O Globo, em pleno Carnaval, volta à carga contra o salário-mínimo, do qual é inimigo desde que foi criado , há mais de 70 anos.
Depois de saudar em editorial a “livre” negociação de salários entronizada no altar do neoliberalismo no Governo Fernando Henrique, o jornal lamenta que o salário mínimo seja “a exceção”:
“O mínimo é passível de injunções políticas.”, diz.
O jornal dos Marinho, ainda bem, reconhece que ”a política deliberada de valorização do mínimo que assegurou ganhos expressivos tanto para trabalhadores como para a grande maioria de aposentados e pensionistas da previdência social”.
Mas, daí para a frente, são só críticas: “a variação do PIB de dois anos antes pode não ser mais compatível com a situação da economia no momento em que o ajuste é repassado ao salário mínimo”.
Hein?
A variação do PIB de 2013, a ser usada no próximo reajuste, é de 2,3%, apenas.
Será que é por isso que torce tanto para que o PIB ande para baixo?
“A indexação automática, e inflexível, não pode se perpetuar. Pela importância do salário mínimo no conjunto da economia brasileira, essa indexação se transformou em fonte de pressão sobre a inflação (direta e indiretamente, em especial quando aumenta a folha de pagamentos do setor público e o déficit da previdência social).
A valorização do salário mínimo é bem-vinda e necessária, mas não pode ignorar as condições da economia. Se a evolução dos salários não tem relação com a produtividade do trabalho, a política de valorização deliberada do mínimo tira competitividade das cadeias produtivas (pela elevação dos custos).
A perda de competitividade acaba fechando postos de trabalho, o que impede que mais categorias profissionais se beneficiem do crescimento econômico. Desse modo, em vez de se conseguir que haja um avanço da massa salarial, asfixia-se a galinha dos ovos de ouro.”
Cínicos! Quem é que fica com os ovos de ouro dessa galinha?
Como é que três bilionários, cuja riqueza cresce a razão de R$ 2.666 por segundo, têm a coragem de recusar um reajuste real de 2,3% que, em janeiro do ano que vem, vai representar 16 reais por mês para um trabalhador humilde sustentar sua família.
É por isso que Aécio Neves e Eduardo Campos já acenam com uma “desindexação” do mínimo.
O nome que está engolido em suas bocas é arrocho salarial.
Aécio e Campos concordam com eles
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O Carnaval do cocoruto
Lá vem a Rússia
Na época de reunificação da Alemanha, fato contra o qual se bateu, Margaret Thatcher deixou escapar um desabafo numa reunião de líderes mundiais: “Lá vêm os alemães.”
Pois é.
Lá vêm os russos, como o caso da Crimeia mostra claramente.
Uns gostam dos russos, outros detestam, alguns ignoram, mas o que é claro que o mundo precisa de um anteparo ao poder unilateral dos Estados Unidos.
É uma necessidade, um imperativo geopolítico.
O que se viu depois da desintegração da União Soviética foi uma única superpotência abusar da paciência do mundo.
A Guerra do Iraque – feita com premissas mentirosas e não questionadas – é o maior exemplo disso, e está longe de ser o único.
Na Era da Informação, ficou difícil para os americanos sustentar a pose de campeões da liberdade. Não existe um único caso de um país que você possa dizer que melhorou depois de uma intervenção militar americana.
No mundo menos imperfeito, você não precisaria de contraponto aos Estados Unidos, mas este mundo em que vivemos é absurdamente imperfeito.
É admissível que o horror do Iraque não tivesse ocorrido com uma Rússia forte freando a agressividade destruidora dos Estados Unidos.
Putin, aparentemente, entende que a obra de sua vida é devolver grandeza global à Rússia. Haverá nisso mais ganho que perda, embora a Rússia não seja a Madre Teresa de Calcutá.
A Rússia tem a única coisa que os Estados Unidos verdadeiramente respeitam nas relações internacionais: bombas. Muitas bombas. São armas capazes de destruir várias vezes os Estados Unidos.
O outro possível contraponto ao poder americano, a China, tem uma economia fabulosa, mas sem armas acaba tendo escasso poder intimidatório para Washington.
Devemos ler com algum cuidado o noticiário nacional e internacional sobre a Rússia e Putin, pois a tendência é demonizar ambos.
Mas uma coisa é certa: com todos os defeitos da Rússia, é melhor um mundo com ela do que um mundo sem ela – ao menos enquanto os Estados Unidos estiverem tão dispostos a fazer uso de seus armamentos.
Sobre o Autor
O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.