Preço do petróleo afeta mais o Brasil que ritmo da China, diz Trabuco
Luiz Carlos Trabuco, presidente do Bradesco, acredita que "o preço do petróleo está tendo e vai ter um impacto muito mais explosivo do que a desaceleração chinesa" sobre a economia global e especialmente a brasileira.
Em Davos para o Fórum Econômico Mundial, Trabuco disse à Folha que "não podemos ter um governo unicamente em cima do ajuste fiscal". Entre as possibilidades de ação para o governo, o executivo sugere aumentar a liquidez do sistema bancário, reduzindo compulsório.
A justificativa para isso, apesar da inflação tão alta, é que não há demanda. Trabuco descarta maiores problemas para empresas com dívida em dólar neste ano, mesmo com a alta do câmbio. "Houve um alongamento das dívidas por um grande grupo para 2015, 2016 e 2017. Em 2018, 2019 aumenta o volume."
Folha - Qual a sua impressão do Fórum, em meio à derrocada da China e à queda do preço do petróleo, com projeções de que caia ainda mais? A volatilidade em razão da China vai continuar?
Luiz Carlos Trabuco - Vai, e a estabilização das Bolsas, dos preços dos ativos e das commodities vai ser no fundo do poço. Houve uma mudança de patamar, de modelo na China.
Vai ser pior neste ano?
Vai, porque agora ela vai comprar menos e a um preço mais baixo. Na hora do ajuste, isso pode doer mais às suas empresas e ao mundo, pelo peso que a China tem.
Fica por um tempo?
Sim, entramos num túnel de grande ajuste.
O preço do petróleo está tendo e vai ter um impacto muito mais explosivo do que a desaceleração chinesa. Caiu de US$ 110, US$ 120 para US$ 30. Algumas casas diziam há dias que pode chegar a US$ 20, e aqui ouvi que pode ir a US$ 10.
Ouvi em Davos de um ministro de país árabe que pretendem diversificar. Será que eles e a Venezuela terão tempo para diversificar?
Isso poderá ter impacto também no sistema bancário. Imagine o Canadá, onde o setor é fundamental. Como ficará a indústria do etanol? A do shale gas [gás de xisto]?
A Petrobras é ainda mais afetada [que outras companhias], pelos outros problemas que tem. O problema do petróleo bate no risco de crédito das empresas e dos países no mundo todo.
E no Brasil? O que o sr. ouviu do investidor estrangeiro?
O mundo sempre teve locomotivas de crescimento. Os EUA, a reconstrução da Europa nos pós-guerra... Os EUA estão resolvendo seus problemas. Não podemos esperar que a Europa se recupere.
A Ásia nessa situação...
Ou o Brasil se transforma na locomotiva de si próprio, trabalha duro para isso, ou vamos continuar patinando.
É evidente que o valor dos ativos brasileiros, a confiança que o investidor internacional desenvolveu no Brasil, agora está praticamente em cheque. O investidor estrangeiro tem mais de 15% da dívida interna brasileira, o que é formidável, porque ele acredita nos títulos do Tesouro brasileiro. Então, existe a expectativa de que o Brasil faça a sua lição de casa.
Não podemos ter um governo unicamente em cima do ajuste fiscal, isso não é plataforma, é meio. Mas desajuste fiscal causa insolvência, temos uma lição para sermos um destino de investimento.
O sr. é favorável ao uso de bancos públicos para conceder mais crédito e reativar a economia, como o governo?
Os bancos públicos têm um papel fundamental em processos anticíclicos. O Tesouro não tem mais margem para sustentar uma diferença muito grande entre a taxa básica e os empréstimos. Então, tem de ter menos crédito direcionado ou subsidiado, porque quem paga o subsídio é o Estado, a sociedade.
O que um governo com tão baixa credibilidade pode fazer...
Ele está elaborando pacotes para o crescimento. Pode aumentar a liquidez do sistema bancário...
Retirando compulsório?
Reduzindo compulsório...
Mas com inflação tão alta...
Acho que a leitura do BC ao deixar de subir a taxa de juros foi correta. Essa taxa provavelmente é de equilíbrio. Temos menor demanda por produtos de consumo. Para investimentos é baixa também. É quase inexistente.
O sr. vê muitas empresas com problemas em razão do aumento de suas dívidas dolarizadas?
Sim, houve aumento, mas teremos tempo para enfrentar esse problema, porque em 2014 houve uma janela de liquidez no mercado internacional, com taxas baixas, que foi aproveitada. Houve um alongamento das dívidas por um grande grupo para 2015, 2016 e 2017. Em 2018, 2019 aumenta o volume.
Mas tem empresas com problemas em 2016...
Sim, mas é tópico. A crise macroeconômica mundial de commodities pega o Brasil, as corporações brasileiras, mas não sou pessimista quanto à capacidade das empresas de superarem esses desafios.
Mas através de margem menor, lucros menores. Então, a solvência e liquidez do mundo corporativo são duas palavras-chave.
A crise atual é uma crise diferente da de 2008. É mais do valor dos ativos.
Voltando à Petrobras...
É lógico que a equação de problemas da Petrobras e da Eletrobras é fundamental para a economia capturar a queda do preço do petróleo.
Teremos mais três anos como 2015, com um governo fraco, quase paralisado pela crise política?
Acho que o governo estabeleceu uma agenda de entendimento da realidade. A grande expectativa que acho que todos temos é essa agenda de providências que envolvem as reformas em pauta. A da Previdência é essencial. Aliás, os países não fazem "a" reforma, eles vão reformando.
O Brasil é um dos poucos países que não estabeleceram idade mínima para a aposentadoria e é muito difícil manter a indexação dos benefícios previdenciários aos trabalhadores na ativa. A economia não se sustenta.
O sr. é a favor da CPMF?
Não é a contribuição adequada, porque é imposto cumulativo. Se ela for temporária e por dois ou três anos... porque todos queremos o ajuste fiscal. Precisamos parar de piorar. Não dá para cada um pensar em si. Temos o terceiro ano de recessão. Com o nível de desemprego acima de 10%, é depressão. Precisamos reverter isso.
Não tem jeito. Precisamos ter protagonismo no setor empresarial, no governo, para avançar. Se não, vamos perder essa outra onda de ajustes do mundo.
O mundo não vai acabar, mas precisamos amadurecer, antes de envelhecer.
A deterioração na economia está muito rápida. A situação pode se agravar ainda mais...
Precisamos evitar. Precisamos ser destino de investimentos. A liquidez que existe nos bancos e investimentos estrangeiros precisa ser posta para trabalhar. Temos urgência. Mas o ano passado não foi perdido. Os investidores estrangeiros dizem que há muitas oportunidades no Brasil e veem como positivas as ações do Judiciário brasileiro.
A crise é pela falta de providências em temas que provocam comprometimentos fiscais brasileiros, porque a carga tributária já é muito alta. Aumentá-la é subtrair investimentos.
O ministro Barbosa está no caminho certo?
Acho que está. Tem consciência e, pelo que mostrou aqui, vai reforçar essa agenda para o Brasil avançar.
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