por Alon Feuerwerker

Um favor para o Brasil

A política de Dilma Rousseff para o tratamento do Congresso Nacional vai delineando. Separar imediatamente os amigos dos inimigos. E aprovar o que der na telha, sem abrir espaço para qualquer negociação.

A oposição? Se assim desejar, que reclame no Judiciário. E segure a onda, pois vai ser acusada de “judicialização”.

O novo governo está no ápice do poder e parece ter gosto pelo exercício. Mais que isso, gosto por exibir. Um êxtase.

Na votação do salário mínimo montou uma armadilha para as centrais sindicais. Chamou ao palácio e permitiu a foto regulamentar, apenas para, na sequência, humilhá-las ao definir que nada havia a negociar. Uma crueldade.

O governo pôde fazer isso porque é quem mais conhece a real força — ou fraqueza — dos parceiros sindicalistas. E dos políticos. Sabe que não precisa, se não quiser, deixar espaço para o teatro. Não quis e não deixou.

E não deixou tampouco espaço para qualquer protagonismo da própria base. O papel dela é votar e agradecer a Deus o fato não estar na oposição.

Quem pode pode. O governo Dilma pode não apenas por causa da inédita maioria numérica no Congresso. Pode também por operar, em muitas frentes sensíveis, políticas que agradam demais aos aparelhos hegemônicos de produção e reprodução das ideias. Tão atacados num passado recente.

No salário mínimo, por exemplo, não dá para dizer que houve debate. Pareceu mais uma exibição de nado sincronizado.

Partiu-se de uma verdade absoluta, que não permitia contestação: o governo estava impossibilitado de dar mais do que o próprio governo decidisse que deveria dar. Qualquer outra coisa seria irresponsabilidade, populismo.

Mas essa linha de Dilma e do governo é boa ou ruim para o país?

Tem um lado muito bom. Pois obriga os agentes políticos e os críticos a buscar nitidez. Força a existência de uma oposição nítida. Maior ou menor, precisará buscar o tempo todo a construção do contraditório.

Precisará correr atrás de interlocução social. Precisará fazer força, intelectual e operacional.

Um pouco como a boa oposição feita pelo PT no passado. A cada projeto vindo do governo, achar os defeitos, as mistificações, as enganações numéricas, as picaretagens doutrinárias. Sempre há. E concentrar fogo nesses pontos.

E aguentar firme  as críticas ao “irrealismo”, ao “antipatriotismo” e à “irresponsabilidade”.

Freio

Até onde a maioria parlamentar pode ir? Saberemos, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) decidir a constitucionalidade da lei que permite ao governo fixar por decreto nos próximos anos o valor do salário mínimo.

O governo argumenta que a Constituição manda a lei fixar o valor do mínimo, não manda fazer isso todo ano.

A oposição argumenta que a Constituição manda a lei fixar o valor do mínimo, não um mecanismo para calcular o valor dele.

Como sempre lembra o ministro Marco Aurélio, a Constituição é o que o Supremo decide que ela é. O debate terá um viés técnico, mas o significado será político.

Saberemos se há nos poderes algum vetor de resistência ao Executivo. Com o Congresso anulado, vai ser um parâmetro para o futuro.

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