A denúncia de fraude, envolvendo a merenda escolar em São Paulo, é de embrulhar o estômago.
Aliás, as duas são de embrulhar o estômago: a fraude e a merenda em si, - a julgar pelas imagens mostradas pelo “Jornal da Record”. As cenas mostram que, na maior cidade do país, gasta-se muito para oferecer refeições de baixa qualidade.
E por que se gasta muito?
Isso é o mais surpreendente nessa história. Prestem atenção, por favor, leitores, porque aqui temos um caso quase inacreditável.
Essas crianças comem a merenda de Kassab?
Em 2007, a própria Prefeitura de São Paulo contratou a FIPE (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), para que fizesse uma avaliação técnica do programa de merenda. Uma das questões estudadas: a Prefeitura deveria, ou não, terceirizar todo o serviço de merenda?
A resposta da FIPE, em abril de 2007, foi: não! Se toda merenda de São Paulo fosse terceirizada, o programa custaria 71% a mais!
Na página 3 do relatório entregue à Prefeitura, a FIPE afirma, com todas as letras: "o Programa de Merenda Escolar da Prefeitura do Município de São Paulo deve ampliar a Merenda Direta em detrimento da Terceirizada." (grifo meu, RV)
Uma das economistas da FIPE disse ao Ministério Público que recebeu da Prefeitura "recomendações" para que o relatório fosse alterado. Hum...
Advinhem o que a Prefeitura de Kassab fez? Em maio de 2007, desconsiderou o relatório da FIPE, chamou licitação e ampliou a terceirização: ou seja, aumentou o número de escolas atendidas por fornecedores particulares.
O que aconteceu, então?
As investigações conduzidas até aqui pelo correto promotor Silvio Marques (o mesmo que investigou Maluf e Pitta) mostram que pode ter havido um grande acerto entre as empresas fornecedoras.
Há gravações. Nojentas. Os empresários, reunidos num hotel em frente à Prefeitura, combinam o preço. Dão risada, brincam com a comida das crianças.
E mais: pelo menos 3 funcionários da Prefeitura – diretamente envolvidos com a licitação da merenda – foram trabalhar depois nas empresas que fornecem merenda. Simples assim!
Tudo foi mostrado, em primeira mão, pelo “Jornal da Record”, em reportagens de Vinicius Costa - com produção de Luiz Malavolta e Paulo T, e edição de Rogério Olmo.
A “Folha” http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u499856.shtml e o “Estadão”http://www.estadao.com.br/geral/not_ger318745,0.htm também estão acompanhando o caso.
A “TV Globo”, ao que parece, não se interessou muito pela denúncia. Por que, hem?
Outra pergunta: a fraude teria começado logo depois que Kassab assumiu definitivamente a Prefeitura, no lugar de Serra; o atual governador teria deixado alguma ordem, indicando que a terceirização deveria ocorrer de qualquer jeito? Era um acerto prévio? Por que a Prefeitura gastou quase um milhão para ouvir a opinião da FIPE, e depois desconsiderou o relatório?
Vejam, não estou acusando. Estou apenas testando hipóteses, seguindo o que faz uma conhecida escola jornalística do Jardim Botânico, no Rio (eles só testam hipóteses no plano federal, mas eu vou utilizar o método na esfera municipal).
Ah, mas isso pode acontecer, né? Fraudes ocorrem o tempo todo, e o Prefeito não pode controlar tudo, certo?
Ora, como defender essa tese, diante do estudo preliminar da FIPE, que apontava os riscos da terceirização? Quem deu ordem para desconsiderá-lo?
O caso deixou o promotor Sílvio Marques boquiaberto. Mas, se conheço bem o doutor Sílvio, ele não é de ficar de boca aberta muito tempo. Já está investigando.
Kassab e seu parceiro Serra não terão sossego nesse caso. A “Merenda de Serra/Kassab” pode se transformar no equivalente da “Máfia dos Fiscais” de Pitta/Maluf.
A diferença é que, dessa vez, os prejudicados diretos seriam milhares de crianças. É de virar o estômago.
Em tempo: Kassab dizs que não sabia de nada, e que vai colaborar com o Ministério Público nas investigações.
Ah, bom!
do Escrevinhador