícia. Diante da contradita, repetem a pergunta até se perderem. No limite, apelam para a fórmula binária: "eu digo isso; sim ou não?" Eduardo Campos saiu-se muito bem dessa briga com bêbados. Aécio tropeçou e caiu.
Para a Globo, pouco importa expor os editores chefe e assistente do JN a mais um vexame profissional. A Globo não quer ouvir respostas; quer repetir (e tentar sancionar) o próprio discurso. Bonner deve ter ensaiado em casa o que considerava seu momento de glória: chamar de corruptos os petistas do mensalão ("Eram corruptos!"), na cara da presidenta da República. Que audácia, hein, patrão...
Na primeira pergunta (69 segundos), a palavra corrupção foi repetida sete vezes; e estamos conversados. Depois de 12 anos ("mais de uma década, candidata!") há "filas e filas nos hospitais", cidadãos "muitas vezes são atendidos em macas", "muitas vezes não conseguem fazer um exame de diagnóstico". O país tem "inflação alta, indústrias com estoques elevados, ameaça de desemprego ali na frente".
Repetir os mantras do noticiário negativo – sem de fato abrir a discussão sobre eles – era o primeiro dever de casa. O segundo era desconcertar a entrevistada, e foi aí que a bomba explodiu no colo dos entrevistadores. Dilma não abriu mão de responder as perguntas, retomando o fio da meada a cada interrupção. Advertida, fez-se de sonsa e continuou respondendo o que quis.
O jogo foi chato na maior parte do tempo, mas Dilma não entregou a posse de bola, não cedeu o controle da entrevista. E foram eles, William e Patrícia, que ficaram visivelmente desconcertados, a ponto de perder o respeito pela entrevistada – que o merecia, mesmo que não fosse presidenta da República.
Dilma não disse aos interrogadores o que eles queriam que ela dissesse, exceto ao concordar com Patrícia Poeta que "a saúde no país não é minimamente razoável". Um pontinho vencido, foi tudo que conseguiram arrancar da interrogada. Por isso, o destaque nos sites da Globo foi o previsível silêncio de Dilma sobre o julgamento do mensalão – outra evidência de que eles consideram suas perguntas mais importantes do que as respostas da presidenta da República.
Qualquer analista dirá que a presidenta desperdiçou a oportunidade de ter sido mais assertiva da propaganda de seu governo. Quinze minutos no JN são uma grande chance de falar para milhões de eleitores, mas Dilma preferiu debater com Patrícia Poeta e William Bonner.
Ela passou informações relevantes: a inflação de julho ficou próxima de zero; o Mais Médicos atende 50 milhões de pessoas; o SAMU atende 149 milhões. Disse que o país enfrenta a crise sem demitir, sem arrochar salários e até diminuindo impostos. Podia ter dito muito mais, mas a disputa foi mais concentrada na forma que no conteúdo. E foi aí que Dilma venceu.
Dilma sorriu na medida certa e manteve-se serena durante todo o programa. Impôs-se um comportamento de presidenta da República, que contrastou, aos olhos dos telespectadores, com a atitude desrespeitosa e antiprofissional dos entrevistadores. Mesmo restrita a um cerimonial televisivo, foi uma sinalização relevante para uma imprensa cada vez mais assanhada no papel de oposição: digam o que quiserem, mas respeitem a presidenta eleita de todos os brasileiros.