por Lívia Guimarães e Eloísa Machado
A decisão do Supremo Tribunal Federal que suspendeu o mandato parlamentar de Eduardo Cunha e, consequentemente, de sua função de presidente da Câmara dos Deputados, é o principal argumento usado pela Advocacia-Geral da União (AGU) em nova ação (MS 34193) que questiona a continuidade do procedimento de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Agora, o Supremo novamente deverá arbitrar essa questão, determinando o prosseguimento ou a suspensão da votação a ser realizada no Senado.Lívia Guimarães e Eloísa Machado são pesquisadoras Supremo em Pauta, FGV - Fundação Getúlio Vargas - São Paulo.
O que está em xeque são, ainda, os atos praticados pela Câmara dos Deputados no processo de impeachment. Estes questionamentos, que tomaram fôlego com as idas e vindas da decisão do presidente interino da Câmara dos Deputados, Waldir Maranhão, voltam-se sobretudo à forma pela qual Cunha conduziu o processo, quando ainda era presidente da Casa.
O caso, que está com a relatoria do ministro Teori Zavascki, alega que o recebimento da denúncia de impeachment e os demais atos conduzidos por Cunha devem ser desconsiderados por apresentarem desvio de finalidade e abuso de poder. Para a AGU, Cunha usou o processo de impeachment como chantagem política e como moeda de troca para se livrar de processo no Conselho de Ética e das investigações da Lava Jato, o que demonstrariam o desvio de finalidade. Outros atos de Cunha, como a aceleração do processo de impeachment, teriam sido cometidos com abuso de poder.
A peça da AGU se baseia quase integralmente na decisão proferida pelo plenário do STF. Inúmeros trechos do voto do também então relator, Teori Zavascki, foram citados, lastreando a tese de que Cunha teria cometido desvio de finalidade no comando da presidência daquela Casa legislativa, atendendo seus próprios interesses pessoais e políticos. Se o tribunal reconheceu que essas razões eram insuficientes para suspender excepcionalmente um mandato parlamentar, deverá agora decidir se essa perversão da função pública foi capaz de contaminar o processo de impeachment.
Por outro lado, não se pode esquecer da decisão liminar, ainda em vigor, que suspendeu a nomeação de Lula como ministro da Casa Civil, também por desvio de finalidade, bem como a liminar do ministro Marco Aurélio que determinou que o pedido de impeachment contra Michel Temer não deveria ter sido arquivado por Cunha (MS 34087). Juntas, a decisão que suspende o mandato de Cunha, a liminar que impede a nomeação de Lula e a liminar que determina o prosseguimento do impedimento de Temer, oferecem ao tribunal um pouco de seu próprio veneno.
Com isso, o Supremo se encontra na incômoda posição de ter de apontar, às vésperas da votação do impeachment no Senado Federal, quais são os limites dos malefícios dos atos praticados por Cunha como também de suas próprias decisões.
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