Lula: meus dias em Curitiba


“Quando eu vim para cá, algumas pessoas me aconselharam a escrever um diário. Eu sinceramente não achei vantajoso escrever, eu sozinho, vivendo sozinho todo dia. Ia escrever o quê? “Hoje, fui no banheiro, acordei cedo”. Li o diário do Mandela na cadeia. Li a biografia de muita gente, do Getúlio, do Marighella, do Padre Cícero de Juazeiro, do Gandhi, do Roosevelt. Acabei de ler a Biografia a Duas Vozes, do Fidel Castro.

Uma coisa que me interessa muito é ler sobre a escravidão. Estou aprendendo porque o Brasil é do jeito que é, porque ainda existe preconceito. Sempre gostei muito de música e estou ouvindo bastante, recebo um pen drive com músicas. Gosto muito de samba, ouço Chico, ouço Caetano, o Gil, ouço muitas músicas daquelas, como chama, cânticos gregorianos. Às vezes, eu durmo com cantos gregorianos. Eu recebo muita coisa. E muito debate também.
Peço a alguns companheiros que gravem análises de conjuntura para mim. Então, às vezes o João Paulo [do MST] grava uma análise de conjuntura, às vezes o Genoíno me grava, a [Marilena] Chauí me grava, o [Luiz] Dulce me grava, a Gleisi [Hoffmann] me grava, o Jessé [de Souza], o Eduardo Moreira, o Aloizio Mercadante. Eu vou pedindo às pessoas, que vão gravando.
Como não tem o que fazer, sento para ler, ou sento e fico vendo as pessoas falarem, fico discutindo sozinho com as pessoas, discordando das pessoas. Às vezes, fico puto como as pessoas falam bobagens a meu respeito. E não estou lá para dizer: “Não é assim, rapaz”.
Assim vou vivendo. Eu vou dormir por volta de meia-noite, 1 hora da manhã. Acordo todo dia às 6h30, faço meu café, faço um café de qualidade. Acho que não tem ninguém que faça um café melhor do que eu.
Quero que vocês saibam que essa história de eu falar que vou casar é verdade. Na verdade, encontrei uma meia cara que está me ajudando a vencer essa barreira aqui. Então, não vou deixar a solidão tomar conta de mim, não vou deixar o ódio tomar conta de mim, não vou desanimar, não vou ficar deprimido. Não conheço a palavra depressão. Se já tive, não sei.
Como fui corintiano e fiquei 23 anos sem ganhar um título, perdendo para o Santos 15 anos consecutivos, vendo Pelé humilhando o Corinthians – eu ia ao estádio, chegava lá e dava 3 a 0, 4 a 0 –, então acho que não vou ter depressão. Tenho certeza, posso dizer para vocês comunicarem o pessoal lá fora, que vou sair mais maduro, mais preciso naquilo que quero fazer – vou sair mais lutador do que fui.
Estou bem fisicamente. Obviamente que sei que a natureza é implacável, mas como me decidi que vou viver até os 120 anos, que a “Caetana” não venha bater na minha porta, que não tem espaço para ela entrar [referência ao livro A Moça Caetana – A Morte Sertaneja, de Ariano Suassuna”]. Tenho muita coisa para fazer ainda.
Então, estou assim, nesse momento da minha vida. Obviamente, fico sonhando em sair daqui, decidir onde vou morar. Quando deixei a Presidência, tinha vontade de morar no Nordeste, vontade de voltar para meu Pernambuco, vontade de morar não perto da praia, mas num lugar em que pudesse ir à praia. Pensava em ir para Bahia, Rio Grande do Norte, mas a Marisa não quis ir porque ela nasceu em São Bernardo [do Campo], e o mundo dela era São Bernardo. Eu não tenho mais o que fazer em São Bernardo.
Não sei para onde ir, mas quero me mudar para outro lugar. Quero viver. Espero que o PT me utilize, espero que a CUT me utilize, espero que os sem-terra me utilizem, espero que os LGBT me utilizem, espero que os quilombolas me utilizem, espero que as mulheres me utilizem, espero que todo mundo me utilize para fazer com que eu tenha utilidade nessa minha passagem pelo planeta Terra.
Vou sair daqui tranquilo. Não vou dizer que cumpri minha missão, mas vou sair daqui tranquilo, como cidadão consciente do seu papel na história.
Sou muito agradecido às manifestações dos artistas. Tenho visto pelo pen drive shows no mundo inteiro. Aliás, acho que o PT e os movimentos sociais deveriam fazer da questão cultural uma das bandeiras mais importantes. A gente não pode deixar que esses caras destruam a cultura. A cultura não tem propriedade do Estado. A cultura é uma prioridade da sociedade – ela que se aproveite da cultura e a criatividade que o nosso povo tem nesse país. Não podemos abdicar disso.
É isso que vocês vão levar daqui. Quero que vocês digam para todo mundo que estou bem, estou muito disposto a brigar. Tenho certeza de que o Moro não dorme com a consciência tranquila como durmo. Tenho consciência de que o Dallagnol está precisando tomar remédio para dormir, talvez tarja preta, porque ele sabe que é mentiroso, ele sabe que foi canalha no meu processo. Estou aqui, para a raiva deles.
Porque acho que eles ficam com mais raiva quando eles percebem que estou bem. Então, muito obrigado. Quero que vocês transmitam um abraço a todo mundo. Quando sair daqui, espero que a gente faça uma boa entrevista – e um churrasco.
Há um livro que li que me impressionou muito, chamado Um Defeito de Cor, de uma moça chamada Ana Maria Gonçalves. Eu li Escravidão, do Laurentino Gomes, muito bom. Eu tenho lido muito. Li, da escravidão, O Alufá Rufino [de Flávio dos Santos Gomes, João José Reis e Marcus J. M. de Carvalho]. É muito bom. É um tema que me apaixonou, porque nunca consegui entender.
Não sei se vocês lembram, quando eu era presidente, a gente tentou, foi aprovada uma lei, o Fernando Haddad [então ministro da Educação] deve se lembrar disso, para ensinar a história africana no Brasil, que era umas formas que eu achava que a gente iria vencer o preconceito nesse país. Não sei se aconteceu. Pelo que estou vendo, até universidade afro-brasileira está sendo destruída lá em Redenção (Ceará). Acho que eles estão desmontando isso. Mas estou aprendendo muito. As pessoas são muito generosas, as pessoas mandam muitos livros, muito material importante.
Esses dias, recebi uma cartinha bonita daquela menina que está em Oxford e participou da equipe daquele médico que ganhou um prêmio Nobel de Medicina; uma menina do Rio Grande do Norte que está com ele, é brasileira. Ela mandou uma cartinha bonita. Eu recebo muita coisa bonita, muita gente generosa.
Eu não sei se vou ter força para abraçar todo mundo quando eu sair daqui. Se a minha bursite não voltar…”
Texto de Pedro Pligher baseado na entrevista que Lula deu esta semana ao Brasil de Fato

Vitória de Pirro

Eu sou o líder do Partido!!!

Vai pra...! Duke

- Vai pra Venezuela!!!
- Vai pru Chile!!!
- Fiquem no Brasil!!!


Mentira da Veja não dura um dia

Empresário diz que Marcos Valério mentiu para incriminar Lula

Queiros, o intelectual, por Jota Camelo

Passei na livraria do Flávio
E levei dois romances
Cinco crônicas e vinte continhos
Cultura nunca é demais

Os exílios de Lula e Getúlio


Dois golpes de Estado. Os dois maiores presidentes da história republicana brasileira alijados da política institucional. O primeiro em uma cela na fria Curitiba, o segundo em uma estância em São Borja.
Estamos em 1945, e com a iminente vitória dos aliados na Segunda Guerra Mundial, não existiam mais condições políticas para a continuidade de um regime totalitário no Brasil. O Estado Novo estava com os dias contados. Os ventos da democracia liberal, representada pelos Estados Unidos, sopravam na América latina, e Getúlio Vargas tinha plena consciência disso.
Porém, assim como hoje, os liberais da época, representados principalmente pela União Democrática Nacional (UDN), eram democratas na medida em que esse sistema não afetasse os interesses da classe dominante[1].  O problema era combinar com os “russos”, ou seja, era a vontade popular. Getúlio, o homem dos direitos sociais, da indústria de base, do nacional-desenvolvimentismo, continuava querido pelo povo, mesmo após oito anos de ditadura (1937-1945).
Vargas se compromete com a redemocratização, e em maio de 1945 é lançado o “queremismo”, movimento que reivindicava o adiamento das eleições presidenciais e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte. Com a confirmação das eleições, defendia o lançamento da candidatura de Getúlio a presidência. O partido comunista brasileiro, que havia acabado de sair da clandestinidade, aderiu à campanha, defendendo a “Constituinte com Getúlio” e obtendo ampla adesão entre os trabalhadores urbanos das grandes capitais[2].
O exército brasileiro, após a participação na segunda guerra, vinha sofrendo crescente influencia estadunidense, e os militares resolvem exorcizar de vez a figura do presidente, o retirando da chefia do executivo através de um golpe de estado, em 29 de outubro de 1945. Sem condições políticas para se lançar a corrida presidencial, Getúlio é eleito senador por São Paulo e Rio Grande do Sul, e deputado federal por seis estados diferentes (na época a legislação eleitoral permitia).
Acossado por todos os lados (militares, parlamento, imprensa), a vida política na capital federal se torna inviável para o novo senador, que opta por passar longos períodos em uma estância de sua família em São Borja, na fronteira com a Argentina, a 594 quilômetros de Porto Alegre.
“Foram vários os pedidos de licença apresentados pelo ex-presidente, períodos em que permaneceu sempre em São Borja. Ao longo de todo o seu mandato, Vargas ocupou a cadeira de senador intermitentemente por apenas dois anos. Quando se encontrava em plena campanha eleitoral para a presidência da República, justificou as sucessivas licenças afirmando que o ambiente criado ao seu redor no Senado tornara impossível sua permanência; sua residência encontrava-se vigiada, os telefones censurados, e os amigos perseguidos” [3].
Sua principal fonte de informações no Rio de Janeiro era a filha, Alzira Vargas, com quem se correspondia diariamente. São Borja passa a receber uma procissão de políticos e jornalistas. Getúlio deixa a semi-aposentadoria e prepara a sua volta através do voto popular, apostando na impopularidade do projeto liberal da UDN[4], sendo eleito presidente em 1950:
“Pouco a pouco, a pequena cidade gaúcha de São Borja transformou-se em passagem obrigatória para os políticos que iam à procura de Vargas, em busca de conselho ou ansiosos por seu apoio eleitoral. E foi da mesma São Borja, assim como de Itu ou Santos Reis, as estâncias da família, que Vargas se manteve permanentemente informado, principalmente através da correspondência mantida com filha, Alzira Vargas do Amaral Peixoto, sua melhor e mais segura informante dos acontecimentos políticos do país. Foi principalmente por intermédio desta correspondência que Vargas definiu os passos futuros, elaborou pronunciamentos, corrigiu estratégias, disposto sempre a manter um progressivo retraimento até conseguir reajustar a situação, e assim manter o controle sobre o partido e suas ações. Mesmo que esta progressão pudesse chegar à retirada da atividade política e à renúncia do mandato. Era um risco que sabia estar correndo”[5].
Avançamos até 2016. A presidenta Dilma Rousseff é deposta por um golpe parlamentar. O “problema” é que o maior líder popular da história do Brasil estava vivo. Física e politicamente, apesar do massacre midiático que só teve precedentes na história brasileira justamente com Getúlio, no segundo período de sua presidência (1951-1954).
Era preciso neutralizar esse potencial político, coisa que nem o Jornal Nacional e suas 18 horas de ataques no período de doze meses havia conseguido. É quando entra em cena a República de Curitiba, que assim como a República do Galeão, em 1954[6], passa por cima de todas as garantias constitucionais para decretar a prisão de Luiz Inácio Lula da Silva, em 05 de abril de 2018 e o impede de concorrer às eleições presidenciais daquele ano.
Neste processo todo, não bastava prender Lula, era preciso calar a sua voz, e a força-tarefa da Lava Jato, como revelaram as recentes reportagens do The Intercept, se empenhou para impedi-lo de dar entrevistas, com medo de seu potencial de transferência de votos para o candidato Fernando Haddad, demonstrando não ter o mínimo compromisso com o princípio constitucional da liberdade de expressão[7].
Na cela de 15 metros quadrados, nesse um ano e meio de prisão, ele vem recebendo visitas de personalidades de destaque de vida política, cultural e religiosa do Brasil e do mundo. Leonardo Boff, Pepe Mujica, Noam Chomsky, Adolfo Esquivel, Baltazar Garzón, Dilma Rousseff, Celso Amorim, Fernando Haddad, Bresser Pereira, Jean-Luc Mélenchon, Alberto Fernandez, Chico Buarque, dentre outros.
Lula assim como Getúlio, está preparando a sua volta. Como futuro candidato à presidência, como um simples militante, isso ainda não se sabe. O que se percebe nas suas entrevistas é a grande preocupação com os ataques aos direitos sociais e a perda da soberania nacional expressa na profunda submissão do governo Bolsonaro aos interesses estadunidenses.
Por hora, o que a história nos ensina é que nem o exílio, o isolamento, é capaz de anular a influência de lideranças como Getúlio Vargas e Luiz Inácio Lula da Silva, e que o Brasil continua na encruzilhada: se conformar em ocupar uma posição periférica no capitalismo mundial ou apostar em um projeto de desenvolvimento autônomo e soberano.

“E aquilo que a nossa pastora disse, e eu tenho dito em todo discurso, não adianta tentar me impedir de andar por este país, porque têm milhões e milhões de Boulos, de Manuelas, de Dilmas Rousseffs neste país para andar por mim.Não adianta tentar acabar com as minhas ideias, elas já estão pairando no ar e não tem como prendê-las” (discurso de Lula antes da prisão, no Sindicato dos Metalúrgicos em São Bernardo).

por Rafael Molina - formado em Direito, membro do coletivo estadual dos Direitos Humanos do estado de São Paulo e da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD

Machismo feminino

- Está de namorado novo?

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